21 Mai 2017
A desigualdade de renda e riqueza aumentou nas últimas décadas, mas o reconhecimento do papel que a liberalização econômica e a globalização desempenham nessa lacuna nunca foi tão generalizado. Os guardiões do capitalismo global estão nervosos, mas pouco fizeram para controlar ou reverter a situação.
A reportagem é de Anis Chowdhury, ex-professor de economia da Universidade de Western, Sydney, e Jomo Kwame Sundaram, ex-professor de economia e subsecretário geral da ONU para o Desenvolvimento Econômico, publicada por IPS, 19-05-2017. A tradução é do Cepat.
O Fórum Econômico Mundial (FEM) qualificou a grave desigualdade de renda como o maior risco que o mundo enfrenta.
“Temos uma disparidade muito grande no mundo. Necessitamos de mais inclusão... Se continuarmos tendo um crescimento não inclusivo e continuarmos com a situação de desemprego, em especial do desemprego juvenil, nossa sociedade global não será sustentável”, advertiu o fundador do Fórum Econômico Mundial - FEM, Klaus Schwab.
Christine Lagarde, diretora gerente do Fundo Monetário Internacional, declarou diante de líderes políticos e empresariais do FEM que, “em muitos países, os benefícios do crescimento são desfrutados por bem poucas pessoas. Essa não é uma receita para a estabilidade e a sustentabilidade”.
Do mesmo modo, o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, advertiu que caso a desigualdade não seja abordada, corre-se o risco de distúrbios sociais. “Irá explodir, em grande medida, por causa destas desigualdades”, afirmou.
Também a influente revista Foreign Affairs, do não governamental Conselho de Relações Exteriores, com sede nos Estados Unidos, realizou uma advertência similar.
“A desigualdade está crescendo em quase todo o mundo capitalista pós-industrial... caso não seja enfrentada, a crescente desigualdade e a insegurança econômica podem erodir a ordem social e gerar uma reação popular contra o sistema capitalista em geral”, apontou.
Cada vez mais, uma pequena elite absorve os principais benefícios do crescimento econômico. Apesar da estagnação econômica que o planeta sofreu durante quase uma década, o número de bilionários aumentou para 2.199, algo sem precedentes. Agora, o 1% mais rico da população mundial possui tanta riqueza quanto o restante dos habitantes. As oito pessoas mais ricas do mundo possuem tanta riqueza quanto a metade mais pobre.
Na Índia, o número de bilionários se multiplicou ao menos 10 vezes, na última década. O país asiático conta, agora, com 111 bilionários, o terceiro no mundo. Apesar disso, mais de 425 milhões de pessoas indigentes também vivem no território indiano, ou um terço dos pobres do planeta e mais de um terço da população do país.
A África teve um auge econômico por uma década até 2014, mas a maioria de seus habitantes continua lutando diariamente para obter alimentos, água potável e atenção médica. Enquanto isso, o número de pessoas que vivem na extrema pobreza, segundo o Banco Mundial, cresceu de 280 milhões, em 1990, para 330 milhões na atualidade.
Na Europa, os pobres suportaram o peso das políticas de austeridade, ao mesmo tempo em que os resgates bancários beneficiaram principalmente as pessoas abastadas. Aproximadamente 122,3 milhões de pessoas, ou seja, 24,4% da população da União Europeia, corre o risco de cair na pobreza.
Entre 2009 e 2013, o número de europeus sem dinheiro suficiente para aquecer suas moradias ou pagar gastos imprevistos aumentou 7,5 milhões, chegando a 50 milhões de pessoas, sendo que o continente conta com 342 bilionários.
Nos Estados Unidos, a proporção da renda do 1% mais rico da população está em seu nível mais alto, desde a véspera da Grande Depressão, há quase nove décadas. O 0,01% mais endinheirado, que significa 14.000 famílias estadunidenses, possui 22,2% da riqueza do país, ao passo que os 90% mais pobres, que significa mais de 133 milhões de famílias, possuem apenas 4% da mesma.
Esta concentração sem precedentes da riqueza e a correspondente privação do restante da população geraram reações negativas, que possivelmente contribuíram para a vitória de Donald Trump, nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, com o referendo do Brexit, na Grã-Bretanha, para a força da ultradireita de Marine Le Pen, na França, e da Alternativa para Alemanha e com a ascensão da direita Hindutva, na Índia.
Enquanto isso, a China cresceu, mas a desigualdade também aumentou consideravelmente. O país de governo comunista exporta bens de consumo baratos ao mundo, controlando a inflação e melhorando o nível de vida de muitos.
Parte de seu enorme superávit comercial – devido aos salários relativamente baixos, ainda que recentemente em ascensão – foi reciclado nos mercados financeiros, principalmente dos Estados Unidos, o que ajudou a expandir o crédito a taxas de juros baixas na China.
Assim, os produtos de consumo e o crédito baratos permitiram à classe média do Ocidente, em franca redução, mitigar a pressão descendente sobre seus níveis de vida, apesar da estagnação ou da queda dos salários e o aumento da dívida pessoal e familiar.
O desenvolvimento da China, impulsionado pelas exportações e baseado nos baixos salários, aumentou consideravelmente a desigualdade de renda no país mais povoado do planeta, durante mais de três décadas. Beijing substituiu Nova York como a nova “capital bilionária do mundo”. O país asiático tem, agora, 594 bilionários, 33 a mais que os Estados Unidos.
A partir dos anos 1980, a desigualdade de renda na China cresceu com maior rapidez que em outros países. O 1% mais rico possui um terço da riqueza do país, ao passo que os 25% mais pobres possuem somente 1%.
O coeficiente de Gini da China passou de 0,3, medido há 30 anos antes, quando era um dos países mais igualitários, para 0,49, em 2012. Outra investigação apresentou o coeficiente de Gini do país em 0,61, no ano de 2010, superando de longe os 0,45 dos Estados Unidos.
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A crescente desigualdade do capitalismo mundial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU