17 Março 2013
Para não ofender os não crentes, nesse sábado, o Papa Francisco abençoou em silêncio os jornalistas recebidos em audiência na Sala Paulo VI: "Como muitos de vocês não pertencem à Igreja Católica, outros não são crentes, de coração dou esta bênção em silêncio, a cada um de vocês, respeitando a consciência de cada um, mas sabendo que cada um de vocês é filho de Deus", disse ele, logo colocando em prática a vontade pouco antes manifestada de uma Igreja "dos pobres", que não pontifica dos pedestais, mas se faz serva de todos.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 17-03-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Na última quinta-feira, na missa com os cardeais na Capela Sistina, em vez das vestes pontifícias, vestiu uma casula simples. Ainda na Capela Sistina, celebrou não mais "de costas para o povo" e com a cátedra no centro, como o Papa Ratzinger costumava fazer, retornando a usos pré-conciliares, mas de frente para a assembleia e com a cadeira de lado, à esquerda, olhando para o afresco do Juízo Final.
E na próxima terça-feira, para a missa "de inauguração" do pontificado, outra novidade: ao lado dos cerimonialistas pontifícios, trará como ministrantes, também chamados de coroinhas, não mais os seminaristas romanos, mas sim os freis franciscanos do Santuário de La Verna, perto de Arezzo. Religiosos, portanto, e não candidatos ao sacerdócio.
Em suma, muitos pequenos sinais que, juntos, formam aquela que muitos chamam de a "nova" marca litúrgica do Papa Francisco, um estilo que, de golpe, depois de anos de graduais reaproximações ao rito antigo e às suas regras, faz voltar para fora das catacumbas nas quais corria o risco de ser enterrado o Concílio Vaticano II e, com ele, toda a sua teologia: a Igreja entendida como povo de Deus, para a qual não apenas a hierarquia, mas também todos os fiéis são investidos dos ofícios do sacerdócio, da profecia e da realeza.
Bento XVI amava o rito antigo, a missa celebrada em latim, com o sacerdote voltado para o Oriente, o sol que surge, Cristo que vem. Mas não queria um retorno tout court ao antigo. Tratava-se, mais do que qualquer outra coisa, de um amor pela liturgia, da qual ele participava desde criança, em uma das terras mais romanas do catolicismo alemão, a Baviera.
Ao invés, foram inúmeros os setores tradicionalistas que superdimensionaram esse sentimento de Ratzinger com o antigo, sobrepondo-o à sua ideia de um Concílio que ainda devia ser interpretado plenamente como renovação na continuidade com o passado, a miragem de um reinicialização das próprias novidades do Concílio. Agora, o Papa Francisco reinicializa toda nostalgia litúrgica e impõe um estilo totalmente no rastro do Vaticano II: os fiéis não são "'presentes ausente", mas são a assembleia "sujeito" da celebração.
Ainda desde os primeiros minutos após a eleição, os cardeais em torno do Papa Francisco haviam entendido que muito mudaria. O primeiro sinal veio da Sala das Lágrimas, onde Bergoglio abandonou a batina vermelha para vestir a sua nova veste branca. Aqui, ele se recusou a vestir, sobre a mesma veste, a mozeta de veludo vermelho bordada com arminho e a cruz de ouro. Alguns relatam que ele teria "liquidado" as insistências do Mestre das Celebrações Litúrgicas, o fino liturgista Guido Marini, aluno do cardeal Siri, com um decidido: "Isso vista você. Eu vou usar esta, a cruz de quando eu me tornei bispo". Ou seja, uma cruz de ferro que mostra a representação do Bom Pastor com uma ovelha perdida nas costas e, ao fundo, o seu rebanho.
Mas se ainda é difícil acreditar que o manso Francisco usou um tom semelhante com Marini, é inegável a sua recusa a tudo o que não tem nada a ver com a essencialidade, com a fé simples dos últimos, Cristo no centro da cena, e ninguém mais no seu lugar.
Quando a Igreja celebra os sacramentos, confessa a fé recebida dos apóstolos. Daí o antigo adágio: "Lex orandi, lex credendi". Daí o ditado de Próspero de Aquitânia: "Legem credendi lex statuat supplicandi". A lei da oração é a lei da fé: a Igreja crê como reza. Por isso, Francisco desde logo propõe o seu estilo. Porque é como reza que a Igreja crê. A sua Igreja é humilde, pobre, até mesmo despojada.
E o primeiro lugar em que isso se manifesta é onde está o seu coração, justamente a liturgia: para servir na sua missa de início de pontificado, virão freis franciscanos, humildes religiosos. Francisco não só prega humildade, mas também a busca no seu agir. Da andar central da basílica vaticana, na noite da eleição, ele pediu ao povo na praça para rezar em silêncio por ele. Diz-se que ele queria se ajoelhar para receber a oração das pessoas reunidas embaixo. Desaconselharam-no a fazer isso, porque o parapeito o esconderia. Assim, simplesmente inclinou a cabeça, o primeiro sinal de que muita coisa mudaria.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
''Abençoo em silêncio e em respeito aos não religiosos'': a revolução da liturgia de Bergoglio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU