19 Mai 2014
Os relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) trouxeram nos últimos 25 anos milhares de tabelas, infográficos e informações detalhadas sobre o aquecimento do planeta. Porém, esses documentos ainda não foram capazes de convencer uma boa parte da população mundial de que as mudanças climáticas são mesmo uma ameaça.
A reportagem é de de Fabiano Ávila, publicada no sítio CarbonoBrasil, 15-05-2014.
Por isso, a ONG Climate Outreach and Information Network (COIN) resolveu conversar com especialistas em comunicação para tentar achar um melhor modelo para os relatórios do IPCC. As respostas encontradas foram divulgadas nesta semana no relatório “Science & Stories: Bringing the IPCC to life” (Algo como, Ciência e Narrativas: Dando Vida ao IPCC).
Em linhas gerais, o que a COIN recomenda é que o IPCC traduza sempre que possível os dados científicos para impactos no dia-a-dia da vida dos cidadãos, buscando salientar exemplos reais das consequências do aquecimento global.
“O IPCC é incrível, inspirador e em muitas maneiras uma iniciativa sem precedentes. Porém, é percebido como uma organização burocrática, seca e muitas vezes enigmática”, afirma a COIN.
Para um dos especialistas entrevistados, Christian Teriete, diretor de comunicações da Global Call for Climate Action, essa visão de um IPCC “estéril” poderia ser resolvida com a inclusão de personagens nos relatórios da entidade.
“Podem aparecer pais e avós. Eles explicariam o que toda aquela ciência significa para o futuro de seus filhos e netos. As pessoas podem até respeitar um cientista do IPCC quando o vêem na BBC, mas elas terão uma conexão e uma simpatia maior se também aparecerem pais preocupados com suas crianças”, explicou.
Outra possível solução para tornar os relatórios do IPCC mais acessíveis seria produzi-los com mais frequência, em um formato mais curto e focado em um único assunto. Assim, ao invés de uma grande análise a cada quatro ou cinco anos, como ocorre hoje, poderiam ser documentos anuais, com uma edição especial para secas, outra para enchentes etc.
“As grandes análises são um peso para o IPCC. Provavelmente, a entidade ficaria melhor se produzisse relatórios menores em temas específicos”, afirmou Fred Pearce, que escreve para o The Guardian e para a New Scientist.
“O IPCC é uma entidade nobre. Está fazendo algo profundo e importante. Mas, como jornalista, acho os relatórios quase impenetráveis. São difíceis de ler e também é difícil ter contato com o escritório do secretariado para tirar dúvidas. E mesmo quando você consegue falar com eles, a conversa costuma se dar em uma linguagem muito hermética”, disse Louise Gray, jornalista do The Daily Telegraph para o setor de Meio Ambiente.
Apesar de destacar essa necessidade de “humanizar o IPCC”, a COIN e alguns especialistas salientam que essa é uma tarefa bastante difícil e que pode ser perigosa para a credibilidade da entidade.
“O IPCC está entre a cruz e a espada. Se simplificarem demais seus relatórios, serão acusados de serem supérfluos. Se continuarem muito complexos, não passarão sua mensagem. Na minha opinião, o que o IPCC deve fazer é se comunicar com precisão. Se conseguir fazer isso de uma maneira simples, fantástico, mas se não for possível, melhor não tentar. A credibilidade da entidade estaria em risco”, explicou Mike Childs, diretor de Políticas e Ciências da ONG Amigos da Terra.
Years of Living Dangerously
Talvez não caiba ao IPCC dar esse tom “mais humano” às mudanças climáticas, mas sim às próprias empresas de comunicação e ao movimento ambientalista.
Nesse sentido, uma série de televisão que está fazendo um belo trabalho é a Years of Living Dangerously, que estreou há algumas semanas nos Estados Unidos. Produzida por James Cameron, diretor de “Titanic” e “Avatar”, a série conta com celebridades como Arnold Schwarzenegger, Harrison Ford, Jessica Alba e Matt Damon para trazer histórias dos impactos já vistos das mudanças climáticas.
Em um dos seus episódios mais recentes, o programa acompanha Anna Jane Joyner, uma ativista ambiental que vem a ser filha de um dos maiores pastores evangélicos dos Estados Unidos, Rick Joyner.
Anna Janne criou o movimento Creation Care, que busca incentivar evangélicos, como ela, a se engajar em causas ambientais. Os evangélicos formam uma das maiores bases eleitorais dos EUA, sendo que muitas vezes são responsáveis por eleger os candidatos mais conservadores e que são contra ações climáticas e ambientais.
Anna tem no seu pai um de seus grandes opositores, pois para Rick Joyner “toda essa questão de aquecimento global não passa de uma farsa.”
Durante o episódio, Anna faz com que sue pai se encontre com diversos climatologistas, incluindo Richard Müller, que até poucos anos atrás era o principal cientista cético do planeta e que depois de realizar ele mesmo um vasto estudo chegou à conclusão de que o aquecimento global é real e é causado principalmente pelas atividades humanas.
Apesar dessas conversas com grandes pesquisadores, Rick não se deixa influenciar.
Porém, quando Anna leva Rick para uma região de cultivo de ostras que está desaparecendo por causa do aquecimento global, o pastor se sensibiliza com os pescadores que estão perdendo sua forma de sustento.
No fim, apesar dos esforços da filha, Rick ainda continua não acreditando em aquecimento global causado pelo homem. No entanto, ele deixa claro que se mais exemplos como o dos pescadores fossem mostrados para a população em geral, poderia ser que sua percepção e a de muitos outros mudaria.
O primeiro episódio de Years of Living Dangerously pode ser visto na íntegra aqui:
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Especialistas em comunicação destacam que IPCC deveria ser “mais humano” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU