23 Junho 2016
Durante o encontro em Creta, líderes ortodoxos adotaram um documento sobre a missão da ortodoxia no mundo moderno, apesar das tensões causadas pela ausência de várias igrejas do encontro histórico.
"Houve tantos desenvolvimentos e mudanças - políticas, sociais, científicas -, principalmente nas últimas décadas, que nossa igreja não pode mais ficar de fora ou à margem de tudo isso", disse o Arquidiácono do Trono Ecumênico de Constantinopla* John Chryssavgis, porta-voz do Patriarcado Ecumênico de Istambul. "A Igreja precisa lidar com questões como a bioética, mudanças climáticas, direitos humanos e discriminação e levá-las a sério, incorporando-as de uma maneira inspiradora, profética, construtiva e reconfortante".
A reportagem é de Jonathan Luxmoore, publicada por National Catholic Reporter, 21-06-2016. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Ele falou em uma conferência de imprensa, em 21 de junho, após o segundo dia de debates a portas fechadas no Santo e Grande Concílio, que acontece na ilha grega e conta com a participação de 170 bispos e metropolitas de 10 igrejas ortodoxas. Ele disse que as igrejas ortodoxas podem "adotar uma perspectiva singular" frente às discussões contemporâneas ao enfatizar suas tradições espirituais, "articulando novas respostas, e não repetindo respostas antigas".
Enquanto isso, outro porta-voz Ortodoxo, o Arcebispo Job Getcha de Telmessos, disse que foram considerados os apelos a uma "nova instituição", que se reuniria a cada cinco anos para garantir que as decisões do Conselho sejam "atendidas em todo o mundo ortodoxo."
Ele acrescentou que isto havia sido proposto em janeiro passado pelo chefe da Igreja Ortodoxa da Romênia, o Patriarca Daniel Ciobotea, e foi reiterado em 20 de junho pelo arcebispo do Chipre, Chrysostomos II.
A semana de Concílio, o primeiro deste calibre em mais de mil anos, está acontecendo em Kolymbari, em Creta, apesar do boicote do Patriarcado de Antioquia e das igrejas ortodoxas na Geórgia, na Bulgária e na Rússia.
A "Missão da Igreja Ortodoxa no mundo de hoje" relata que a Ortodoxia também tem "a preocupação e a ansiedade típica da humanidade contemporânea em relação a questões existenciais fundamentais" e que ajudaria "a erradicar qualquer fanatismo e a estabelecer a reconciliação entre os povos".
A declaração de 4400 palavras acrescenta ainda que a liberdade é "um dos maiores dons de Deus", e que poderia levar os seres humanos à "perfeição espiritual", ao mesmo tempo em que implica "o risco da desobediência se encarada como independência de Deus".
O documento lista como "consequências contemporâneas do mal" o secularismo, o racismo, a "frouxidão moral" e a opressão dos grupos sociais e comunidades religiosas, bem como a "manipulação da opinião pública", a desigualdade social, a miséria, a migração forçada, o tráfico de pessoas e a destruição ambiental.
"A Igreja Ortodoxa admite que todo ser humano, independentemente de cor, religião, raça, sexo, etnia e idioma, é criado à imagem e semelhança de Deus e goza de direitos iguais na sociedade", afirma a declaração.
"Em tempos de secularização marcada por uma crise espiritual característica da civilização contemporânea, é necessário destacar a sacralidade da vida. Quando se entende a liberdade como permissividade, há um aumento da criminalidade, da destruição e desfiguração do que é altamente respeitado, bem como o total desrespeito para com a liberdade do outro".
O documento diz que a crise financeira aumentou as desigualdades entre pobres e ricos, e levou a "práticas comerciais abusivas, sem qualquer senso de justiça e sensibilidade humanitária". Além disso, acrescenta que os meios de comunicação muitas vezes são controlados pela "ideologia da globalização liberal", que leva à "propagação do consumismo e da imoralidade".
A declaração diz também que a missão da Ortodoxia inclui promover "a universalidade dos princípios de paz, liberdade e justiça social", acrescentando que a Igreja condena a "guerra em geral", especialmente quando provocada pelo fanatismo religioso ou "inspirada pelo nacionalismo, levando à limpeza étnica, à violação de fronteiras estatais e à apreensão de territórios".
Fontes do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla disseram que a declaração havia sido aprovada com "mudanças muito pequenas" e que a série de alterações que tinha sido aberta para discussão, em março, pelo metropolita grego Metropolitan Vlachos de Nafpaktos, um líder conservador, havia sido rejeitada por unanimidade.
Cinco outras declarações deverão ser aprovadas pelo Concílio - sobre a diáspora ortodoxa, a autonomia da Igreja, o jejum, o matrimônio e sobre as relações com outras Igrejas cristãs.
Chryssavgis disse, na conferência de imprensa de 21 de junho, que todas as decisões do Concílio seriam tomadas por consenso, ao invés de maioria de votos, para permitir que igrejas menores sintam-se igualmente representadas.
Enquanto isso, o assessor do Patriarcado Ortodoxo da Romênia, Ionut Maurice, disse que a declaração teve "grande importância" como uma primeira tentativa das igrejas ortodoxas "de abordar os problemas da modernidade de uma maneira conciliar e sinodal".
Ele acrescentou que os debates sobre o documento haviam sido "emocionantes e empáticos", indo "da metafísica à pobreza".
"Nossa igreja não pode resolver todos os problemas de uma só vez - mas com esta declaração a normalidade começou a ser colocada em prática", disse Maurice. "Algumas pessoas têm tentado estruturar conciliaridade e sinodalidade de forma quantitativa. Mas este Concílio representará a Ortodoxia, mesmo que algumas igrejas tenham ficado de fora".
Cada igreja ortodoxa pode ter 24 representantes para a reunião em Creta, embora apenas dois - o Patriarcado Ecumênico e a igreja da Albânia - tenham incluído mulheres em suas delegações.
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Concílio ortodoxo aprova primeiro documento conjunto sobre missão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU