Mais do que prestar diagnósticos ou relatórios governamentais, a publicização dos Indicadores sociais deve ir ganhando um papel cada vez mais relevante nas discussões políticas e sociais da sociedade brasileira, conforme a lição de Paulo de Martino Jannuzzi (2009). Por esse caminho, o ObservaSinos empenha-se no trato das informações e, em especial, ao longo deste mês de julho, dos indicadores educacionais.
Em sua última publicação, o Observatório abordou os dados sobre o rendimento educacional no Vale do Sinos e nesta semana foca sua análise sobre a taxa de distorção idade-ensino do ensino médio no Vale do Sinos. Esta contribuição é resultado da pesquisa e análise realizada pelo professor e pesquisador Ricardo Ferreira Vitelli, que atua no Observatório da Educação da Unisinos.
Distorção idade-série e a previsão legislativa
Para Vitelli, antes de tudo, duas questões devem ser ponderadas em relação à taxa de distorção idade-série. Primeiramente o fato de que o Ensino Médio tem sido pouco pesquisado e em segundo lugar, o fato de que “grande parte das políticas públicas voltadas para a melhoria da qualidade do ensino se foca no fracasso escolar e na preocupação que a distorção idade-série esteja atuando diretamente no resultado dos indicadores de abandono e reprovação”. É preciso, portanto, ter claro que outros indicadores ajudariam a entender melhor os resultados, diminuindo as incertezas, sustenta Vitelli.
O que indicaria, então, a taxa de distorção idade-série? Para Ricardo, esta taxa, revela fatores mais subjetivos que contribuem para o entendimento do seu resultado. E exemplifica destacando a compreensão do desempenho dos alunos com relação a sua situação em sala de aula na condição de estarem acima dos demais alunos.
Para um maior esclarecimento Ricardo Ferreira pondera que, “conforme a legislação que organiza o ensino no país, a criança deve ingressar no 1º ano do Ensino Fundamental aos seis anos e concluí-lo aos 14, para nove anos de educação fundamental. Na faixa etária dos 15 aos 17 anos o jovem deve estar matriculado nos três anos do Ensino Médio, respectivamente”.
É alta a taxa de distorção
As taxas nacionais, regionais e estaduais de distorção idade-série estão apresentadas no Gráfico 1:
Ricardo analisa: “Por meio deste gráfico, as taxas de distorção, no ensino médio brasileiro podem ser consideradas altas. Em alguns casos pode-se observar uma redução. No caso nacional a taxa tem se mantido relativamente estável neste período analisado (2008-2010). Considerando os estados da região sul do país a realidade educacional mostra que as taxas de evasão são menores, se considerarmos que os resultados do Rio Grande do Sul estão incluídos neste resultado, então a realidade dos demais estados é melhor, uma vez que os resultados no estado são próximos da realidade nacional”.
No Vale do Sinos
As taxas de distorção idade-série nos anos de 2008, 2009 e 2010 do Vale do Sinos detalhadas na Tabela a seguir também foram analisadas pelo pesquisador.
Para Vitelli “ao considerar as taxas de distorção idade-série dos municípios da Região do Vale dos Sinos (tabela 1) é possível destacar que existem diferenças significativas entre as taxas por município. Em 2010, enquanto que a taxa em Araricá é de 46,5%, em Ivoti é de 16,1%. Estes resultados mostram que diferentes realidades são comparadas sem que se perceba um maior cuidado com relação a este fato. Diferenças podem estar ligadas a fatores de ordem econômica, cultural ou social que se reflete em resultados nos indicadores, o mesmo fato acontece na comparação de diferentes escolas. Tentar avaliar a qualidade da educação apenas na comparação de resultados ou desempenhos em avaliações em larga escala é utilizar um critério reducionista, pois diferentes realidades interferem nos resultados dos indicadores, principalmente quantitativos. De modo geral é importante destacar que praticamente todos os municípios têm conseguido reduzir as taxas de distorção idade-série. Em municípios como Ivoti houve uma redução de 32,07% na taxa de distorção idade-série de 2010, comparativamente a 2008, no mesmo período Novo Hamburgo houve um acréscimo de 2,24%. Para um melhor entendimento sobre estes resultados é preciso avaliar as políticas públicas adotadas em cada município e a política de gestão adotada”.
Indicadores quantitativos e qualitativos
Em relação aos resultados, o Observatório da Educação tem refletido que a utilização de indicadores quantitativos merece complementação por meio de aplicação de estudos qualitativos para uma melhor compreensão e intervenção nesta realidade. Neste sentido, Vitelli enfatiza que “na triangulação de informações quantitativas e qualitativas torna-se possível ter uma noção mais aprofundada da realidade pesquisada. Ainda assim, é importante observar a educação também a partir dos resultados destes indicadores, ainda que tenhamos críticas a respeito dos mesmos. São utilizados pelo Estado como fonte de referência para a construção de políticas públicas educacionais. Seu monitoramento é utilizado com o objetivo de avaliar a qualidade da educação bem como a eficiência das políticas públicas educacionais”.
