12 Novembro 2013
Embora se trate de um pastor universal tenaz, não basta um único homem no comando. O que será quando acabar a lua de mel? Quando o círculo mágico que rodeava os papas tentar se reorganizar?
A opinião é do sociólogo italiano Franco Garelli, professor da Universidade de Turim, em artigo para o jornal La Stampa, 10-11-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
"As primaveras da Igreja sempre chegam sem sinais premonitórios". A afirmação não é de um observador qualquer, mas sim de Alberto Melloni, um dos estudiosos mais qualificados de história do cristianismo, que dedica o seu último livro, Quel che resta di Dio [O que resta de Deus], à extraordinária estação que a Igreja Católica está vivendo com o advento de Jorge Bergoglio ao sólio de Pedro.
A reviravolta, portanto, não estava na ordem das coisas, mesmo que não faltassem os sinais premonitórios. Nos últimos 20-30 anos, estava se ampliando o fosso entre o que acontece nos dois quilômetros quadrados que constituem o Vaticano e o resto do mundo, mesmo o cristão e católico.
Muitos em Roma e arredores cultivavam a ideia de uma Igreja "malhada", mais orientada a mostrar os músculos no espaço público do que atenta à sua missão espiritual; mais fechada como uma ostra sobre as suas próprias limitações e pecados internos (a pedofilia do clero, o escândalo do IOR, o carreirismo dos bispos, os conflitos entre os movimentos eclesiais, os tráficos em torno das cartas do papa) do que capaz de implementar uma purificação evangélica. E isso apesar de os últimos pontífices terem tentado combater o impasse de uma situação eclesial que refletia em nível religioso a crise cultural do Ocidente.
O abalo certamente veio a partir da grande renúncia de Bento XVI, embora Francisco, mais do que pegar o bastão do seu antecessor, mudou de tom e de cenário. Chega das intrigas de palácio, não a escolha de um papa capaz de navegar nos meandros da Cúria Romana. Mas sim uma figura especialista mais em uma fé vivida do que em uma religião que busca se legitimar em nível cultural e político; capaz de um olhar bom sobre o mundo.
Tudo bem, então, com Francisco? Iuxta modum, diria Melloni. Os méritos do novo inquilino de Santa Marta são realmente muitos, uma vez que ele não tem medo de fazer gestos de misericórdia e de ternura, relembra o estilo do Papa João XIII e a aspiração "pastoral" do Concílio Vaticano II, pede que a Igreja toda seja pobre e próxima das periferias do mundo, ativa formas de colegialidade a 50 anos do Concílio.
No entanto, embora se trate de um pastor universal tenaz, não basta um único homem no comando. O que será quando acabar a lua de mel? Quando o círculo mágico que rodeava os papas tentar se reorganizar?
Portanto, há o risco de que, diante do carisma de Francisco, a Igreja fique preguiçosa, extasiando-se com o novo papa. Daí a necessidade de que as Igrejas locais e as comunidades católicas de todas as partes, sensíveis à nova estação do espírito, sejam vigilantes e empenhadas para incidir na fisionomia de toda a Igreja, para renovar as suas instituições e a sua presença pública.
Não se trata de renunciar a afirmar a identidade cristã, mas compartilhando a vivência das pessoas comuns, dialogando com todas as fés e as pessoas de boa vontade, testemunhando a novidade de um evangelho fecundo para os destinos da Igreja e do mundo.
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A incógnita de um homem sozinho no comando. Artigo de Franco Garelli - Instituto Humanitas Unisinos - IHU