09 Dezembro 2015
Passado um mês da tragédia em Mariana, considerado um dos maiores desastres ambientais da história do Brasil, dezenas de famílias continuam instaladas em hotéis da região à espera de uma solução, há desconfiança na população sobre a qualidade da água em vários pontos e não se pode ainda calcular a total dimensão do dano ambiental e econômico do desastre que matou ao menos 11 pessoas, enquanto 8 seguem desaparecidas. Se o cenário após o tsunami de lama pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco é desolador, experiências locais e internacionais não deixam espaço para muito otimismo no médio prazo. Grandes tragédias ambientais recentes obrigaram as empresas responsáveis a pagar elevadas indenizações, que se seguiram de anos de batalha judicial e pressão até que os recursos começassem finalmente a chegar às vítimas e aos trabalhos de reparação de danos.
A reoprtagem é de Heloísa Mendonça, publicada por El País, 05-12-2015.
O desastre de Mariana também deve gerar uma das maiores penalidades financeiras à mineradora cujos donos são a Vale e a australiana BHP. Ainda que a primeira multa anunciada contra a companhia, no valor de 250 milhões de reais (expedida pelo Ibama) pareça irrelevante diante do tamanho da tragédia, essa quantia deve aumentar bastante quando forem somados novas notificações, custos de reparação e indenizações. Além disso, a empresa tem sido alvo de várias ações liminares da Justiça, que obrigam a agir imediatamente, como decisão de que são obrigados a distribuir água potável. Na semana passada, por exemplo, o Governo federal e os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo anunciaram que irão processar a mineradora e suas acionistas a arcarem com 20 bilhões de reais para as despesas de recuperação dos danos e revitalização das áreas atingidas pela tragédia.
"Não podemos confundir multa com ressarcimento. Os custos maiores serão pelo ressarcimento de danos às vítimas e com os recursos para a própria recuperação da área afetada. Ainda nem sabemos a proporção exata do desastre, isso será calculado com o tempo", explica Alessandra Magrini, professora do Programa de Planejamento Energético e Ambiental da Coppe/UFRJ.
A professora cita o caso do imenso vazamento de óleo provocado pela explosão de uma plataforma de petróleo da BP no Golfo do México, em 2010, que rendeu um acordo bilionário passados cinco anos da tragédia, para mostrar que os custos da reparação de uma tragédia podem ser elevados. A companhia britânica acordou com a Justiça dos EUA, apenas em outubro último, pagar 20,7 bilhões de dólares a título de multas, recuperação ambiental e ressarcimento às vítimas — a maior multa ambiental da história. Na época, o desastre deixou 11 trabalhadores mortos e derramou milhões de barris de petróleo nas costas de vários Estados por quase três meses.
"Quando se fala de acidentes ambientais é preciso estar atento à composição do material que vazou, o volume, se ele se propagou e quanto tempo vai demorar para aquele ambiente se recuperar. Não podemos nos concentrar apenas no volume", diz. A professora cita o exemplo do vazamento de óleo na Baía de Guanabara em 2000 que do ponto de vista de quantidade liberada não era tão significativa, mas como aconteceu em uma área onde não havia tanta circulação gerou um impacto relevante naquela área.
A demora para efetivamente pagar as multas no Brasil tem números assustadores. De cada 100 reais em multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) desde 2011 para quem infringiu regras ambientais, menos de três reais entraram nos caixas do Governo federal, segundo dados code um relatório anual do Ibama para o Tribunal de Contas da União (TCU).
Promessa até o Natal
Segundo relatório divulgado pela mineradora Samarco, até sexta-feira, 506 pessoas seguiam alocadas em pousadas e hotéis na região do desastre. O Ministério Público já propôs um termo de Ajustamento de Conduta (TAC) a mineradora para agilizar o atendimento emergencial das famílias atingidas pela lama. O termo, que é um acordo extrajudicial, tem 21 itens. Um deles inclusive oficializa a obrigação da mineradora em reconstruir a localidade de Bento Rodrigues e diz que os detalhes deverão ser acordados com uma comissão eleita pelos moradores. A Samarco afirmou que irá estudar a proposta e dar uma resposta.
Sobre a hospedagem provisória, representante da Vale, acionista da Samarco, afirmou em evento em Londres, na sexta-feira, que todas as famílias desabrigadas estarão em casas alugadas até o Natal. “Esperamos que até o Natal todas as pessoas estejam vivendo em casas permanentes, deixando os hotéis onde estão hoje", disse o diretor financeiro da companhia, Luciano Siani. Os desabrigados estão recebendo da Samarco um salário mínimo mais 20% para cada dependente, além de uma cesta básica. Porém, os afetados pela tragédia querem mais. De acordo com o promotor Guilherme Meneghin, de Direitos Humanos, os moradores pedem 1.5000 reais, mais 30% por dependente.
A mineradora também fechou acordo com o Ministério Público Federal para garantir, até março de 2016, os salários de 2.686 empregados diretos e a 2.400 terceirizados. A Samarco também vai pagar salário mínimo com acréscimo de dependente a cerca de 11 mil pescadores que dependiam do rio Doce, afetado pela lama.
Outras batalhas judiciais no exterior
As batalhas judiciais, a dificuldade nos acordos e a demora para ressarcir as vitimas não são particularidades brasileiras. A Texaco, que se fundiu com a Chevron em 2001, por exemplo, foi responsabilizada pelo derramamento de 68 bilhões de litros de materiais tóxicos em fossas e rios amazônicos do Equador, mas o embate judicial já dura décadas. A tragédia ambiental aconteceu entre os anos de 1972 e 1992, mas a sentença da Justiça equatoriana que ordenou que a Chevron pagasse uma indenização de 9,5 bilhões de dólares é questionada pela empresa. "Conforme decisão de um Tribunal Federal dos Estados Unidos e de acordo com o parecer do Ministério Público Federal do Brasil, a sentença equatoriana de 9,5 bilhões de dólares contra a Chevron Corporation é produto de fraude e extorsão", contestam.
Ainda de acordo com a empresa, a Texaco gastou em remediação 40 milhões de dólares (cerca de 160 milhões de reais). A queixa contra a petrolífera foi feita por um grupo de equatorianos da região afetada, que alega que a poluição afetou suas colheitas, destruiu áreas florestais, matou animais e provocou um aumento na incidência de câncer na população local.
Passados 26 anos, o desastre do Exxon Valdez, com um navio petroleiro no Alasca, também é outro caso que rende ações de indenização na Justiça. Em1989, o navio Exxon Valdez encalhou nas águas do Alasca, despejando 10,8 milhões de galões de óleo nas águas que se espalharam por cerca de 500 quilômetros, matando milhares de animais. O acidente custou à empresa cerca de 7 bilhões de dólares, sendo que 5 bilhões foi direcionado para a limpeza do mar.
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Mariana: um mês da tragédia e anos à frente para garantir reparação total - Instituto Humanitas Unisinos - IHU