08 Mai 2018
Bill Kilgallon relembra seus três anos como membro da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores com uma sensação de realização e um sentimento de frustração.
O mandato de três anos de Kilgallon na comissão chegou ao fim no ano passado, e ele não foi reconduzido para o segundo mandato, que era o resultado que esperava.
A reportagem é de Michael Otto, publicada por National Catholic Reporter, 07-05-2018. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Ao apontar os resultados alcançados pela comissão em seu primeiro mandato, ele destacou primeiro o estabelecimento do órgão em si, que envolveu reunir pessoas de diferentes contextos profissionais do mundo todo para trabalhar em equipe.
A comissão trabalhou por meio de grupos de trabalho, e Kilgallon presidiu o grupo que lidava com as orientações — começando com as de prevenção e resposta ao abuso sexual na Igreja.
Para ele, a conclusão dos modelos de orientações para auxiliar as conferências dos bispos do mundo todo foi "um trabalho muito significativo".
Outras realizações da comissão foram as recomendações sobre mudanças na lei e na prática da Igreja em áreas como queixas de abuso, prazos dos casos e uma melhor definição de "adulto vulnerável".
Kilgallon disse que também houve progressos na "formação e educação da liderança da Igreja". Ele também ressaltou a realização do grupo de trabalho liderado pelo jesuíta pe. Hans Zollner, que escreveu "na estrutura para a formação dos sacerdotes que deve haver formação específica de proteção no currículo, bem como atenção muito maior à triagem realmente eficaz e trabalho com as pessoas que estão indo para o sacerdócio e para a vida religiosa".
Outro grupo de trabalho, liderado por Marie Collins, ex-membro da comissão e vítima de abuso clerical, houve "bom progresso" na forma como a Igreja deve ouvir as vozes dos sobreviventes. "Outro grupo estava focando na educação no sentido mais amplo de comunidades e convocou uma conferência de pessoas que trabalham com proteção nas comunidades educativas, no ano passado, em Roma”.
"Ou seja, houve algumas conquistas significativas, mas foi mais no início do trabalho da comissão".
Outro trabalho importante estava sendo iniciado no final do primeiro mandato, disse Kilgallon.
Dentre os temas trabalhados estavam como lidar com agressores na Igreja e a resposta aos filhos de sacerdotes (concebidos quando o padre deveria ter vivido uma vida celibatária).
Mas alguns aspectos de seus três anos na comissão frustraram Kilgallon, que, ao mesmo tempo, trabalhava como diretor nacional do Escritório Nacional de Normas Profissionais, na Nova Zelândia. (Seu mandato de cinco anos também terminou no final do ano passado).
"Como geralmente acontece em qualquer grande organização, a comissão encontrou alguma resistência, mais especificamente dentro de alguns departamentos do Vaticano", disse Kilgallon.
"A Congregação para a Doutrina da Fé não ajudou — e às vezes foi até obstrutiva. E essa obstrução levou um dos melhores membros da comissão a sair, em termos de Marie Collins. Provavelmente também levou o prefeito da congregação a não ser nomeado novamente [pelo Papa]".
"O CDF não ajudou na elaboração do modelo [de diretrizes]”.
"Eles tinham trabalhado um pouco com orientações antes, porque foi através deles que a instrução [para conferências episcopais] passou a ter diretrizes. E nós queríamos que eles compartilhassem seu trabalho conosco, mas foi um passo muito grande para eles".
Kilgallon disse que tinha trabalhado em funções consultivas para o governo antes, no Reino Unido, e "não é incomum que os departamentos tenham uma visão muito defensiva quando um grupo externo de 'especialistas' é chamado para avaliar um problema. É uma reação institucional normal".
"Não que não seja decepcionante encontrar essa reação, mas não é inesperada".
Kilgallon também estava impressionado com o "hiato" que aconteceu no Vaticano entre o final do mandato dos membros iniciais da comissão e o anúncio de novos membros e segunda nomeação de alguns.
"Poderia ter sido uma transferência mais tranquila" se o processo de renovação da comissão tivesse sido feito de forma adequada. Mas havia "uma grande lacuna e ninguém sabia o que estava acontecendo", dando a impressão de "que não estava sendo tratada a sério" pelo Vaticano, contou Kilgallon.
Ele sempre achou que a comissão iria continuar, mas "ter essa lacuna não ajudou".
Ele concordou com a renovação dos membros, e a própria comissão havia feito essa recomendação.
"É necessário misturar continuidade e sangue novo em qualquer comissão ou comitê, é uma prática bastante normal", afirmou Kilgallon.
Ele disse que não esperava ser nomeado, "porque tínhamos recomendado mudanças; portanto, para haver mudanças, algumas pessoas têm de permanecer e outras sair".
Agora Kilgallon está ansioso para passar mais tempo com seus netos durante a aposentadoria.
Mas, declarou, sorrindo: "esta é minha terceira aposentadoria".
Ele não exclui que sua contribuição seja solicitada na futura Comissão Real de Investigação de abuso histórico em orfanatos do Estado na Nova Zelândia (Royal Commission of Inquiry into Historical Abuse in State Care). Ele foi consultado pelo governo no âmbito da investigação.
"Embora eles não tenham seguido meu conselho a respeito", acrescentou. "É certo centrar-se nos orfanatos do Estado num primeiro momento e é muito bom que o governo tenha formado uma investigação como disseram que fariam e colocaram como prioridade. Também é bom que tenham criado uma Comissão Real, porque significa que é importante”.
"Mas acho que há um grande número de pessoas que sofreram abuso em outros contextos que estão muito decepcionados por seu âmbito limitado. Acredito que essas pessoas vão - muito justamente - continuar pedindo que sua voz seja ouvida. Acho que há um sentimento forte, e eu tive muito contato com vítimas e grupos de sobreviventes, e há um sentimento muito forte entre eles de estarem novamente sendo colocados de lado e silenciados”.
"É uma oportunidade única de atuar de forma mais geral”.
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Ex-membro da comissão de abuso sexual do Papa avalia os primeiros cinco anos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU