21 Outubro 2013
Ao longo dos séculos, os primeiros tremores dos terremotos no catolicismo muitas vezes foram sentidos na Alemanha. Essa nação deu origem à Reforma Protestante e também foi onde as energias teológicas que irromperam no Concílio Vaticano II começaram a circular.
A reportagem é de John L. Allen Jr., publicada por National Catholic Reporter, 18-10-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Ralph Wiltgen capturou o segundo ponto no título da sua famosa história do Vaticano II de 1967, The Rhine Flows into the Tiber [O Reno deságua no Tibre].
Dada essa história, vale a pena dar uma olhada na Alemanha nestes dias para acompanhar as consequências do "efeito Francisco". Duas histórias recentes são intrigantes a esse respeito.
Primeiro, a Arquidiocese de Friburgo emitiu recentemente um manual pastoral de 14 páginas delineando as circunstâncias sob as quais os católicos divorciados e recasados civilmente podem ser readmitidos aos sacramentos, incluindo a Comunhão. Essa medida obrigou o Vaticano a emitir uma declaração no dia 8 de outubro instando os líderes da Igreja a esperar que as reformas sejam adotadas em Roma antes de implementá-las in loco.
Segundo, Dom Franz-Peter Tebartz-van Elst, bispo de Limburg, está se tornando uma celebridade mundial como o "bispo ostentoso" por causa dos relatos de grande circulação sobre quanto ele gastou para remodelar a sua residência – 42 milhões de dólares no total, incluindo quase 22 mil dólares em uma banheira. Francisco enviou um investigador para Limburg em setembro, e esta semana Tebartz-van Elst estava em Roma para reuniões, enquanto aumentavam os pedidos pela sua renúncia.
Se estes são os primeiros sinais de alerta de algo maior, o que poderia ser?
No caso de Friburgo, é o perigo das expectativas. Os católicos de uma certa idade vão se lembrar da atmosfera em 1963 quando João XXIII criou uma comissão para estudar o controle de natalidade, que continuou com Paulo VI. A conclusão foi de que a Igreja estava prestes a mudar o seu ensino, tanto que as pessoas se lembram dos padres dizendo do púlpito que elas não precisam mais se confessar pelo uso de anticoncepcionais, porque tudo isso estava prestes a desaparecer.
Claro, Paulo VI, no fim, afirmou a proibição tradicional com a Humanae Vitae. Independentemente da opinião pessoal sobre o mérito da encíclica, não há como negar que as pessoas que esperavam a mudança ficaram imensamente decepcionadas, e as linhas de falha que se abriram, rasgaram na pele o papado de Paulo VI a partir daquele ponto.
Hoje, de forma semelhante, Francisco criou expectativas palpáveis de mudança nas regras relativas aos católicos divorciados e em segunda união. Mais uma vez, há uma sensação generalizada de que é apenas uma questão de tempo, e Friburgo ilustra a tentação compreensível de começar antes do tempo. Se o papa já sinalizou para onde estamos indo – muitas pessoas podem concluir –, qual é o sentido de ficar esperando?
Nada disso é especialmente preocupante se Francisco já tem a sua opinião formada. Mas, se ele não a tem – por exemplo, se ele está aberto à possibilidade de que o Sínodo dos Bispos de outubro do ano que vem pode empurrá-lo em uma direção diferente –, Friburgo fornece uma dica útil de que poderia ser uma boa ideia dizer isso em voz alta.
Quanto à Limburg, isso ilustra uma característica marcante do estilo de gestão de Francisco que podemos apelidar de "liderança por envergonhamento".
Não está claro se Francisco vai impor disciplina em Tebartz-van Elst, removendo-o do ofício ou nomeando um delegado papal para administrar alguns aspectos da diocese, incluindo suas finanças.
Em alguns aspectos, no entanto, tudo isso pode ser supérfluo, porque ele já deu uma martelada simplesmente ao oferecer uma visão tão inconfundivelmente diferente de como deve ser a liderança na Igreja.
Como um experimento de reflexão, pensemos se essa história teria se tornado uma causa célebre durante os anos de Bento XVI. Eu suspeito que a resposta seja não, porque o que a torna tão chocante e tão irresistível a partir de um ponto de vista midiático é o contraste entre Tebartz-van Elst e o seu novo chefe.
A manchete tem sido: "Esse bispo não entendeu o recado".
Claro, o abraço da simplicidade de Francisco surge da sua própria personalidade e convicções espirituais. No entanto, ele também é politicamente experiente o suficiente para perceber que ele entrega um cassetete ao mundo para bater nos bispos que não seguem o seu exemplo.
Em outras palavras, Limburg ilustra que Francisco nem sempre precisa exercer os poderes formais do seu ofício a fim de apertar os parafusos de administradores recalcitrantes de nível médio. Às vezes é suficiente apenas dar um exemplo diferente e deixar que a opinião pública faça o restante do trabalho.
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A ''liderança por envergonhamento'' de Francisco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU