23 Outubro 2015
Há pouco menos de um ano, nos tradicionais votos de Natal dirigidos ao Vaticano, Francisco pediu desculpas pelos escândalos provocados por 15 doenças curiais. Dentre elas, as fofocas que alimentam maledicências, falsidades, até mesmo notícias infundadas. Dez meses depois, fofocas e escândalos ainda existem. E os trabalhos do Sínodo sobre a família, depois da "saída do armário" do teólogo Charamsa (suspenso pelo bispo da sua diocese) e da carta dos 13 Padres sinodais crítica contra o papa, ainda são perturbados por notícias que tem o sabor dos venenos dos vazamentos de informação bem planejados, no fim do pontificado de Bento XVI.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 22-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Saindo um a um nessa quarta-feira à noite da Aula sinodal, os Padres refletiam o humor impresso de tarde também no L'Osservatore Romano: "Estamos diante de uma poeirama levantada com intenção manipuladora".
Dentro da Aula, o debate, aceso, foi sobre temas delicados. Os 13 círculos menores de trabalho linguísticos, cujos relatórios foram publicados nessa quarta-feira, mostraram divisões e pontos de vista contrapostos sobre a comunhão aos casais que voltaram a se casar civilmente: há quem sugeriu uma comissão, quem invocou a decisão papal, quem pediu o discernimento caso a caso. Alguns até chegaram a propor um Concílio.
O grupo de língua alemã não se deteve na questão dos divorciados. Pela voz de um dos seus expoentes mais renomados, o cardeal Reinhard Marx, membro do grupo do C9 que ajuda Francisco na reforma da Igreja, se posicionou abertamente contra outro purpurado, o australiano George Pell, acusando-o de ter tentado poluir os trabalhos com declarações "agressivas e irresponsáveis para a imprensa".
Com "consternação e tristeza – escreveram os prelados de língua alemã – tomamos conhecimento das declarações públicas de alguns Padres sinodais. Isso contradiz o espírito do Sínodo nas suas regras mais elementares. As imagens e as comparações utilizadas são não só indiscriminadas e falsas, mas também ferem. Distanciamo-nos delas de modo decidido".
Apenas alguns dias atrás, Pell tinha concedido uma entrevista ao jornal francês Le Figaro, em que falara de uma" batalha entre kasperianos e ratzingerianos". Mas "no Sínodo não estamos em batalha, Ratzinger não está contra Kasper", afirmou Marx nessa quarta-feira.
O grupo alemão foi um dos mais corajosos também sobre os divorciados. Por decisão unânime (no grupo, estavam presentes os cardeais Kasper, Müller, Schönborhn e Marx), eles pediram o recurso à valorização do "foro interno" como lugar no qual, com a ajuda de um diretor espiritual, uma pessoa pode amadurecer o acesso aos sacramentos. Até porque, disseram, em geral, "o debate mostrou que não há solução fácil e generalizada".
O primeiro círculo de língua inglesa, ao contrário, moderado por Pell, reiterou "majoritariamente" que deve ser mantida a exclusão da comunhão aos divorciados recasados e especificou que a questão "não deveria ser deixada às Conferências Episcopais individuais".
Mas, disse Dom Charles Chaput em outro círculo, ela deveria ser tratada em um "Concílio ecumênico e não em um Sínodo". Pela manutenção sem rodeios da disciplina vigente, contrária ao acesso à comunhão, também se manifestou o grupo francês moderado pelo cardeal Robert Sarah, purpurado africano que, na véspera da cúpula, disse que a hóstia para os divorciados recasados "trai o Evangelho".
No entanto, lembrou o primeiro grupo italiano moderado pelo cardeal Francesco Montenegro, é preciso começar a "distinguir a variedade de situações" e propor um "prudente discernimento pastoral sob a autoridade final do bispo".
Assim, em essência, também se manifestou o círculo "Italicus B", do cardeal Edoardo Menichelli: "Até hoje, não é possível estabelecer critérios gerais inclusivos de todos os casos, às vezes muito diversificados entre si". Daí o apelo ao "discernimento, principalmente do bispo".
Muitos outros temas foram levantados nos relatórios dos círculos menores, da contracepção aos casais de fato, dos casamentos mistos à Humanae vitae. "Não mudamos a verdade, buscamos uma verdade maior", disse Marx. A doutrina não é uma "loja fechada" e, "quando dizemos 'estamos com vocês' nas situações difíceis, não queremos destruir os fundamentos do matrimônio, mas fortalecê-los".
O cardeal Daniel Fernando Sturla, arcebispo de Montevidéu (Uruguai), reiterou o desejo de que o papa possa ter "a última palavra". Mas, hoje, está certo apenas que a orientação predominante nos círculos menores sobre a comunhão aos divorciados vai se traduzir, salvo surpresas, em uma passagem do relatório final do Sínodo. E que esse documento será votado sábado na Aula.
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Sínodo se divide sobre a hóstia aos divorciados: Marx contra Pell - Instituto Humanitas Unisinos - IHU