14 Julho 2020
"Há algum tempo assisti a um telejornal no qual um produtor de morangos, do interior de SP, declarou (devidamente protegido pelo anonimato) que não consumia o morango que produzia por causa dos agrotóxicos. Deste dia em diante passei a estar mais atento ao veneno na minha mesa", escreve Henrique Cortez, em artigo publicado por EcoDebate, 13-07-2020.
Eis o artigo.
Nos últimos anos cresce o debate da agricultura orgânica versus a agricultura “tradicional”, aqui entendida como a que utiliza agroquímicos visando aumento de produção e produtividade.
Esta é uma discussão importante que se perdeu em argumentos binários, do tipo ‘os orgânicos são mais caros mas são mais saudáveis’ ou que a agricultura orgânica não possui produtividade suficiente para alimentar o planeta.
A agricultura “tradicional” se orgulha de produzir alimentos mais do que suficiente para alimentar o planeta e a indústria química se orgulha de ter desenvolvido os insumos utilizados para isto.
A agricultura orgânica se orgulha de ser ambientalmente mais amigável e que, eventualmente, seja mais saudável.
Os dois lados podem até estar certos mas, na minha percepção, a questão central não é essa.
Devemos nos perguntar qual é o real custo social, ambiental e de saúde desta grande produção ‘aditivada’ com agroquímicos. Quem arca com as consequências e quem realmente paga por isto?
Não pretendo discutir o manejo do solo, a sua utilização intensiva e extensiva, a ponto de que o solo precisa de permanente aplicação de fertilizantes ou de que a produção animal beire o horror da exploração desumana.
Prefiro falar do nosso longo e lento envenenamento diário. Prefiro pôr em discussão a comida que nos mata.
Há algum tempo assisti a um telejornal no qual um produtor de morangos, do interior de SP, declarou (devidamente protegido pelo anonimato) que não consumia o morango que produzia por causa dos agrotóxicos. Deste dia em diante passei a estar mais atento ao veneno na minha mesa.
Para colocar o tema em discussão, nem será preciso nada mais do que fazer um rápido e pequeno balanço do que já publicamos. Ao final desta matéria, você encontrará uma relevante relação do que já publicamos sobre agrotóxicos e saúde.
O imenso volume de herbicidas aplicados no Brasil contaminam os solos, os mananciais e até mesmo o aquífero Guarani. A contaminação dos mananciais e aquíferos também chegará até nós pela água que bebemos e pelos produtos agrícolas irrigados com a água contaminada.
Até mesmo os produtos orgânicos podem ser contaminados indiretamente, como é o caso dos antibióticos usados em animais e que são absorvidos pelas hortaliças cultivadas em solo adubado com resíduos animais. A agricultura orgânica é intensa utilizadora da adubação orgânica.
Como já havia ocorrido com o tomate, a batata, o figo e o morango, também a uva recebe grandes doses de agrotóxicos. Uma pesquisa da Universidade de Caxias do Sul (UCS) e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul sobre o efeito de agrotóxicos em vinicultores do Rio Grande do Sul revelou altos índices de intoxicação.
A intensa utilização de agrotóxicos no Brasil é ainda mais irresponsável do que nos EUA e na Europa. Um primeiro lugar porque, no Brasil, importamos agrotóxicos proibidos nos próprios países onde são produzidos.
Aqui voltou à minha questão inicial: qual é o real custo social, ambiental e de saúde desta grande produção ‘aditivada’ com agroquímicos? Quem arca com as consequências e quem realmente paga por isto?
Pagamos, com nossa saúde e nossas vidas, mais este ‘subsídio’ aos que dizem alimentar o mundo.
Alimentam, é fato, mas colocam o veneno à nossa mesa.
Veja, abaixo, uma relação de matérias publicadas, cuja leitura recomendamos para melhor compreensão do tema “Agrotóxicos e Saúde”
– Uso de agrotóxicos e problemas para saúde, Parte 1/2
– Uso de agrotóxicos e problemas para saúde, Parte 2/2 (Final)
– Ministério da Saúde registra de 12 mil a 14 mil intoxicações por agrotóxicos no país a cada ano
– Agrotóxicos: O Brasil está, literalmente, se envenenando
– Multinacionais vendem no Brasil toneladas de agrotóxicos ‘altamente perigosos’ proibidos em seus países
– Agricultores não associam uso inadequado de agrotóxicos ao seu estado de saúde
– Mapa do envenenamento de alimentos por agrotóxicos no Brasil
– Médica sanitarista fala sobre o universo da saúde ambiental, com destaque sobre os impactos dos agrotóxicos
– O uso seguro de agrotóxicos é um mito
– Agrotóxicos chegam às torneiras de uma em cada quatro cidades
– Agrotóxicos na natureza e na saúde humana
– Agrotóxicos chegam às bacias de abastecimento público
– Pesquisadores alertam sobre os riscos de agrotóxicos na saúde da população
– Trabalho rural e riscos à saúde: uma revisão sobre o ‘uso seguro’ de agrotóxicos no Brasil
Leia mais
- Para combater nuvem de gafanhotos, governo libera mais usos para agrotóxicos
- STF suspende liberação de agrotóxicos sem estudos sobre impactos à saúde e ao meio ambiente
- Multinacionais da Europa vendem no Brasil toneladas de agrotóxicos ‘altamente perigosos’ proibidos em seus países
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Agrotóxicos e Saúde, o veneno à nossa mesa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU