25 Junho 2013
Francisco dedicou o primeiro tempo do seu ministério para mostrar que ele tem a calma de quem não precisa ler nenhum dossiê secreto para saber os segredos abertos da Roma eclesiástica e que ele sabe que tem pela frente um pontificado breve, mas nem por isso condenado à precipitação.
A análise é Alberto Melloni, historiador da Igreja, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação João XXIII de Ciências Religiosas de Bolonha. O artigo foi publicado no jornal Corriere della Sera, 23-06-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O Papa Francisco marcou o fim dos primeiros 100 dias de ministério com um gesto que soa como um toque de sinos solene, severo.
Que Francisco não gostava da fatal mundanidade de eventos como o que foi desertado nesse sábado era algo fácil de se entender, mesmo antes de posicionar a sua poltrona branca: essas coisas celebram momentos, mas também relações, e sobre isso a mansa intransigência de Bergoglio foi proverbial desde sempre.
Que Francisco tenha que se preparar ou se defender contra o que vai acompanhar o anúncio das primeiras decisões de governo é razoável: o papa está trabalhando nas primeiras nomeações importantes na Cúria e na Igreja – e também mantém reservados os primeiros "amoveatur" (alguns sem o ritual "promoveatur") – e os mantém reservados não como alguém que espera encontrar consenso, mas como alguém que só quer comunicar a todos que ele não tem pressa: porque sabe tudo sobre todos.
É possível que algo de muito pessoal teve a precedência. Mas também é evidente que, deixando vazia a sua cadeira no evento que celebrava a fé e algumas vaidades, além disso não insólitas entre os grandes personagens da Cúria, o papa fez um gesto do qual compreendia a dureza.
Esse gesto, por outro lado, foi muito coerente com o estilo que caracterizou esses primeiros 100 dias, como sempre iluminadores e preditivos de um desenvolvimento pontifício inteiro. De fato, se fosse preciso dizer o que foi central nesses dias seria preciso falar justamente do estilo-Francisco (no sentido dado ao termo "estilo" pelo grande teólogo jesuíta Christoph Theobald). O estilo-Francisco foi feito de um uso preciso do tempo, do espaço e do governo.
Francisco toma o tempo de um modo inusual para um pontífice: para se preparar rezando e para pregar. Ele semeia pregação, em vez de produzir magistério: há 100 dias. Como mostrou Congar, o "magistério ordinário" (distinto dos atos de governo e da "lectio divina") foi a arma da luta contra a modernidade. Os dois pontificados anteriores haviam considerado unanimemente que essa ainda era a questão e que o espaço público era o terreno sobre o qual lutar, com um magistério ao menos "definitivo".
Francisco abandonou tudo isso: ele não se matriculou para fazer um curso de teologia em módulos e se resguardou muito de que os Ângelus não lhe fossem ditados pela agenda dos parlamentares, mesmo sem esquecer de olhar para tragédias como a síria e para eventos perigosos como os dos bispos ortodoxos sequestrados. Ele deu o exemplo de como um bispo se dedica à construção do edifício interior e da abertura espiritual, em vez do monitoramento da legislação e da comunicação política.
Francisco prega como quem tem em mente um tempo em que o governo se torna mais sutil e dá lugar a uma homilética (a arte e o estudo da pregação) em que parece que despontam de uma lista imaginária os temas que ele queria tocar: pobreza, perdão, concílio, IOR, colegialidade, confissão, santidade, pecado, ascese, batismo, comunhão etc. "O papa se repete", dizem aqueles que o querem bem: sem se dar conta de que o papa sabe disso e usa o tempo para se repetir, como se quisesse hipnotizar a neurose dos registros e dos virtuosismos. E quando ele prega, dá a impressão de que a sua palavra não quer encerrar uma discussão sobre os nós da vida cristã, mas pretende abrir um tempo de diálogo fraterno ao qual a Igreja não está preparada.
O estilo de Francisco tem um uso peculiar do espaço. Ele privou "o Apartamento" da cotidianidade. O edifício em que tudo era símbolo de poder é agora uma central em desuso, em que ele entra permanecendo incontaminado por ele e privando a corte de usos e protocolos que não eram a tradição, mas apenas antiguidades. Ao contrário, ele entra no espaço mais difícil: o dos pobres coitados que lotam as suas audiências, e, em vez de ocupá-la como um soberano de tal forma poderoso a ponto de se curvar até diante dos pobres, desaparece no seu abraço. Que os Gentis-Homens estavam destinados a desaparecer desse espaço duplo era algo bem conhecido desde as vésperas da liturgia do dia 18 de março: e se torna norma quando isso já foi posto fora do jogo pelos fatos.
O estilo de Francisco é também um estilo de governo e de não governo. Por 100 dias, Francisco manteve a Igreja envolvida na primeira parte de um longo curso de exercícios espirituais. Francisco dedicou esse primeiro tempo do seu ministério para mostrar que ele tem a calma de quem não precisa ler nenhum dossiê secreto para saber os segredos abertos da Roma eclesiástica e que ele sabe que tem pela frente um pontificado breve, mas nem por isso condenado à precipitação.
Ele anunciou um órgão que constitui a primeira (primeira) expressão de colegialidade "ad gubernandam ecclesiam". Ele não fez grandes nomeações, mas prepara a substituição na Secretaria de Estado e em alguns dicastérios-chave, no marco de uma reforma da Cúria por vir: sem neuroses e sem medo de dar sinais fortes, como demonstra a cadeira vazia desse sábado.
Em 100 dias, Francisco impôs esse estilo: e teve uma resposta afetuosa, mas também fácil como a dos taxistas que afirmam que "esse papa me agrada". Certamente, esse estilo consola a muitos que gostariam de ter um pároco assim, alimenta muitos padres e bispos, um pouco por superficialidade, um pouco por santa imitação.
Mas é um estilo exigente: e o que se viu nesses primeiros 100 dias, até o redobrar de sinos de uma cadeira vazia, diz que o papa sabe disso e não retrocede.
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Os gestos simples que se tornaram um estilo de governo. Artigo de Alberto Melloni - Instituto Humanitas Unisinos - IHU