16 Setembro 2014
Ninguém precisa ser convencido de que o que está acontecendo na Ucrânia, atualmente, é alarmante. Um frágil cessar-fogo entre os separatistas apoiados pelos russos e as forças ucranianas pode se desfazer a qualquer momento, e mais vidas podem estar em risco nesse próximo inverno, enquanto o país luta para compensar o gás perdido da Rússia.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada no sítio Crux, 13-09-2014. A tradução é de Claudia Sbardelotto.
Basicamente, se uma nação pode cortar um pedaço de outra de forma impune, fica difícil saber o que significa o direito internacional.
No entanto, se os católicos ainda exigem uma razão adicional para preocuparem-se, então, ela é esta: o que está em jogo na Ucrânia não é apenas uma questão geopolítica ou o equilíbrio de poder militar, mas também uma das comunidades católicas mais notáveis em qualquer lugar do mundo.
A Igreja Greco-Católica da Ucrânia é a maior das 22 "Igrejas Orientais" do rebanho católico. Localizadas principalmente no Leste Europeu e no Oriente Médio, essas Igrejas seguem a espiritualidade e os rituais ortodoxos orientais, porém reconhecem o papa como seu líder. Há cerca de 3 milhões de católicos gregos na Ucrânia, cerca de 7% da população, e entre 6 a 10 milhões em todo o mundo.
Embora pouco conhecida no Ocidente, a história recente da Igreja é material dramático para Hollywood.
Na era soviética, a Igreja Greco-Católica era o maior corpo religioso ilegal do mundo, e sofreu imensamente por isso. Em termos percentuais, nenhuma Igreja produziu mais mártires durante o século XX. O Papa João Paulo II beatificou mais de duas dezenas de vítimas durante uma viagem ao país em 2001, e a maioria dos especialistas acreditam que o número total de católicos gregos que pereceram naquela época de opressão violenta está na casa dos milhares.
Após o comunismo, a Igreja experimentou um renascimento que floresceu com uma energia criativa extraordinária. Um exemplo é a Universidade Católica Ucraniana em L'viv, fundada em 1994. Ela é a única universidade católica na antiga esfera soviética; como eles gostam de dizer, é a única universidade católica "entre a Polônia e o Japão".
Seu objetivo ousado é nada menos que repensar o conceito de universidade cristã no século XXI. Durante um processo de reflexão no início dos anos de 1990, os planejadores identificaram dois desafios:
Para lidar com essa dificuldade, a universidade voltou-se para as ideias de eruditos católicos como Henri Nouwen e Jean Vanier, fundador da L'Arche, um movimento que enfatiza a construção de amizades com pessoas com deficiência.
A idéia de Gudziak foi a de que, como as pessoas com deficiência mental tendem a confiar nos outros instintivamente, tê-las ao redor poderia produzir um fermento emocional. A universidade, então, convidou pessoas com necessidades especiais para fazer parte da comunidade, não por caridade, mas para que fossem "professores de relações humanas". As áreas residenciais da universidade incluem apartamentos para pessoas com deficiência para que vivam entre os alunos, tornando-se parte da estrutura diária de suas vidas.
Os greco-católicos também se tornaram figuras de destaque em assuntos nacionais. Eles foram os principais defensores da Revolução Laranja da Ucrânia em 2004/2005 e ajudaram a liderar os protestos na Praça da Independência [Maidan], no início desse ano, e que acabaram afastando do poder o presidente pró-russo Viktor Yanukovich.
A catedral católica de Kiev foi convertida em um hospital de campanha improvisado durante a revolta que provocou a morte de pelo menos 100 pessoas por agentes de segurança. Por vezes, as cirurgias de emergência tiveram que ser realizadas no altar principal da Igreja.
O arcebispo Sviatoslav Shevchuk (na foto com o Papa Francisco), um homem carismático de 44 anos, líder da Igreja Greco-Católica, surgiu como um defensor vigoroso dos manifestantes de Maidan, insistindo que eles não eram "extremistas nacionalistas", mas sim partidários de uma Ucrânia "livre, democrática e europeia".
No momento, Shevchuk e outras autoridades da Igreja estão liderando o ataque contra a intervenção da Rússia e convidando a comunidade internacional a contribuir para a resolução do conflito.
Reunidos esta semana em L'viv, os bispos greco-católicos divulgaram um comunicado intitulado "A Ucrânia está sangrando", que incluiu esse aviso sobre a agressão russa: "Quem mata pessoas na Ucrânia não hesitará em usar suas armas para atacar qualquer outro país do mundo amanhã".
Considerando esse histórico, não é nenhuma surpresa que, toda vez que um regime pró-moscovita está no poder, hostilizar os católicos tende a estar no topo da lista de tarefas.
Durante o governo de Yanukovych, Gudziak recebeu visitas horripilantes de agentes de segurança ucranianos. Em vez de se prostrar, ele publicou um memorando descrevendo a campanha de intimidação, que incluía a escuta de seus telefones.
Recentemente, um padre greco-católico foi sequestrado e, em seguida, liberado no leste da Ucrânia, e a maioria dos clérigos e bispos foram expulsos da região. A Igreja Ortodoxa Russa, em Moscou, emitiu declarações preocupantes culpando os "uniatas" e os "cismáticos" em fomentar a violência - ambos são termos pejorativos para os católicos gregos.
O que tudo isso significa é que quando os católicos abrem a boca, eles sabem que poderão ter que pagar um preço.
Em sua declaração na última quarta-feira, os bispos pediram "esforços coordenados ... para parar o derramamento de sangue, para defender a dignidade humana e para restaurar a paz vivificante", advertindo que a guerra não é apenas culpa dos que a travam, mas também daqueles que poderiam tê-la interrompido, mas não fizeram nada.
Qualquer um que esteja atento pode ver o quão urgente é esse apelo. Os católicos inspirados pelo entusiasmo desse corajoso rebanho ucraniano, no entanto, têm um motivo especial para prestar atenção.
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Uma Igreja vivaz está em risco na Ucrânia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU