08 Fevereiro 2017
"Em um segundo momento, não haverá como o PGR fugir de medidas que se imporão pela mera divulgação dos fatos – como aconteceu com o vazamento sobre os pagamentos de Odebrecht à conta suíça do tesoureiro de Serra", escreve Luís Nassif, jornalista, em comentário publicado por Jornal GGN, 07-02-2017.
Eis o comentário.
Para melhor entendimento do governo Temer, considere-se, como ponto de partida, de que se trata de um grupo sem a menor compreensão dos rituais do poder. São mais amadores do que o PT em 2003.
Antes do golpe do impeachment, eram políticos cujo campo de atuação sempre foi o baixo clero da Câmara. Em outros tempos, havia deputados referenciais conduzindo por cima o baixo clero – como Delfim Neto, Paulo Maluf, Ulisses. Já o grupo de Temer se destaca entre os menores, como um dos seus, e sabendo distribuir parcimoniosamente os frutos das barganhas políticas e dos financiamentos obscuros.
Os senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, poderiam ser considerados estadistas perto do núcleo de Temer: Michel, Geddel, Eliseu Padilha e Moreira Franco.
Prova maior foi a exposição de Temer aos manifestantes quando da visita a Lula ao Sírio Libanês. Qualquer governante com um mínimo de traquejo enviaria membros de seu staff pessoal para sondar o ambiente. A comitiva de Temer se baseou apenas em um telefonema ao hospital, para saber se havia manifestantes na porta.
Expôs Temer a uma enorme vaia.
As próprias jogadas no poder, de Geddel com o Ministro da Cultura, de Eliseu Padilha apregoando aos quatro ventos os subornos oferecidos à mídia, as trocas de intrigas entre os palacianos, tudo isso denota uma soma de atrevimento com ignorância.
Mas explica em parte a ousadia de indicar Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Alexandre de Moraes iludiu o governador Geraldo Alckmin e o ex-prefeito Gilberto Kassab aparentando uma capacidade gerencial que nunca teve. Por onde passou promoveu desastres monumentais por falta de discernimento, de planejamento e por uma compulsão pelas manchetes (http://glurl.co/n57).
Atritou-se com a Polícia Civil paulista, por se apropriar de todos os feitos policiais. Criou o mesmo desgaste com a Polícia Federal por se pretender um aparador de pés de maconha no Paraguai.
Recém-saído de um cargo na prefeitura, responsável pelo ordenamento do transporte coletivo, montou seu escritório e teve como grande cliente empresas suspeitas de pertencer ao PCC.
Não se imagine que sua indicação para o Supremo visou apenas ampliar a blindagem da camarilha de Temer. É possível que a intenção maior tenha sido permitir a Temer livrar-se de Alexandre sem se expor.
Alexandre Moraes nunca foi do grupo de Temer. Sempre serviu a Geraldo Alckmin. Tornou-se próximo de Temer devido a um episódio que ainda guarda aura de mistério: a recuperação das fotos da primeira-dama Marcela Temer, que tinham sido capturadas por um hacker. Alexandre comandou a caçada ao hacker, recuperou as fotos e conseguiu mantê-las sob sigilo total.
A partir daí, ganhou ascendência sobre Temer, a ponto de ser indicado Ministro da Justiça e ser mantido no cargo, mesmo após desgastar o governo com uma série infindável de desastres verbais e da falta de reflexos para reagir às rebeliões no sistema prisional.
Em circunstâncias normais, nenhum Ministro se manteria no cargo. Alexandre sobreviveu, um mistério ninguém do staff de Temer entendeu.
A maneira mais fácil de Temer se livrar do Ministro da Justiça, sem se expor a eventuais represálias, foi sua nomeação para o Supremo.
Agora, se tem no Supremo ao menos dois ministros absolutamente suspeitos para julgar Temer e seus soldados: Alexandre, nomeado por Temer e provavelmente aprovado rapidamente por um Senado com vários senadores envolvidos nas delações da Odebrecht; e Gilmar Mendes, flagrado visitando o futuro réu Michel Temer, apregoando aos quatro ventos seus trinta anos de amizade com ele, pegando carona para viagens internacionais.
Mas quem irá sustentar sua suspeição?
Certamente não será a presidente Carmen Lúcia quem irá enquadrá-lo. Em algumas oportunidades, Carmen Lúcia expôs a repórteres um grande temor em relação à capacidade de retaliação de Gilmar.
Por outro lado, a reação do Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot foi pedir inquérito criminal contra Romero Jucá, José Sarney e Renan Calheiros, acusados de pretender atrapalhar a Lava Jato, a partir das gravações de Delcídio Amaral (http://glurl.co/n58).
Ao contrário do governo Dilma, Janot enfrenta, agora, políticos abaixo da crítica, mas que sabem manobrar instrumentos de poder. Sobrevivendo à delação da Odebrecht, aliás, é evidente que o governo Temer acabará com o republicanismo ingênuo de indicar para a PGR o procurador mais votado pelos sócios da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) – uma associação, que teria funções de clube corporativo, indicando o PGR!
Mesmo porque é nítido o desgaste de Janot junto aos seus pares, pela falta de liderança sobre a corporação, hoje em dia conduzida pelos procuradores regionais da Lava Jato.
A esta altura, todas as fichas de Janot – e da autonomia do futuro PGR – estão depositadas no PSDB, especialmente no seu conterrâneo Aécio Neves. Mas por quanto tempo manterá a hipocrisia de apregoar a isenção política da Lava Jato, e manter a blindagem sobre seus aliados? Já vazaram as delações da Odebrecht incriminando Serra e Aécio. E certamente o vazamento não veio da PGR.
Pelas expressões do chanceler José Serra, quando fotografado em eventos, o tempo da procrastinação está prestes a se esgotar. Serra sabe agir nas sombras, mas tem medo, pânico de enfrentar situações de conflito. Exemplos disso foi a greve da Polícia Civil, em frente ao Palácio Bandeirantes – quando ameaçaram invadir o Palácio, imediatamente Serra convocou as lideranças e aprovou uma pauta mais generosa do que a proposta da categoria; e os grandes desastres climáticos, com Serra escondendo-se no Palácio.
Agora, o que ameaça desabar sobre ele não é uma mera crise administrativa, mas uma montanha de denúncias. E em um momento em que Serra começa a perder gradativamente a influência sobre a mídia e o temor que infundia nos repórteres.
Bastará um indício sequer que permita abrir as contas da filha, Verônica Serra, para a verdadeira história de Serra vir à tona. Provavelmente Sérgio Cabral perderá o campeonato.
É nesse quadro que há esse conflito entre abrir ou não o sigilo das delações.
Abrindo, haverá uma enchente inicial, com a mídia focando preferencialmente os alvos petistas, mas sem ter como esconder os aliados. Mesmo porque as fontes de vazamento não serão apenas a Procuradoria e os procuradores da Lava Jato, mas um leque muito maior de pessoas envolvidas com a delação.
Em um segundo momento, não haverá como o PGR fugir de medidas que se imporão pela mera divulgação dos fatos – como aconteceu com o vazamento sobre os pagamentos de Odebrecht à conta suíça do tesoureiro de Serra.
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Xadrez do candidato a Ministro do Supremo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU