18 Agosto 2015
O avanço da direita política e de sua agenda conservadora não é uma exclusividade do Brasil e está se repetindo também, com as suas particularidades, mas de um modo muito semelhante, em outros países da América Latina. Esse avanço é uma reação à chegada ao poder, na última década, de governos de esquerda e de centro-esquerda em diversos países da região e vem sendo estimulada pelos Estados Unidos que querem recuperar o espaço perdido no continente. Essa foi uma das principais conclusões do XXI Encontro do Foro de São Paulo, realizado de 29 de julho a 1º de agosto, na Cidade do México. Ao completar 25 anos, o Foro de São Paulo debateu a atual crise do capitalismo, os efeitos dessa crise na América Latina, os desafios da integração regional e a situação dos direitos humanos na região, entre outros temas.
A opinião é do jornalista Marco Weissheimer, publicada pelo portal Sul 21, 15-08-2015.
O Foro é composto por 105 partidos de 26 países e o encontro na Cidade do México reuniu mais de 200 representantes. Sete partidos brasileiros participam do movimento: PT, PDT, PCdoB, PCB, PPL, PPS e PSB. Desta vez, os anfitriões do evento foram o Partido da Revolução Democrática (PRD) e o Partido do Trabalho (PT México). O ex-prefeito de Porto Alegre e ex-deputado estadual, Raul Pont (PT), participou dos debates no Foro e também do IV Encontro Parlamentar do XXI Foro de São Paulo. Segundo Pont, representantes de partidos de vários países da América Latina fizeram relatos parecidos sobre a ofensiva neoliberal e conservadora contra governos populares e progressistas no Brasil, Venezuela, Argentina, Equador e El Salvador. Uma das constatações do encontro, a partir desses relatos, foi que os partidos que compõem o Foro enfrentam desafios diferentes daqueles colocados há vinte anos.
A resolução final do encontro, relata Pont, definiu como condições indispensáveis para enfrentar a reação conservadora na região a busca da unidade na diversidade e a construção de blocos amplos em torno de um projeto político comum. “Essa unidade que fomos construindo convivendo juntos em encontros como este ao longo dos anos permitiu que avançássemos muito na integração latino-americana”, assinala ainda o dirigente petista. Outra proposta defendida nos debates foi a necessidade de os partidos se esquerda aprofundarem e qualificarem suas relações políticas com os movimentos sociais. “Reconhecemos as significativas contribuições destes movimentos no atual processo de transformações, onde, em alguns casos, são claramente a vanguarda das mudanças revolucionárias”, diz ainda a resolução final. Além disso, denuncia a política imperialista impulsionada desde Washington e propõe a defesa das identidades nacionais e regionais em torno da construção de um novo modelo político social.
Um cenário internacional de conflitos
No plano internacional, a chegada ao poder na América Latina e no Caribe de governos de esquerda e centro-esquerda, assinala ainda o documento final do encontro, representaram uma exceção em um mundo que “transita do descenso relativo da unipolaridade estadunidense para uma situação multipolar em um contexto de crises econômicas, sociais e políticas, assim como conflitos armados com implicações globais como a agressão e o ataque do governo de Israel ao território palestino, em particular a Gaza, os ataques dos EUA e da OTAN ao Iraque e Líbia, que provocaram o crescimento de grupos armados fundamentalistas como o Estado Islâmico, e as agressões externas vindas de vários países contra a Síria”. A resolução também identifica a ingerência externa na Ucrânia, partir e uma aliança entre EUA e União Europeia com grupos neonazistas, com o objetivo de enfraquecer o poder da Rússia na região.
No plano regional, o documento defende o aprofundamento da construção de um modelo de integração política, econômica e social distinto daquele que vem sendo implementado na União Europeia. Na avaliação dos integrantes do Foro de São Paulo, os recentes acontecimentos na Europa, envolvendo a Grécia principalmente, confirmaram a verdadeira natureza política da União Europeia, definida pelo domínio econômico e político de grandes corporações multinacionais e de um pequeno diretório e países cada vez mais arrogante, violento e intransigente. “O caso grego demonstrou que a UE da solidariedade e da coesão não existe”, afirma a resolução final que expressa “solidariedade com os trabalhadores e os povos gregos e europeus na resistência contra as imposições da União Europeia”.
Mujica: momento exige uma esquerda cada vez mais preparada
O ex-presidente do Uruguai, José Mujica, enviou uma carta aos participantes do encontro, alertando para a ofensiva de uma “nova direita” na América Latina. “Devemos ser conscientes da imensa ofensiva que, a partir de diversos espaços de distintas origens e interesses, estão ocorrendo em vários países, com uma estranha e até suspeita coordenação, movimentos de oposição que, na maioria das vezes, tem um caráter desestabilizador”, diz a carta. Estamos vendo em vários países, prossegue Mujica, “grandes campanhas com discursos atualizados, nisso que se denomina de nova direita, com candidatos que se mostram como empresários exitosos e com um discurso anti-político”. Além disso, acrescenta, vemos “grandes campanhas desestabilizadoras que têm como principais sócios os grandes meios de comunicação de massa”.
Ainda segundo o dirigente uruguaio, o momento histórico que nos toca atravessar precisa de uma esquerda cada vez mais formada, preparada e integrar para frear o choque civilizatório que o capitalismo está provocando e a cultura do consumo desenfreado. Em sua mensagem, por fim, Mujica faz um apelo para que a esquerda resgate os valores da humildade e da simplicidade em sua prática política. “Do que nos serve ir tão longe na elaboração ideológica e nas discussões setoriais e partidárias se não somos capazes de transformar a nossa própria prática política em exemplo aos que depositam em nós a sua confiança”.
Lula: seguimos juntos; ainda há muita luta pela frente
O ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva também enviou uma mensagem, gravada em vídeo, aos participantes do encontro, destacando os 25 anos de vida do movimento, lançado no Brasil, em 1990. “As divergências entre nós eram de tamanha magnitude que a única coisa que unia as correntes políticas argentinas presentes à reunião era o Maradona”, brincou Lula. Foi a partir da unidade de discurso e de diagnósticos construída ao longo dos anos, prosseguiu, que conseguimos eleger Chávez, no final dos anos 90, e depois eleger Lula, Tabaré, Kirchner, Evo Morales, Rafael Correa e tantos outros. “Graças à unidade que construímos no Foro de São Paulo, conseguimos deter a ALCA (proposta de criação de uma Área de Livre Comércio das Américas, defendida pelos Estados Unidos). Foi graças a essa convivência também que começamos a construir nossas políticas de integração”.
“Seguimos juntos”, concluiu Lula, “enfrentando os ataques perversos de uma mídia conservadora que não admite em hipótese alguma os avanços que conseguimos para as pessoas mais pobres de nossos países e nos critica todo santo dia. Neste momento, precisamos ficar de cabeça erguida e continuar a lutar porque apenas começamos a fazer aquilo que era nosso sonho, que cada um de nossos países fosse mais justo socialmente e que a riqueza produzida pudesse ser distribuída de um modo mais equânime entre as pessoas”.
O XXI Encontro do Foro de São Paulo aprovou ainda uma nota de solidariedade e defesa da democracia no Brasil. A nota afirma que o governo da presidenta Dilma Rousseff, reeleita no final de 2014, “sofre uma das mais sórdidas campanhas da oposição já vistas no Brasil”. Desde a campanha eleitoral, acrescenta, “os meios de comunicação brasileiros utilizaram todos os dispositivos para tratar de impedir sua reeleição” e, passada a eleição, essa campanha segue com o objetivo de derrubar o governo eleito legitimamente pelo voto popular.