13 Fevereiro 2015
A derrubada de árvores para exportar madeira ou abrir clareiras para plantar soja ou formar pastagens acabou com 50% das florestas tropicais do planeta. Do restante, 60% estão muito degradadas. Com o objetivo de deter o desflorestamento antes que seja tarde demais, surge a Forest 500, uma lista das empresas e governos que têm algo a ver com esse enorme negócio. O governo e duas empresas espanholas aparecem nela com nota de aprovação.
A reportagem é de Miguel Ángel Criado, publicada pelo jornal El País, 12-02-2015.
Com milhares de dados de estatísticas oficiais, estudos científicos e pesquisa própria, o Programa Global da Cobertura Florestal (GCP na sigla em inglês) identificou os 500 grandes agentes que intervêm no negócio do desmatamento. Não se trata tanto de indicar os culpados, senão de elaborar uma lista com os agentes que, direta ou indiretamente, poderiam ajudar a acabar com a derrubada de árvores nas selvas tropicais se medidas forem tomadas.
A Forest 500 inclui 50 países, tanto exportadores como importadores de madeiras, pasta de papel e produtos agrícolas relacionados ao desmatamento, como soja, óleo de palma (dendê) e carne procedentes de terras arrancadas da floresta. Na lista também aparecem 250 empresas, desde produtoras de matérias-primas até redes de comércio varejista, passando por processadoras e atacadistas. A Forest 500 também analisa o papel de outros agentes no desmatamento, como fundos de investimento, bancos e organizações internacionais.
"Essas instituições não são necessariamente responsáveis pelo desflorestamento direto, mas têm o risco mais alto de estar vinculadas ao desflorestamento tropical por meio de sua participação na produção mundial de produtos básicos e do comércio, ou através de suas operações nas cadeias de abastecimento de produtos básicos", disse o diretor do programa Fatores de Desflorestamento do GCP, Mario Rautner. O dinheiro movimentado nesse grande mercado beira os US$ 100 milhões e suas matérias-primas se encontram em mais de 50% dos produtos vendidos em supermercados, segundo os autores do relatório.
A Forest 500 avalia como cada um desses agentes está abordando seu papel no desmatamento. Embora os critérios variem segundo se trate de empresas, países exportadores ou importadores ou de diferentes agentes investidores, com eles puderam examinar cada uma das 500 instituições e pontuá-las de 1 a 5. É toda uma geopolítica do desflorestamento.
Só sete das organizações da Forest 500 conseguem nota 5. Das 250 empresas examinadas, as que têm melhor pontuação são as corporações alimentares Nestlé, Groupe Danone, a japonesa Kao Corp, Procter & Gamble, dos EUA, e as britânicas Reckitt Benckiser Group e Unilever. Nesse capítulo só aparece uma empresa espanhola, a Inditex, com uma qualificação de 3.
"A Inditex foi incluída como um dos maiores distribuidores de moda do mundo [lojas Zara] e está entre as dez maiores empresas de calçados nos mercados da Europa ocidental", lembra Rautner. Isso significa que usa couros para fazer sapatos, bolsas ou abrigos. "Portanto, deveria ter políticas para assegurar-se de que não procedem de gado criado na região amazônica. Não soubemos que a companhia esteja aplicando essas políticas", acrescenta o pesquisador. Entretanto, sua pontuação se recupera devido a suas práticas com o papel. A Inditex não faz suas sacolas com pasta de papel procedente de selvas tropicais.
Quanto aos países, são exatamente alguns dos maiores exportadores os que têm melhor pontuação. Os que aparecem na lista abrigam 90% das florestas tropicais. Dentre eles, as nações latino-americanas (Brasil, Colômbia e Peru) estão fazendo grandes esforços para conseguir o objetivo do desmatamento zero em 2030, como estabelece a Declaração de Nova York sobre as Florestas, assinada em setembro passado. Os que estão se saindo pior são Madagascar, que perde toda a sua cobertura florestal em ritmo acelerado, Nigéria e Indonésia.
Do lado da demanda, os governos com políticas mais avançadas para frear o desmatamento são Alemanha e Países Baixos. Na metade da tabela se encontra o governo espanhol. Embora a Espanha não seja um grande importador de madeira ou pasta de papel dos trópicos, é o terceiro importador da soja que é cultivada em terras amazônicas. Além disso, é o quarto maior importador de óleo de palma da Europa. O cultivo da palma foi relacionado ao intenso desmatamento da Indonésia.
Entretanto, os países que estão causando mais danos às selvas tropicais são Rússia, China e Índia. Não se trata só de que não tenham políticas para fiscalizar de onde procedem as matérias-primas de que sua economia necessita; além disso, suas economias são grandes depredadoras. A China sozinha, por exemplo, importa 22% de todas as matérias-primas florestais de risco. A Índia, por sua vez, é o maior importador de soja e óleo de palma.
Mais difícil de avaliar é o papel de outros agentes que não são governos nem participam de alguma maneira da cadeia de abastecimento. É o caso dos fundos de investimento ou dos grandes bancos. No entanto, a Forest 500 também se encarrega deles. Como explica Rautner, "várias instituições financeiras foram incluídas por participarem das empresas que aparecem na Forest 500. Embora não estejam necessariamente envolvidas no financiamento do desmatamento, se expõem ao problema através de suas atividades de investimento". Se usassem essas ações para exigir que as empresas cumpram critérios de sustentabilidade, sua influência poderia ser enorme.
No caso dos bancos, o HSBC, agora perturbado pelo surgimento da lista Falciani, aparece com a melhor pontuação. O único banco espanhol que consta da Forest 500 é o Santander, que consegue uma aceitável nota 3. "O Santander incorporou as considerações ambientais no processo de tomada de decisões, entretanto não tem políticas específicas relacionadas às operações que envolvem produtos específicos vinculados ao desmatamento. Além disso, não está claro se as políticas de sustentabilidade do Santander são recomendações ou são obrigatórias, e por isso o rigor das políticas é questionável", afirma Rautner.
A lista Forest 500 indica os grandes atores que, com suas decisões, podem acabar com o que resta das selvas tropicais ou salvá-las. Mas o objetivo do desflorestamento zero deveria ser para todos. Como lembra Rautner, "na realidade, todos fazemos parte de uma economia mundial desflorestadora. O desflorestamento está em nosso chocolate e nossa pasta de dentes, em nossa comida para animais e nossos livros de texto, nossos edifícios e nosso mobiliário, nossos investimentos e nossas aposentadorias".
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As 500 empresas e governos que poderiam salvar as florestas do planeta - Instituto Humanitas Unisinos - IHU