08 Abril 2019
O jornalista Marco Politi escreveu livros sobre os últimos três papas. Ele observa os eventos como que a partir de uma central de comando. E afirma que nunca viu no Vaticano uma oposição tão agressiva contra o Papa Francisco quanto a que está em andamento.
Nesta entrevista a Martin Spilker, da agência Katholisch.de (27-03-2019), e republicada em Settimana News (04-04-2019), Politi explica o que distingue o papa argentino dos seus antecessores e fala sobre as lições que ele aprendeu a partir dos seus primeiros anos de ministério e das possíveis reformas.
A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Politi, o seu livro “Francesco tra i lupi” [Francisco entre os lobos] foi publicado em 2014. Enquanto isso, o Papa Francisco conseguiu domesticar os lobos?
Não, absolutamente! O título do livro se baseia na história de Francisco de Assis, na qual se narra que um lobo deu a sua pata ao santo como sinal de fidelidade. Aqui ocorre o contrário. A oposição contra as reformas de Francisco é muito forte. Há um processo de deslegitimação em relação ao papa.
É uma afirmação muito forte.
Sim. Isso já havia começado com uma série de livros por ocasião do Sínodo sobre a família. Depois, houve os quatro cardeais que o criticaram teologicamente. E, em um “Manifesto”, algumas partes da exortação Amoris laetitia foram definidas como heréticas.
Você já viu algo assim no Vaticano?
Tão agressivo, não. Andrea Riccardi, historiador da Igreja italiana, afirmou que nos últimos 100 anos nunca houve uma oposição tão forte contra um pontífice. E isso por parte de bispos, clero e fiéis.
Como você explica isso?
O Papa Francisco quer uma forte mudança. Ele não concebe mais a Igreja como uma monarquia, mas como uma comunidade. E a Igreja não deve mais ser tão dogmática, mas sim um lugar onde os fiéis dão testemunho do amor ao próximo.
Há também temas sobre os quais o Papa Francisco se expressa de maneira definitiva. Para ele, por exemplo, o sacerdócio para as mulheres está fora de discussão.
É verdade. Mas ele também é o primeiro papa a tematizar o diaconato para as mulheres. Existe uma comissão que elaborou um documento, mas que ainda não foi publicado. Aqui se vê como Francisco deve prestar muita atenção para que não haja uma divisão tão grande dentro da Igreja.
Ele não tem a coragem de pôr essas coisas sobre a mesa?
O Papa Francisco certamente ficou mais cauteloso.
No seu livro, você menciona a origem do papa: a América do Sul e a metrópole de Buenos Aires, onde Francisco foi arcebispo. Isso explica as diferenças no Vaticano?
Na América do Sul, assim como na Europa, há bispos conservadores, bispos muito cautelosos e bispos comprometidos socialmente. Mas o que certamente moldou a ele e a sua atividade foram as suas experiências em uma metrópole pluralista. Francisco não provém de um ambiente de maioria católica como o bávaro Bento XVI, o polonês João Paulo II e os papas italianos anteriores.
Onde está a diferença?
Naquela metrópole, existem judeus, muçulmanos, protestantes, maçons, pentecostais. Por isso, ele tem a concepção de uma sociedade pluralista e secularizada. Para ele, um não crente não é alguém a quem falta alguma coisa. Ele nutre um grande respeito por quem pensa diferente.
O Sínodo para a Amazônia ocorrerá no fim deste ano. É possível que no futuro, na Igreja Católica presente nos diversos continentes, valham regras diferentes?
Uma ideia de fundo do Papa Francisco no início do seu mandato foi esta: nem tudo deve ser decidido a partir do centro. Ele também iniciou um processo de descentralização. Padres e bispos podem hoje tomar decisões que antes eram tomadas em um degrau mais alto. Essas são passos rumo à descentralização. Ele não compreende mais a Igreja como uma monarquia. No Sínodo sobre a Amazônia, levanta-se a interrogação sobre se é possível empregar padres não celibatários em âmbitos regionais por causa da enorme falta de padres. O papa, por exemplo, levantou esse assunto para algumas comunidades particulares em lugares muito remotos na selva.
Que consequências isso teria?
Seria um grande passo! Porque, bem em breve, outras vozes se levantariam para pedir a mesma coisa. Na América do Norte, pode-se dizer que, na selva da cidade, a falta de padres é igualmente grande.
Dentro da Igreja, seriam grandes passos. Mas eles parecem desaparecer totalmente por causa do atual debate sobre os abusos.
A Igreja é provocada pelos abusos, e o Papa Francisco disse claramente desde o início que, para ele, existe apenas uma tolerância zero. Por isso, diversos eclesiásticos de alto nível foram depostos. No entanto, a resistência silenciosa e a sabotagem na Igreja universal contra a estratégia do papa continuaram.
Como isso se demonstra?
Deveria haver um tribunal dentro do Vaticano sobre a ocultação dos casos de abuso. Mas ele nunca foi instituído. Além disso, deveria haver diretrizes para lidar com as vítimas de abuso. Mas a maioria das Conferências Episcopais não fez nada até agora! As Igrejas locais têm um grande medo de que muitos casos encobertos venham à tona.
O Papa Francisco tem 82 anos agora. O que ainda se pode esperar dele?
Francisco é muito tenaz e decidido. Mas é preciso observar – no caso dos abusos – o que ocorre com as suas diretrizes nas Igrejas locais individuais do mundo. Se, até o ano que vem, for instituído um sistema de elaboração e de prevenção, como na região alemã e anglo-saxônica, então se poderá dizer: é um sucesso! Mas se, ao contrário, essas coisas continuarem acontecendo e surgirem cada vez mais escândalos, então poderemos nos dar conta de que até mesmo o papa não é onipotente e que este papa realmente encontra uma grande resistência.
Mas muitas pessoas depositam muita confiança neste papa. O que está faltando?
Pode-se ver uma diferença com os tempos posteriores ao Concílio. Naquela época, havia no povo de Deus um forte impulso para a reforma. Havia bispos, cardeais, teólogos, grupos de trabalho e associações de fiéis comprometidos.
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Francisco: por que as resistências? Entrevista com Marco Politi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU