O trânsito religioso em Novo Hamburgo: quem é quem nos Censos de 2000 e 2010

  • Segunda, 1 de Julho de 2013

Dados declarados pela população de Novo Hamburgo nos censos de 2000 e 2010 referentes a religião foram reunidos pelo Observatório da Realidade e das Politicas Públicas – ObservaSinosInácio Spohr, Mestre em Ciências Sociais, coordenador do Programa Gestando o Diálogo Inter-Religioso e o Ecumenismo – GDIREC, é quem faz a análise destes dados.


O ObservaSinos e o GDIREC são programas do Instituto Humanitas Unisinos – IHU.

Eis o texto.

Situada no Vale do Rio dos Sinos1, Novo Hamburgo apresenta, segundo o Censo de 2010, uma população composta por 238.940 habitantes2. Cidade líder do setor coureiro-calçadista, é conhecida tanto no Rio Grande do Sul quanto em todo o país como a “capital do calçado”. Marcada por grande ascendência germânica, a cidade conta com uma vasta rede pública e privada de ensino, bem como conta com um amplo campus universitário, o da Universidade FEEVALE. Contudo, entre 2000 e 2010 a cidade de Novo Hamburgo pouco cresceu em termos populacionais. Pois, durante esta década, acrescentou somente 2.847 habitantes (cf. tabela 1).

Meu objetivo, neste texto, visa mostrar dados do IBGE extraídos das amostras dos Censos de 2000 e 2010 – com alguns poucos comentários – relativas ao trânsito religioso na cidade de Novo Hamburgo. Quais religiões estão em crescimento, quais estão em recuo e quais se mantêm aqui e ali, com pequenas variações numéricas. Enfim, quem é quem na diversidade religiosa de Novo Hamburgo nesta última década.

Religiões cristãs

Similar a outras regiões do Vale do Rio dos Sinos, o último Censo do IBGE confirma que a população de Novo Hamburgo (tabela 1) mantém grande preferência por religiões cristãs onde, em 2010, os católicos contam com 151.442 habitantes (63,38%) e onde os evangélicos alcançam 69.325 habitantes (29,01%). Religiões cristãs de menor porte, como a “Católica Apostólica Brasileira” e a “Católica Ortodoxa”, neste mesmo município, apresentam respectivamente, 1.165 (0,49%) e 201 (0,09%) adeptos. A religiosidade cristã em Novo Hamburgo registra, portanto, maciça maioria, perfazendo um total de 92,97% adeptos, o que equivale a 222.142 indivíduos, sobre o total de 238.940 habitantes.

Observadas as transições religiosas entre 2000 e 2010, cabe destacar que a religião Católica vem cedendo espaço a outras opções religiosas. Em 2000 detinha 72,09% da população, enquanto que em 2010 mantém somente 63,37%, o que corresponde a uma diminuição de 8,71% de adeptos. Paralelamente, as evangélicas registraram um acréscimo de 6,12% em suas fileiras. A “Católica Ortodoxa”, embora infimamente representada entre as opções religiosas de Novo Hamburgo, em 2000 passa de tão somente 12 opções, para 210, em 2010.

Não obstante, e aqui, creio, está a novidade do trânsito religioso em Novo Hamburgo, as opções cristãs tiveram diminuição de adeptos, apesar do crescimento pentecostal que podemos verificar na tabela 3. Segundo dados do IBGE, no ano de 2000 (tabela 1), a religiosidade cristã detinha 95,56% opções, enquanto que em 2010 estas diminuem para 92,97%3.


