17 Dezembro 2013
Achim Steiner, diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para Meio Ambiente (Pnuma) e subsecretário-geral da ONU, acredita que é possível tomar decisões práticas sobre cortes nas emissões de gases-estufa enquanto as negociações internacionais não chegam a um acordo global. Reduzir o uso de gases-estufa menos conhecidos, como o óxido nitroso (N2O) usado na agricultura e em processos industriais, pode ser uma dessas oportunidades.
O problema nas negociações internacionais, como a recente rodada de Varsóvia, na Polônia, "é que não se avança em nada enquanto todo o resto não estiver decidido", diz Steiner. "Ficaremos nisso, em que nada é feito até que tudo seja acertado, ou dá para reconhecer que há algumas abordagens práticas que podem ser agilizadas?", questiona. O alemão Steiner, que nasceu em Carazinho, no Rio Grande do Sul, falou nas últimas horas do encontro de Varsóvia, a CoP-19.
A entrevista é de Daniela Chiaretti, publicada no jornal Valor, 16-12-2013.
Eis a entrevista.
Como avançar nas negociações internacionais sobre mudança do clima?
Não se esperava que a CoP-19, de Varsóvia, produzisse decisões, mas o encontro tinha que criar uma rota de confiança para um acordo na CoP de Lima e em Paris, em 2015. Há expectativa em relação ao encontro organizado pelo secretário-geral Ban Ki-moon em 2014, em Nova York. Agora, o que tem de acontecer, claramente, é um briefing político aos negociadores. A mensagem que eles têm que levar para casa é dramática: no cenário atual, será muito difícil conseguir um acordo significativo. É preciso repensar como abordar essa questão.
Como fazer com que as sociedades se apropriem desse debate e participem mais?
Três coisas: a primeira é mostrar que o momento da oportunidade de agir está desaparecendo e que tempo é crucial nesse assunto. Em segundo lugar, entender que não agir é muito caro. As pessoas sempre falam sobre o custo da ação, mas em cada lugar que olhemos, hoje, o custo da inação é muito mais alto. É preciso corrigir essa percepção. E em terceiro lugar, fazer com que as pessoas confiem que agir na mudança climática significa oportunidades em florestas, em energias renováveis, em formas de reduzir a poluição. Isso quer dizer empregos. A ideia de que combater a mudança do clima irá, de algum modo, evitar o desenvolvimento é um conceito equivocado, mas as pessoas acreditam nisso. Se essas três coisas - urgência, custo da inação e oportunidades - chegarem ao debate doméstico, veremos mais pressão do público, da sociedade civil, das indústrias, do comércio, dos governos locais. E isso dará base para que os governos possam dar passos maiores na direção de um acordo global.
O que o senhor achou da decisão do Japão, de voltar atrás em suas metas de reduzir emissões?
Tenho muita compreensão e empatia pelo dilema japonês e entendo que há um inquestionável desafio de curto prazo. Aconteceu aquele tremendo desastre [de Fukushima], que seria um desafio imenso para qualquer país. Só acho que é difícil entender a forma e o momento em que esse anúncio de aumentar as emissões foi feito. Quanto mais puderem explicar a decisão, mais ficará claro que não estão saindo dos compromissos já assumidos. O Japão tem histórico de ser um país ambicioso em tecnologia, de procurar fazer bom uso dos recursos naturais, reduzir poluição, ter eficiência energética. O mundo costuma ver o país como líder e pioneiro. Espero que a mensagem do Japão seja: "Olha, temos um desafio de curto prazo, mas também temos um compromisso grande como uma das lideranças mundiais em combater a mudança do clima".
Como o senhor vê o acordo bilateral entre os Estados Unidos e a China de eliminar o uso e o consumo de gases HFCs? Vai na mesma linha que os estudos do Pnuma sobre reduzir a emissão de N2O?
O primeiro ponto é que esses são gases do efeito estufa que estão sob a Convenção do Clima e a discussão, então, pertence a esse fórum. Sobre o relatório do Pnuma, bem, nós acreditamos na necessidade urgente de agir e essas substâncias são prioridades, o objetivo é colocar foco nos estudos científicos sobre esses tópicos para os tomadores de decisão. Nosso papel não é determinar como os governos deveriam agir, mas mostrar a eles que estão perdendo uma chance. A minha interpretação pessoal é que alguns países em desenvolvimento teriam que estudar quais são os custos de acabar com esses gases, porque os industrializados estão prestes a fazer a transição. O problema nas discussões sob a Convenção é que não se avança em nada enquanto todo o resto não estiver decidido.
Isso é problema?
Sim porque ficaremos nisso, em que nada é feito até que tudo seja acertado, ou dá para reconhecer que há algumas abordagens práticas que podem ser agilizadas? Esse é um desafio nas negociações internacionais que irá exigir boa vontade e pragmatismo. Acho que o sinal que os presidentes Xi Jinping e Barack Obama deram de desacelerar a produção e o consumo de HFCs é o reconhecimento de que existe uma oportunidade e temos que encontrar uma maneira aceitável de concretizá-la.
Há esta grande lacuna entre o quanto os cientistas dizem que é preciso cortar na emissão de gases-estufa e as promessas dos países. Como as conferências do clima podem avançar?
O que está claro no relatório do Pnuma "Emissions Gap 2013" é que a chance de fechar essa lacuna começa a desaparecer. Mas há oportunidades em muitas áreas. Na redução de outros gases-estufa na agricultura, por exemplo. Há muitos caminhos a trilhar, acredito que somos capazes de resolver isso. Bem, as pessoas associam essas conferências do clima com paralisia e impasse. Mas elas também mostram que há milhares de pessoas construindo a nova economia de baixo carbono. São prefeitos, empresários, governos locais, ministros de energia, líderes comunitários do Sul e do Norte.
O que o senhor achou da saída das grandes ONGs da conferência de Varsóvia?
Nessas negociações, de tempos em tempos, algum país ou grupo de países se retira. Agora foram as ONGs que expressaram claramente sua frustração com esse processo tão complicado. Respeito isso. Principalmente das ONGs que estão aqui, que investiram tempo, dinheiro e energia em compreender e participar desse processo. Elas têm o direito de estar nele, de se retirar, e também têm a oportunidade de voltar.
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Óxido Nitroso. "Não é preciso esperar acordo amplo para agir", diz Pnuma - Instituto Humanitas Unisinos - IHU