18 Dezembro 2014
Após prorrogação de 25 horas, os negociadores de 195 países chegaram a um acordo com “um mínimo comum necessário” de medidas para enfrentar a mudança climática e adiaram as grandes decisões sobre um novo tratado para a 21ª Conferência das Partes (COP 21), que acontecerá dentro de um ano em Paris.
A reportagem é de Diego Arguedas Ortiz, publicada pelo portal Envolverde/IPS, 16-12-2014.
Entre os dias 1º e 13 deste mês, mais de três mil delegados buscaram no complexo processo da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC) um fim último: evitar o aquecimento do planeta em níveis que atentem contra a vida na Terra.
Depois de 13 dias de debates, a COP 20 deixou sem resolver assuntos medulares, como fiscalização dos compromissos da redução de emissões de cada país, reconhecimento de danos e perdas causados pelas alterações climáticas e os planos imediatos, conforme denunciaram à IPS representantes de organizações observadoras do encontro.
O documento aprovado, o terceiro que foi debatido, denominado Chamado de Lima para a Ação Climática, estabelece que os países apresentarão em outubro seus compromissos nacionais de redução das emissões de gases que provocam o aquecimento global.
Também “pede urgência” aos países industrializados no sentido de “prever e mobilizar suporte financeiro para ações ambiciosas de mitigação e adaptação” para as nações afetadas pela mudança climática, e os “convida” a fixaram esse financiamento junto com os compromissos de redução. Uma exortação que atendeu debilmente os requerimentos dos países mais vulneráveis ao aumento das temperaturas e evitou um claro naufrágio.
Porém, os observadores lamentaram que no Chamado de Lima haja pouco para atender as populações mais vulneráveis como agricultores, comunidades costeiras, indígenas, mulheres e setores mais despossuídos das sociedades.
“Houve uma série de intercâmbios entre países desenvolvidos e em desenvolvimento e o resto do texto se tornou significativamente mais fraco quanto às regras para o próximo ano e como conseguir ação e ambição climática”, destacou à IPS o coordenador de Mudança Climática da organização Care International, Sven Harmeling. “Foi, realmente, uma infelicidade”, afirmou.
Isso afetará as negociações de 2015, pois “estão amontoando mais pressão sobre Paris. Os grandes temas foram adiados em lugar de serem decididos aqui”, apontou Harmeling. Segundo o ativista, houve acordo, mas insuficiente. “Temos algo, mas falta saber o quanto será legalmente vinculante”, acrescentou. Se realmente há “um espírito de Lima”, e não consenso por cansaço, se começará a saber em fevereiro, em Genebra, onde haverá o próximo encontro climático, ressaltou.
As nações do Sul deram seu voto a favor do texto, por volta de 1h30 da madrugada do dia 14, mas organizações como Oxfam, Rede de Ação Climática e Amigos da Terra Internacional foram muito críticas sobre o resultado. As negociações em Lima “nada fizeram para deter a catástrofe climática”, assegurou a Amigos da Terra.
O ministro peruano de Meio Ambiente, Manuel Pulgar-Vidal, presidente da COP 20, prolongou o processo para aparar arestas entre países industrializados, os grandes emissores de carbono, que queriam menos pressão financeira, e os países em desenvolvimento que buscavam menor fiscalização sobre suas próprias reduções. “Ainda que pareça estarmos em lados opostos, na verdade estamos no mesmo, já que só há um planeta: o lado do planeta”, afirmou Pulgar-Vidal ao término do encontro.
O mandado específico para Lima era estabelecer o rascunho de um novo tratado climático vinculante, que deve amadurecer durante 2015 até sua assinatura em Paris. Discussões metodológicas e grandes debates sobre danos e perdas, prazos e financiamento impediram um consenso mais ambicioso.
“Agora os países precisam de financiamento climático e que sejam tomadas ações urgentes agora, porque nossas emissões devem chegar a um máximo antes de 2020 e depois começar a serem reduzidas se quisermos nos manter em um caminho seguro”, explicou à IPS a coordenadora climática do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), Tasneem Essop. A ativista destacou que “precisamos proteger os direitos das comunidades impactadas pela mudança climática”. É precisamente esse desamparo dos setores mais vulneráveis que ainda deve receber ações mais urgentes.
Entretanto, o acordo de Lima tem escassas referências aos mecanismos que os países usarão para reduzir emissões entre 2015 e 2020, quando deverá começar a vigorar o novo tratado, em substituição ao Protocolo de Kyoto. Essas ações têm que começar já, disse Essop, porque nesse caso as medidas posteriores poderão ser inúteis. “O que os governos parecem estar pensando é que podem fazer tudo no futuro, depois de 2020, quando a ciência é clara em dizer que é necessário chegar a um teto antes disso”, pontuou à IPS.
Se isso não for feito, a cada ano o clima extremo, a seca e a baixa produção agrícola serão mais duros para essas comunidades, as menos responsáveis pela mudança climática. Essop considera que os governos apostam em negociar na capital francesa, quando havia decisões urgentes a serem adotadas em Lima. Entre as pontas soltas que devem ser atadas na capital francesa, entre 30 de novembro e 11 de dezembro de 2015, está como será o balanço entre mitigação e adaptação no novo acordo climático mundial e de onde sairá o financiamento.
“Se não tivéssemos chegado a essa decisão (do Chamado de Lima), as coisas seriam muito mais difíceis em Paris. Mas sabemos que há muitos temas que deverão ser resolvidos entre agora e dezembro de 2015”, afirmou na plenária final Laurent Fabius, ministro das Relações Exteriores da França. Esse acordo pretende que até 2100 a elevação da temperatura não supere os dois graus centígrados para poder observar a estabilidade do planeta. Para isso, é fundamental reduzir o uso de combustíveis fósseis.
Mitigação, adaptação, danos e perdas se fixam como pilares do novo tratado. Os dois últimos são vitais para países e populações impactadas desproporcionalmente pelo fenômeno, mas essa parte ficou sem força em Lima. “É desastroso e não atende nossas expectativas em nada. Queríamos ver um plano claro surgindo de Lima, que nos permitisse ter um tratado mais ambicioso”, afirmou Harjeet Singh, diretor internacional de Mudança Climática e Resiliência da organização ActionAid. “O que vemos é uma contínua rejeição dos países desenvolvidos a temas que têm a ver com adaptação e danos e perdas”, disse à IPS.
Trata-se de temas espinhosos porque cumpri-los exige compromissos financeiros por parte dos países ricos. O principal espaço de recepção de dinheiro, o Fundo Verde para o Clima, alcançou apenas US$ 10,2 bilhões este mês, um décimo do valor que as nações industrializadas se comprometeram a entregar.
Mas o Chamado de Lima determinou como serão as “contribuições previstas e determinadas em nível nacional” (INDC), o formato como se apresentarão os compromissos de cada país sobre como reduzir suas emissões. Entretanto, esse acordo enfraqueceu ao eliminar o mecanismo para analisar a pertinência e a idoneidade de cada compromisso, presente em vários rascunhos prévios.
Para os negociadores, a quantia dessas contribuições nacionais seria suficiente para controlar o aquecimento global, mas os observadores se preocupam com a possibilidade de essa escassa fiscalização impedir um controle adequado do avanço na redução das emissões, da maneira que o planeta necessita.
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Lima chega a acordos climáticos mínimos e deixa quase tudo para Paris - Instituto Humanitas Unisinos - IHU