Religiões evangélicas de missão

No campo das religiões “Evangélicas de Missão” (assim denominadas pelo IBGE), observamos que, no ano de 2000 (tabela 2), estas detinham 29.225 opções (12,37%) e que no Censo de 2010 passam a ter somente 23.366 opções (9,78%). Esta diminuição corresponde, portanto, a 2,59% da população. A redução de adeptos entre as Evangélicas de Missão é observada sobretudo entre as denominações “Igreja Evangélica Luterana”, “Igreja Evangélica Metodista”, “Igreja Evangélica Batista” e “Igreja Evangélica Adventista”. Não há dados comparativos para a denominação “Igreja Evangélica Presbiteriana”. A “Igreja Evangélica Congregacional”, com pouquíssimos adeptos, se manteve praticamente estável.

 

Religiões evangélicas de origem pentecostal

No grupo das religiões evangélicas de origem pentecostal (tabela 3) percebemos, nesta última década, nítido crescimento no número de seus adeptos. Se em 2000 tiveram 22.134 opções (9,37%), em 2010 estas passam a somar 28.326 (11,83%). Cresceram as denominações pentecostais “Igreja Assembleia de Deus”, “Igreja o Brasil para Cristo”, “Igreja Evangelho Quadrangular” e “Igreja Deus é Amor”. Diminuíram de tamanho as denominações “Igreja Congregação Cristã do Brasil”, e “Igreja Universal do Reino Deus”. Para as denominações “Comunidade Evangélica”, “Casa da Benção” e “Outras de origem pentecostal” não há dados comparativos entre 2000 e 2010. Já as evangélicas de origem pentecostal denominadas “Igreja Maranata”, “Igreja Nova Vida” e “Evangélica renovada não determinada” não marcaram pontos no Censo de 2000, e nem no de 20104.

Evangélicas sem vínculo institucional e Múltiplo pertencimento

As opções religiosas “Evangélicas sem vínculo institucional” (tabela 4) apresentam dados relativos somente ao Censo de 2000. Isso porque o Censo de 2010, curiosamente, abandona a coleta de dados sobre práticas religiosas sem vínculo institucional, tão bem ensaiado no Censo anterior.

De qualquer forma, no ano de 2000 os evangélicos sem vínculo com instituições religiosas somam 1.653 pessoas (0,7%). Desses, 1.196 (0,51) são “Evangélicos” (serão estes não praticantes originários das Evangélicas de Missão?)5 e 457 são de origem pentecostal (0,19%).

Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, Testemunhas de Jeová, Espírita e Espiritualista

A tabela 5 reúne algumas opções religiosas numericamente pouco significativas diante da população total de Novo Hamburgo. Não obstante o pequeno número de participantes nestas religiões, destacar sua presença aqui ajuda a compreender os caminhos da diversidade religiosa nesta cidade. Aos poucos, vão firmando seus passos. A “Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias”, nesta última década, passa de 479 adeptos para 571 e a “Espiritualista” passa a ter 120 adeptos em 2010, quando em 2000 aparecia sem nenhum representante. A religião “Testemunhas de Jeová”, por sua vez, passa de 1305 aderentes para 1955. Já a Doutrina Espirita que, em 2000 tinha 1.509 declarantes, em 2010 alcança 3.380. Os espíritas, portanto, mais que dobram seus adeptos nesta última década.

Religiões Esotéricas e Indígenas

Os dados da Amostra dos Censos de 2000 e 2010 não denominam explicitamente as diferentes formas de crer elencadas sob o nome “Religiões Esotéricas”. Pouco numerosas, talvez, não precisam de tanto. A tabela 6 informa que, em 2000, as Esotéricas tinham 80 adeptos (0,03%) e que em 2010 estes são 120 (0,05%). As religiosidades ligadas a tradições indígenas não marcam pontos em nenhum dos Censos, embora, em 2010, haja 169 (0,07%) declarantes “indígenas” no município.

