09 Outubro 2015
O que é a conversão cristã, senão aceitar que, "no tempo", se possa mediar a graça pelo dom de uma vida boa? Mas por que é que um cardeal exclui "itinerários penitenciais" que transformem a "oposição" em "mediação"? Excluir a "gradualidade" na verdade objetiva é um modo abstrato e a-histórico – mas principalmente desesperado e desesperador – de entrar em relação com a vida familiar.
A opinião é do teólogo italiano Andrea Grillo, leigo casado, professor do Pontifício Ateneu S. Anselmo, de Roma, do Instituto Teológico Marchigiano, de Ancona, e do Instituto de Liturgia Pastoral da Abadia de Santa Giustina, de Pádua.
O artigo foi publicado no seu blog Come Se Non, 07-10-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Realmente não é possível entender como um cardeal, dotado ao menos "de iure" de ampla competência "pastoral", restrinja a tal ponto o nível "formal" da mera "justiça abstrata", a ponto de excluir, ele mesmo, toda a possibilidade de "pensar diferentemente" a disciplina da Igreja sobre a família.
O cardeal Erdö, na frase que reproduzo aqui abaixo, tirada da sua conferência de segunda-feira, caiu em um duplo erro irremediável: não só lê a complexa situação pastoral somente com óculos formais – e, portanto, simplificando-a de modo irreparável – mas também absolutiza o estado atual "de lege condita", como se pudesse excluir toda "lex condenda" ou qualquer outra interpretação da lei vigente.
Em uma palavra, ele identifica o Evangelho com a lei e, além disso exclusivamente com "esta lei" e só em uma dada interpretação! Leiamos esta passagem da sua conferência, com os grifos oportunos:
"Em busca de soluções pastorais para as dificuldades de certos divorciados recasados civilmente, deve ser considerado que a fidelidade à indissolubilidade do matrimônio não pode ser conjugada com o reconhecimento prático da bondade de situações concretas que lhe são opostas e, portanto, irreconciliáveis. Entre o verdadeiro e o falso, entre o bem e o mal, de fato, não há uma gradualidade; embora algumas formas de convivência tragam consigo certos aspectos positivos, isso não implica que possam ser apresentados como coisas boas. Distingue-se, porém, a verdade objetiva do bem moral e a responsabilidade subjetiva das pessoas individuais. Pode haver diferença entre a desordem, ou seja, o pecado objetivo, e o pecado concreto que se realiza em um comportamento determinado que implica também, mas não só, o elemento subjetivo. "A imputabilidade e responsabilidade de um ato podem ser diminuídas, e até anuladas, pela ignorância, a inadvertência, a violência, o medo, os hábitos, as afeições desordenadas e outros fatores psíquicos ou sociais" (CIC 1.735). Isso significa que, na verdade objetiva do bem e do mal, não se dá uma gradualidade (gradualidade da lei), enquanto, em nível subjetivo, pode ocorrer a lei da gradualidade e é possível, portanto, a educação da consciência e do próprio senso de responsabilidade. O ato humano, de fato, é bom quando o é sob todos os aspectos (ex integra causa)."
Na realidade, o relator se aproxima com óculos grossos e pesados, que distorcem todas as coisas. Eles veem tudo em preto e branco e não conseguem fazer síntese, em caso algum. Essas lentes não só induzem esse efeito de "distorção", mas também criam contínuas oposições irreconciliáveis, onde, ao contrário, haveria diferenças que deveriam ser tratadas com solicitude pastoral.
"Entre o verdadeiro e o falso não há gradualidade", afirma ele com um corte realmente surpreendente em um homem da Igreja! Por que se deve dizer tal coisa justamente desse modo? Não temos todos a experiência "pedagógica" e "temporal" da mudança do mal em bem e do falso em verdadeiro? A oposição permanece se for pensada fora do tempo. Mas, no tempo, é possível que verdadeiro e falso não sejam antíteses, mas possam ser mediados! Certamente não sem esforço, mas com boa esperança.
O que é a conversão cristã, senão aceitar que, "no tempo", se possa mediar a graça pelo dom de uma vida boa? Mas por que é que Erdö exclui "itinerários penitenciais" que transformem a "oposição" em "mediação"? Excluir a "gradualidade" na verdade objetiva é um modo abstrato e a-histórico – mas principalmente desesperado e desesperador – de entrar em relação com a vida familiar. Que desfigura tanto o objeto que sofre tal leitura quanto o sujeito que a propõe: o primeiro aparece bloqueado e imóvel; o segundo, impotente e desesperado. A família não é mais família, e o pastor renuncia ao seu ministério!
Por outro lado, a esse vício de raciocínio, que determina uma incompreensão estrutural da dimensão pastoral, alia-se também um irremediável maximalismo de relação com o "bem". A "bondade sob todos os aspectos", ideal digno de todo louvor, pode ser o critério para o julgamento ordinário da pastoral familiar? Podemos avaliar com esse critério as nossas vidas, mesmo quando são "regulares", mas mesmo assim marcadas por tantos aspectos negativos?
Se unirmos esse maximalismo moral à abstração das oposições fora do tempo, entende-se bem por que, com esses seus óculos que distorcem o real plantados no seu nariz, o cardeal Erdö teve que tirar honestamente a consequência da impossibilidade de qualquer "ação pastoral".
Mas gostaria de sugerir, com todo o respeito, uma "ação pastoral" fundamental, muito útil para alguns Padres sinodais. Tentem levantar os óculos, para poder olhar para as coisas diretamente na cara. Descobrirão "espaços intermináveis", caso contrário impensáveis e imprevisíveis, onde poderão agir como grandes pastores e não como pequenos rábulas.