08 Outubro 2014
“Quer agrade ou não, o tema principal do Sínodo sobre a família não é a questão sobre a comunhão aos divorciados redesposados, ou outras questões que estão muito a peito, mais do que a outros, a nós europeus e ocidentais, quanto que visão de Igreja ter daqui para frente. Parece-me claro que para o Papa o que mais conta, antes das soluções que sobre as questões particulares o próprio Sínodo saberá encontrar, é que, através do encontro destes dias a comunidade eclesial saiba exprimir uma efetiva sinodalidade sua, isto é, uma escuta serena e construtiva de todas as vozes”.
A entrevista é de Paolo Rodari, publicada pelo sítio La Repubblica, 06-10-2014. A tradução é de Benno Dischinger.
Vinte e quatro horas antes do início verdadeiro e próprio dos trabalhos do Sínodo dos bispos, o cardeal alemão Walter Kasper está se preparando para sua intervenção que já vai ocorrer hoje, depois que o cardeal relator, o húngaro Péter Endô, pronunciará, (por vontade de Francisco pela primeira vez não em latim e sim em italiano) sua Relatio ante disceptationem.
Eis a entrevista.
Eminência, sinodalidade é termo que amplifica aquela de Sínodo, combinação de duas palavras gregas: sya (com, junto) e odòs (estrada, caminho), isto é, um caminho a percorrer juntos. O Concílio uniu esta imagem àquela do povo de Deus. A Igreja é um povo que caminha junto na história, para ser sinal do reino de Deus oferecido a toda a humanidade. Conseguireis, a partir de amanhã, caminhar juntos?
Não tenho dúvidas no mérito. Também sobre as questões mais delicadas e difíceis a enfrentar queremos percorrer um caminho sob a insígnia do confronto e da unidade. E estou seguro que encontraremos um ponto de síntese e consenso sobre toda temática. Todo o pontificado, de resto, está sob o signo da sinodalidade, na via sobre quanto já o Concilio Vaticano II havia prospectado: um caminho feito juntos para se chegar a um discernimento sobre as várias problemáticas, que outra coisa não é senão a busca da vontade de Deus através de uma consulta freqüente e paciente.
João XXIII explicou que o projeto do Concílio não amadureceu nele “como o fruto de prolongada meditação, mas como a flor espontânea de uma primavera inesperada”. Também o Sínodo parece não ter um projeto predeterminado sobre a mesa. Esta, pelo menos, parece ser a intenção de Francisco. Por quê?
Creio que o Papa queira, acima de tudo, escutar e entender o que a Igreja, o povo de Deus, diz e pensa com respeito à família. E portanto, após uma ulterior e ampla consulta que será de novo uma virada no interior de todas as dioceses do mundo, tirar as dúvidas. De resto, assim fazia a Igreja dos inícios. Não existe página dos Atos dos Apóstolos nas quais não se fale da ação eclesial do Espírito Santo. Também nós hoje queremos colocar-nos à escuta das sugestões do Espírito. É esta a nossa primeira e mais importante ação.
Dizia que oferecer a eucaristia aos divorciados redesposados não é o tema principal do Sínodo. No entanto, em relação ao mérito, diversos cardeais quiseram dizer preventivamente sua posição nas semanas passadas, também em resposta à sua relação com o último consistório no qual abria à possibilidade, após um período de penitência, de dar a comunhão a estes divorciados.
O que penso a respeito é conhecido. Não sou um ingênuo. Sei que alguns cardeais não pensam como eu sobre este tema. Mas julgo sua intervenção útil à construção de uma síntese comum. No entanto, tenho a peito dizer que a Igreja não é somente a Europa com as suas problemáticas. O centro da Igreja está em suas periferias, como nos ensina Francisco. As prioridades dos fiéis na África e na Ásia, por exemplo, são bem outras do que as nossas. Nestes dias teremos todos realmente a ocasião de erguer o olhar.
Ontem o cardeal Christoph Schönborn, arcebispo de Viena, solicitou “como filho de divorciados”mais atenção para os sofrimentos dos filhos dos mesmos separados. O que pensa a respeito?
Penso que ele tenha razão. E eu ampliarei ulteriormente o olhar. As feridas das famílias de hoje não se referem somente aos progenitores. As lacerações golpeiam os filhos e eu direi que também os avôs. Quando sofrem duas pessoas, realmente também sofrem todos aqueles que estão em torno deles. Uma Igreja misericórdia deve ter a capacidade de captar e tornar próprios estes sofrimentos.
Ainda ontem Francisco fez um apelo muito forte quando disse que “as assembléias sinodais não servem para discutir idéias belas e originais, ou para ver quem é mais inteligente”. E, simultaneamente, recordou como frequentemente “os maus pastores carregam sobre os ombros do povo pesos insuportáveis que eles não movem sequer com um dedo”. A quem queria falar?
Creio que a exigência seja dirigida sobretudo a nós padres sinodais, para que não nos percamos em discussões acadêmicas inerentes à doutrina, perdendo de vista a necessidade que a mensagem de amor de Cristo se encarne na vida de todos, dos homens com seus problemas e defeitos, alegrias e sofrimentos.
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Kasper: “Atentos para não perder-se em discussões doutrinais, é hora de escutar os fiéis”. - Instituto Humanitas Unisinos - IHU