Religiões Afro-Brasileiras

As expressões religiosas Afro-Brasileiras em Novo Hamburgo (tabela 7) não são muito numerosas. Menor que a de municípios com índice populacional inferior como São Leopoldo5 e Esteio6, situados na mesma região. Entre as dificuldades que condicionam as adesões religiosas Afro-Brasileiras, algumas delas de cunho histórico, está a dificuldade relacionada à denominação usada pelo Censo. O termo “Candomblé”, embora recorrente no centro do país, não é usual no Rio Grande do Sul. No Vale dos Sinos predominam, entre outros, as denominações “Religião Africana”, “Nação”, ou simplesmente “Religião”. Com certa frequência dizem “sou de Religião”.

Posto isso, vamos aos números. De acordo com os dados levantados pelas Amostras dos Censos do IBGE, no ano de 2000 as religiões “Umbanda” e “Candomblé” detinham, respectivamente, somente 312 e 89 praticantes. Em 2010 estas formas de crer passam então a contar com 807 adeptos na Umbanda e 80 adeptos no Candomblé. A opção Candomblé, portanto, já ínfima, diminui ainda um pouco mais nesta última década, enquanto que a Umbanda teve um acréscimo superior ao dobro do número de praticantes. “Outras declarações de religiosidade afro-brasileira” apresentam, em 2010, somente 71 opções.

Se considerarmos o ponto de vista “cor ou raça”, o Censo de 2010 informa que Novo Hamburgo apresenta 7.935 (3,32%) habitantes “pretos” e 14.234 (5,96%) habitantes “pardos”. Pretos e pardos perfazem, portanto, 22.169 (9,28%) habitantes. Embora 9,28% da população de Novo Hamburgo esteja representada por pretos e pardos, os praticantes das religiões afro-brasileiras somam apenas 0,4% de pessoas sobre a população total do município. Mesmo assim, durante esta década, Umbanda teve um acréscimo considerável: passa de 312 para 807 praticantes.

Religiões Orientais

Em menor número ainda que as religiões esotéricas e indígenas (tabela 6) e afro-brasileiras (tabela 7), as religiões orientais (tabela 8) ainda não passam de uma promessa na cidade de Novo Hamburgo. Contudo, tanto o “Budismo” quanto a “Igreja Messiânica Mundial” tiveram alguns acréscimos em suas fileiras durante os últimos 10 anos. O Budismo passa de 38 para 132 praticantes e a Messiânica que, inicialmente tinha só 30 participantes, passa a contar com 85. “Outras novas religiões orientais” tiveram 5 opões em 2010 e “Outras religiões orientais” tiveram 10 anotações somente no ano de 2000.

Judaísmo e Islamismo

Tanto o “Judaísmo” quanto o Islamismo encontram poucos adeptos em todo o Vale do Rio dos Sinos8. Em Novo Hamburgo (tabela 9) a representação destas religiões milenares é especialmente muito pequena. O Judaísmo, que não teve adeptos em 2000, anota somente 12 em 2010. O Islã, que somou 33 adeptos em 2000, não teve quem anotasse essa opção em 2010.

Não Determinada e Múltiplo Pertencimento

A pesquisa do IBGE que foca o “Múltiplo pertencimento” religioso (tabela 10), ausente no Censo de 2000, no de 2010 é apresentada sob a denominação religião “Não determinada e múltiplo pertencimento – Religiosidade não determinada ou mal definida”. O item reúne, portanto, uma série de opções, talvez de forma demasiado elástica, onde a frequência simultânea a mais de uma religião se encontra diluída entre as opções “não determinada” e “mal definida”. Se nos fosse permitido vislumbrar quantos realmente transitam em dois ou mais credos religiosos, fato, aliás, bastante corriqueiro em nosso país, seria bem interessante.

Segundo a tabela 10, encontramos em Novo Hamburgo, no Censo de 2010, um conjunto de 882 indivíduos classificados sob o item religião “Não determinada e múltiplo pertencimento”, o que corresponde somente a 0,37% sobre o total da população. A opção religiões “Não determinadas”, com 364 anotações, e “Sem declaração”, com 299 anotações, foi pesquisada pelo IBGE somente no Censo de 2000.