Da educação básica ao Ensino médio?
Outro dado da realidade importante diz respeito à sequencialidade entre a educação básica e o ensino médio, que necessita ser levada em conta. O pesquisador destaca: “a preocupação com a Educação Básica, nos últimos anos, se pautou no fato de que era necessário o acesso à educação para todos. Ao observar os resultados desta política se percebe que grande parte das crianças está na escola, pelo menos nos anos iniciais. Com o passar do tempo vai se criando uma cultura de fracasso escolar onde alguns acabam abandonando a escola e outros tentam seguir adiante, mas devido a constantes reprovações acabam constituindo um grupo em condição de distorção idade-série. Por sua vez, este grupo acaba gerando mais abandono escolar e nos últimos anos do Ensino Médio a perda do sistema em termos de alunos e alunas é gigantesca. Com isso verificamos que não é suficiente apenas incluir todos no sistema educacional, mas é necessário também pensar em como transcorre o percurso da vida escolar destas crianças e adolescentes”.
As causas da distorção
No caso específico do Ensino Médio, outro elemento a ser considerado é quanto à trajetória dos estudantes, já que grande parte da população em idade escolar está fora do Ensino Médio e, existe um grande número de abandonos, sustenta o pesquisador. Para ele então, “os resultados mostram que existem determinados perfis de estudantes que têm maior propensão a abandonarem o sistema escolar. Um aspecto importante apontado foi com relação aos alunos e alunas do turno noturno. Por diversas razões este público se mostra mais fragilizado e propenso ao abandono ou reprovação, somando-se a esta realidade o fato de estarem em condição de distorção idade-série os resultados dos indicadores pesquisados mostram um cenário preocupante. A taxa de distorção idade-série tem se reduzido, no Ensino Médio, nos últimos anos, porém ainda está acima de um patamar aceitável. Por outro lado, apesar desta redução ainda temos um em cada cinco estudantes em condição de distorção idade-série no Ensino Médio brasileiro. Considerando este resultado especificamente para os estudantes do noturno a realidade é mais preocupante”.
Políticas de resultados e distorções
Sobre as políticas educacionais e a relação educação e emprego afirma o Professor Ricardo que: “algumas políticas educacionais de correção de fluxo escolar são adotadas pelo Estado no sentido de corrigir a taxa de distorção idade-série, tais como o Programa de Aceleração de Aprendizagem e a Educação de Jovens e Adultos. Com relação à Educação de Jovens e Adultos (EJA), no caso do Ensino Médio, a realização da EJA como forma de aceleração das séries também tem resultados que demonstram uma fragilidade para a continuidade dos estudantes no Ensino Superior. O que acaba acontecendo é que muitos buscam a concretização de um diploma do Ensino Médio apenas para conseguirem um emprego”.
Contextos diferenciados em relação à estrutura, horário e outras condições, também devem ser considerados em um processo avaliativo. É neste sentido que analisa o Professor Vitelli: “o Ensino Médio se diferencia conforme as realidades de cada escola, os anos das séries pesquisadas, os turnos de estudo e as condições dos estudantes. Por este motivo analisar simplesmente o resultado do indicador é um risco muito grande. Cabe também destacar que existem diferenças entre escolas. Quando em distorção idade-série os estudantes têm maiores taxas de reprovação e abandono escolar, retroalimentando a condição de fracasso escolar. Outro fato importante a destacar é que se conjugar a informação de que os estudantes estejam em condição de distorção idade-série com estudarem no noturno, os resultados dos indicadores MEC tendem a piorar, na comparação de estudantes em outras condições”.
É possível ainda, conforme o Pesquisador Vitelli, concluir que “a taxa de distorção idade-série revela uma parcela de estudantes do sistema que, apesar de receber um conjunto de políticas a eles direcionado não produz efeitos consideráveis. Uma parte de combate a este indicador acontece ao se diminuir à quantidade de pessoas sem condições de ingressarem no sistema educacional. Com isso, ao longo do tempo, a parcela da distorção idade-série, decorrente daqueles que não conseguiram ingressar na educação regular, quando tinham idade para tanto, acaba diminuindo”.
Contanto, é de perceber, conforme Ricardo, “que todos os problemas decorrentes do fracasso escolar continuam ainda sem um atendimento eficaz, uma vez que os resultados apresentados revelam altas taxas de reprovação e abandono, no Ensino Médio, principalmente quando avaliamos seus resultados a partir dos indicadores da Educação Básica do Ministério da Educação”.
Outros dados sobre os indicadores educacionais assim como indicadores da realidade dos municípios do Vale do Sinos podem ser acessados na página do ObservaSinos.