27 Janeiro 2015
"Deixando de lado o problema de sempre se referir às mulheres como “elas” (as mulheres já não estão incluídas na Igreja?), Francisco parece verdadeiro ao buscar promover a participação feminina. No entanto, o Sínodo sobre família em outubro será o seu momento de decisão", escreve Tina Beattie, professora de Estudos Católicos da Universidade de Roehampton, em Londres, em artigo publicado pelo The Tablet, 23-01-2015. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Eis o artigo.
Este tem sido um mês interessante para a política católica de gênero. Primeiro, o Pontifício Conselho para a Cultura anunciou que a sua assembleia, de 4 a 7 de fevereiro, será sobre “Culturas femininas: igualdade e diferença”. Este Conselho produziu um pequeno vídeo em que encoraja as mulheres ao redor do mundo a enviarem uma foto ou fazerem um vídeo de um minuto sobre suas esperanças e sonhos. Uma loira simpática que parece estar anunciando produtos de higiene feminina garante que “quer nos conhecer”.
O vídeo foi recebido negativamente, tanto pelo prazo dado quanto pelo estilo da produção. Não só o convite deu apenas um minuto a cada mulher para elas contarem a sua história, mas também foi divulgado no dia 23 de dezembro e o limite para o envio do material era 4 de janeiro: o período mais cheio do ano para muitas delas. Além disso, o formato limitou a participação a mulheres com acesso à internet, excluindo milhões de mulheres pobres. Roma não quer conhecer as histórias destas mulheres também?
O Cardeal Raymond Burke dedicou uma parte de seu tempo para opinar sobre a masculinidade, o feminismo radical e a “confusão obscura da teoria de gênero” em entrevista para um movimento chamado “The New Emangelisation” [jogo de palavras envolvendo “man”, masculino, e “evangelization”]. Aparentemente, a Igreja tem sido “atacada” por um feminismo radical desde a década de 1960, que acabou deixando os homens com um sentimento de marginalização e incompreensão. Meninas coroinhas são parcialmente culpadas pelo declínio nas vocações, dado que ser um coroinha “menino” era o caminho tradicional para o sacerdócio.
Porém, diz o cardeal, os “meninos não querem fazer as coisas junto das meninas. Isto é natural”. O resultado disso é que os homens ficaram confusos, feminizados e desordenados, e quanto tais homens entraram para o sacerdócio, alguns deles abusaram sexualmente de menores. Assim, o feminismo radical levou à feminização da Igreja, o que levou aos escândalos de abusos sexuais.
O Papa Francisco não partilha deste diagnóstico do Cardeal Burke sobre o que há de errado com a Igreja. Nas Filipinas, em um encontro com grande maioria de meninos, o pontífice disse que o país deveria incluir mais mulheres e meninas, observando que a sociedade é, às vezes, “machista” demais e que não dá espaço suficiente para elas. Na entrevista dada a jornalistas no voo de volta das Filipinas, ele deu uma interpretação pastoral da encíclica Humanae Vitae, evitando o absolutismo moral de seus predecessores quanto ao uso de métodos contraceptivos. Francisco tem sido amplamente citado por ter dito que os católicos não deveriam se reproduzir “como coelhos” e por ter criticado uma mulher por ela “tentar a Deus” ao se arriscar numa oitava gravidez, quando já havia feito sete cesarianas. Perguntado sobre o papel das mulheres nesta entrevista, ele respondeu: “Quando digo que é importante que as mulheres sejam mais consideradas na Igreja não é apenas para dar-lhes uma função, a secretaria de um dicastério... não, mas para que nos digam como sentem e veem a realidade, porque veem a partir de uma riqueza diferente, maior”.
Deixando de lado problema de sempre se referir às mulheres como “elas” (as mulheres já não estão incluídas na Igreja?), Francisco parece verdadeiro ao buscar promover a participação feminina. No entanto, o Sínodo sobre família em outubro será o seu momento de decisão. Diz-se que os conservadores estão mobilizando suas forças teológicas para lançar um ataque total contra o projeto de reforma do papa, e este precisará estar preparado para encarar tal ataque com uma defesa teológica igualmente robusta. O apoio bíblico mais forte para a sua visão vem dos teólogos leigos – incluídas as teólogas.
Se Francisco quer vencer esta batalha, a sua melhor estratégia poderá ser a de cercar-se com tais teólogos. Ele recentemente descreveu as teólogas como “as cerejas do bolo”. Eu realmente espero que haja cerejas no menu do Sínodo sobre a família em outubro deste ano, e que algumas delas sejam escolhidas pela acidez, e não somente pela doçura.
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A luta do Vaticano contra as mulheres - Instituto Humanitas Unisinos - IHU