Sem religião, ateus e agnósticos

Como no caso das tabelas anteriores (tabelas 7 e 10), também aqui (tabela 11) percebe-se uma lacuna que dificulta a compreensão dos dados coletados pelos últimos Censos do IBGE. No de 2000 a pesquisa se ocupa unicamente com a opção “Sem religião” enquanto que no Censo de 2010 somos contemplados com referências a “Sem religião”, “Ateus” e “Agnósticos”. É verdade que os números da tabela não são muito alentados, mas nem por isso tem sua importância diminuída. Em Novo Hamburgo, assim como em outros municípios da região, não crer em Deus, declarar-se ateu ou afirmar ser agnóstico requer, no mínimo, um grau razoável de coragem. Isso porque em terras onde o índice de adesão religiosa é muito alto, como é caso desse município, “normal” é professar uma forma de crer, é estar vinculado a uma expressão religiosa. Não crer em divindades, afirmar-se ateu, ainda vem a ser classificado, por mais razoável que possa parecer, como gesto de rebeldia. Diante de uma realidade que, conforme a cultura dominante tende a ser guiada por Deus, como, aliás, advertem decalques em carros e caminhões, uma vida sem Deus soa, no mínimo, estranha.

Portanto, de acordo com o Censo de 2000, há no município de Novo Hamburgo 5.803 habitantes (2,46%) que anotaram a opção “Sem religião”. Em 2010 o mesmo conjunto passa a contar com 7.557 habitantes (3,16%). Discriminados os dados, temos então 6.595 pessoas na opção “Sem religião”, 844 na de “Ateu” e 118 na rubrica “Agnóstico”. Por que tantos sem religião e tão poucos ateus e agnósticos Possivelmente porque o termo “sem religião” mostra ser mais palatável à cultura (religiosa) que o de ateu e agnóstico.

 

Notas:

1 - Municípios do Vale do Rio dos Sinos: Araricá, Campo Bom, Canoas, Dois Irmãos, Estância Velha, Esteio, Ivoti, Nova Hartz, Nova Santa Rita, Novo Hamburgo, Portão, São Leopoldo, Sapiranga, Sapucaia do Sul e Taquara.
2 - Cf. “População e mapa político do Vale dos Sinos”, disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/noticias-anteriores/38082-populacao-e-mapa-politico-do-vale-dos-sinos.
3 - Segundo a pesquisa Religiões e Religiosidades na Região Metropolitana de Porto Alegre – in Follmann, José Ivo. O Mundo das Religiões em Novo Hamburgo. Cadernos do CEDOPE, Instituto Humanitas Unisinos-IHU, Série Religiões e Sociedade, ano 14, nº 17, 2002, p. 09 – este município apresentava os seguintes números relativos a LOCAIS E TEMPLOS DE CULTO RELIGIOSO: Afro/Umbanda, 41; Kardecistas, 4; Católica, 45; Pentecostais e Neopentecostais, 97; Protestantes Históricas (Evangélicas de Missão), 35; Diversas, 16. Total: 238.
4 - Embora façam parte da listagem das denominações submetidas à pesquisa pelo IBGE, as religiões “evangélicas de origem pentecostal”, acima citadas não foram incluídas na tabela 3 por não terem presença em nenhum dos Censos considerados.
5 - Mormente é mais fácil obter informações sobre “católicos não praticantes” do que sobre evangélicos e pentecostais nestas mesmas condições. Não há registros sobre a diferenciação entre católicos praticantes e católicos não praticantes nos Censos aqui considerados.
6 - Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/areas/trabalho/observa-sinos/520303-opcoes-religiosas-em-sao-leopoldo
7 - Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/areas/trabalho/observa-sinos/520809-opcoes-religiosas-em-esteio
8 - Judaísmo e islã marcam maior presença em Porto Alegre. Esta última, sobretudo na região fronteira-sul.