05 Janeiro 2016
Se toda a política é, de fato, local, então não devemos esperar que o foco de Francisco no meio ambiente e nas mudanças climáticas venha a se desviar tão cedo, na medida em que o seu próprio quintal, Roma e toda a Itália, se esforça para sair de uma das crises atmosféricas mais flagrantes da história recente.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada por Crux, 29-12-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
A combinação envolvendo uma seca prolongada, que já chega ao 60º dia sem chuva nas grandes cidades do país, com níveis elevados de partículas nocivas no ar criou uma situação de poluição tão severa na última semana de dezembro que fez com que a cidade de Milão tomasse uma atitude inédita, bloqueando a circulação de carros no centro da cidade entre as 10h e as 16h e impondo multas que variam de $ 180 a 730 dólares a quem infringir o decreto.
Roma adotou uma medida ligeiramente menos draconiana, permitindo a circulação de carros no centro da cidade com placas terminadas em par ou ímpar, em dias alternado, e dando descontos para quem usar o transporte público.
Isso tudo não se deve, porém, ao fato de que a poluição é um pouco menos severa na Cidade Eterna.
Um relatório governamental divulgado no final de dezembro de 2015 estima que 1.400 romanos morrem a cada ano devido a fatores agravados pela poluição ambiental, e nesta semana uma associação local de médicos recomendou manter as crianças dentro das casas e limitar a prática de esportes durante o tempo em que a crise persistir.
A mesma associação relatou um aumento significativo de doenças respiratórias, problemas de sinusite e laringite em Roma no mês de dezembro, relacionando tais casos à atual situação ambiental. Essa situação tem estado tão presente no espaço público da cidade que podemos ver um número crescente de pessoas usando máscaras cirúrgicas em um esforço para se protegerem.
Epidemiologistas locais criaram um sítio eletrônico com mapas da cidade atualizados continuamente, mostrando as concentrações de partículas nocivas, o que confirma que o Vaticano se encontra no meio de uma das regiões, em geral, mais poluídas.
Outras comunidades italianas deram passos mais drásticos para tentar limitar a poluição.
Na cidade de Frosinone, cerca de uma hora de Roma – e apelidada de a cidade mais poluída do país após um estudo feito –, o prefeito impôs uma proibição total do tráfego de automóveis até a véspera de Ano Novo, declarando que “o direito à saúde deveria ser considerado uma prioridade com respeito tudo o mais”.
Na última semana de dezembro, uma cúpula de emergência composta por prefeitos e governadores italianos deve se reunir em Roma para abordar a situação.
Nesse contexto, os políticos italianos e representantes da sociedade civil de todos os matizes vêm citando as posturas sobre o meio ambiente assumidas pelo Papa Francisco como uma direção a ser seguida.
“Para sairmos deste problema, precisamos adotar novos estilos de vida, conforme o Papa Francisco pede em sua encíclica Laudato Si’”, disse Nicola Ottaviani, prefeito de Frosinone, referindo-se ao documento emitido por Francisco em junho de 2015.
O meio ambiente foi uma das grandes preocupações do papa ao longo de 2015, com grande parte de sua atenção voltada à cúpula das Nações Unidas sobre mudanças climáticas COP 21 que se reuniu em Paris no fim no segundo semestre. Durante uma visita à sede do Programa da ONU para o Meio Ambiente em Nairóbi, no Quênia, pouco antes da cúpula se reunir, ele advertiu que seria “catastrófico” se não se conseguissem adotar limites claros no que diz respeito à emissão de gases de efeito estufa.
Alguns analistas deram ao pontífice créditos parciais pelo resultado alcançado em Paris, onde os 196 estados participantes se comprometeram em limitar o aquecimento global em menos de 2ºC no tocante aos níveis pré-industriais. Alison Doig, da ONG Christian Aid, que monitorou a reunião da cúpula, disse que a liderança do papa teve um efeito “transformador” em fazer da mudança climática uma questão moral e espiritual.
Com certeza, diante de tudo o que os italianos enfrentam atualmente, a franqueza de Francisco em relação à problemática ambiental não vai esmorecer. Ainda na última semana de dezembro, um deputado do Partido Verde italiano manifestou esperança em ter “uma encíclica por semana” escrita pelo papa sobre o assunto.
Têm também alguns indícios de que o ensino do pontífice, combinado com os desafios ambientais da Itália, está impactando a prática católica local.
Na Diocese de Frosinone, Dom Ambrogio Spreafico, ex-reitor da prestigiada Universidade Urbaniana de Roma, lançou um projeto para incentivar uma “agricultura social” em terras abandonadas ou sem uso, bem como convidou especialistas para criar um modelo de gestão sustentável das florestas em uma grande faixa de terras pertencentes à diocese, onde o antigo seminário de Veroli se localiza.
Spreafico disse ainda esperar que estas iniciativas apresentem alternativas ao que ele descreve como uma “industrialização selvagem” na região, ao culpar tal industrialização de estar aumentando os problemas ecológicos atuais.
Nesse ínterim, a Itália poderá ouvir boas notícias em se tratando de tempo. Hoje, as previsões indicam chuva e mesmo neve na parte nordeste do país para os dias 2 e 3 de janeiro, com chances de haver uma precipitação adicional entre os dias 5 e 6.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Crise atmosférica italiana pode fortalecer o Papa Francisco sobre o meio ambiente - Instituto Humanitas Unisinos - IHU