29 Abril 2017
Um encontro “histórico”, “único no seu gênero” e “indispensável para o mundo de hoje”. O metropolita Emmanuel da França, do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla, sintetiza desse modo o evento da tarde dessa sexta-feira que contou com a reunião do Papa Francisco, do Patriarca Bartolomeu e o papa copta Tawadros, debaixo das abóbadas de Al-Azhar para a Conferência Internacional da Paz.
A reportagem é de Andrea Tornielli, publicada no sítio Vatican Insider, 28-04-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
O Patriarca Bartolomeu aceitou o convite do Grão-Imã Al-Tayyeb para ir a Al-Azhar na Conferência Internacional pela Paz. Qual é o significado da sua presença no Egito?
O Patriarca Ecumênico Bartolomeu aceitou imediatamente o convite do Grão-Imã de Al-Azhar, Ahmed el-Tayeb, por três motivos. O primeiro, como ele recordou no seu discurso introdutório, o Patriarcado Ecumênico, o qual ele preside há mais de 25 anos, faz da promoção da paz uma questão fundamental da sua missão religiosa. Para contrariar o pensamento generalizado que vê a religião como a causa das violências modernas, é necessário desenvolver uma paz exemplar que passa, em primeiro lugar, pelo diálogo. A paz e o diálogo se entrelaçam no pensamento e no compromisso do Patriarca Bartolomeu.
A segunda razão é de que existe uma dimensão inter-religiosa própria do tipo de diálogo que pretendemos promover e está diretamente relacionada com o objetivo da paz que queremos alcançar. Além disso, devemos manter, estou convencido disto, o firme desejo de solidariedade ao lado do mundo muçulmano em nos dissociarmos do terrorismo. Aliás, Sua Santidade expressou isso muito claramente.
Por fim, a terceira razão, o trabalho pela promoção da paz através do diálogo é uma característica própria do ecumenismo moderno. O Patriarca Ecumênico quer, assim, mostrar a sua proximidade à Igreja Copta, fortemente em luto depois dos ataques de 7 de abril, que atingiram duas das suas comunidades. Além disso, a presença concomitante do Papa Francisco no Egito reforça a ideia de que todo empenho ecumênico deve ser uma ação de solidariedade para com os mais fracos.
Como definiria a presença do sucessor de Pedro, Francisco, e do seu irmão Bartolomeu, sucessor do apóstolo André, perto do papa copta Tawadros II neste momento histórico particular?
Como eu disse anteriormente, acho que a dimensão ecumênica dessa Conferência Internacional pela Paz é uma consequência natural. Precisamente por causa dos recentes ataques contra a Igreja Copta, a dimensão ecumênica tornou-se inegável, senão até fundamental. Sabe-se que muitos encontros entre os bispos de Roma e de Constantinopla, depois da eleição do Papa Francisco em 2013, destacaram a necessidade de apoiar os cristãos no Oriente. Por causa da sua posição geográfica particular, o Patriarcado Ecumênico faz parte desse mosaico e conhece as dificuldades em questão. Isso para reiterar a urgência de encontrar uma resposta política para a crise que marcou o Oriente Médio e que leva centenas de milhares de pessoas ao exílio e, entre eles, um imenso número de cristãos. Além disso, a paz é a primeira condição necessária para a sua proteção. Infelizmente, as notícias recentes nos lembram, muito frequentemente, como essa paz é frágil.
Portanto, um sinal para a paz no mundo...
Eu acho que esse é um sinal para o mundo, não só o fato de ver o encontro entre líderes religiosos de relevância mundial – como já aconteceu no passado –, mas sobretudo porque esse encontro ocorre sob os auspícios do grão-imã de Al-Azhar. No Egito, um país de maioria muçulmana em que reside a maior comunidade cristã da região, esse encontro simboliza um desejo real de paz. É por isso que eu acho que a Conferência Internacional é um encontro único no seu gênero, representando o advento de uma nova era. Por isso, estou particularmente feliz pelo fato de Francisco, Bartolomeu e Tawadros terem sido capazes de alcançar esse marco ecumênico indispensável para o mundo de hoje.
Qual é o sentido da visita a Al-Azhar? O que pode nos dizer sobre a relação entre a Igreja Ortodoxa e o mundo muçulmano?
A visita de Al-Azhar foi desejada pelo próprio Patriarca Ecumênico, convencido do poder de transformação do diálogo. O diálogo não é para convencer, nem para converter. Por diálogo, entende-se uma abordagem propriamente teológica, senão espiritual, semelhante ao cuidado pastoral de que falam os Padres da Igreja. Talvez não se lê nas primeiras linhas do Evangelho de São João: “No princípio era o Verbo...” (Jo 1, 1)? O diálogo, portanto, é encontro. É um trabalho de introspecção que nos leva a ver os outros como são e não como nós pensamos que eles sejam.
Vejo aqui uma característica do Patriarca Bartolomeu. Nesses últimos 25 anos, ele teve a coragem de pensar que a Igreja podia e devia interagir com o mundo em toda a sua diversidade, sem medo de perder a própria identidade, sem temor de se pôr em discussão, mas reforçada pela abertura do coração. Quanto às relações com o Islã, elas estão progredindo. Acho que hoje, mais do que nunca, precisamos estar presentes ao lado dos muçulmanos discriminados por causa da confusão criada pelo terrorismo e pelo extremismo religioso. A presença de tantos líderes religiosos no Cairo hoje demonstra que essa abordagem é compartilhada e contraditória, ao menos espero, com aqueles que querem fazer do Islã uma “religião do medo”.
De que modo, na sua opinião, pode-se parar o fundamentalismo e os ataques terroristas contra as pessoas, sejam cristãs ou muçulmanas?
O encontro destes dias é uma excelente resposta à sua pergunta. Para combater o fundamentalismo religioso que anima o terrorismo, devemos, primeiro, encontrar-nos, expor-nos à diversidade do mundo e abraçá-la movidos pela Graça. Deve-se compreender que o fundamentalismo religioso, nas suas dimensões mais conflitantes e violentas, é principalmente o resultado do isolamento alimentado por preconceitos e por outras representações aptas a favorecer o antagonismo. A fé, quando vivida como uma força libertadora, opõe-se, porque faz do encontro o ponto de partida de uma renovada solidariedade humana. O Patriarca Bartolomeu disse na sua mensagem por ocasião da abertura da conferência: “O maior desafio das religiões é desenvolver o seu próprio potencial de amor, de solidariedade e de compaixão. Isso é o que a humanidade espera da religião hoje”.
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"O encontro em Al-Azhar, um sinal de paz para o mundo" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU