04 Março 2013
O que evoca a expressão "falando como leiga" ao interlocutor que não seja já informado? A ideia de fundo é que o espaço próprio dos leigos é a santificação ou animação cristã das realidades terrenas, dos ambientes de vida e de trabalho. Hoje, felizmente, parece que essa ideia é cada vez mais posta em discussão.
A opinião é da teóloga leiga italiana Lilia Sebastiani, doutora pela Accademia Alfonsiana e professora do Liceo Scientifico Renato Donatelli, de Terni. O artigo foi publicado na revista Rocca, n.2, 15-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O que evoca, instintivamente, uma expressão como "falando como leiga" ao interlocutor que já não esteja informado? Uma pessoa não crente? Uma pessoa que não tem nada a ver com a Igreja? (De modo educadamente desinteressado, ou talvez de um modo hostil?) Uma pessoa que não se deixa condicionada pelas indicações do magistério nas suas escolhas pessoais, sociais e políticas? Uma pessoa crente que, de algum modo, se sente parte da Igreja, e que não pertence ao ordo clericorum? (É igualmente verdade que, falando no feminino, esta última interpretação também não serve: o homem pode escolher ser clérigo ou leigo, a mulher não). Uma pessoa que vive e desenvolve o seu próprio "carisma laical" – o que quer que isso signifique?
Aqui, é claro, usamos o termo no sentido intraeclesial. No entanto, a sua estranha ambiguidade basta para realçar o problema; ao menos, para evidenciar que há um problema.
A nossa linguagem eclesial tem se afiado depois do Concílio (certamente mais do que a vivência eclesial avançou), mas dar uma definição da palavra leigo que não seja negativa continua sendo um desafio quase impossível para qualquer um.
Uma definição somente negativa
Porque queremos defini-lo, então? Um "batizado"? Um "membro do povo de Deus"? À parte o fato de que ser batizado é claramente insuficiente para ser membro do povo de Deus de modo ativo e consciente – só os documentos oficiais do magistério continuam identificando, ignorando todas as evidências, um pouco simplisticamente, o baptizatus com o christifidelis –, a definição não funciona porque não de-fine, porque é insuficiente para conotar alguém com relação a outrem: mesmo os clérigos, em qualquer nível da pirâmide hierárquica, são batizados e são membros do povo de Deus!
O leigo cristão, não há saída, é aquele "não é clérigo", ou, segundo outra definição menos sacramental e mais jurídica, aquele "não é nem clérigo nem religioso". Seria fácil (embora um pouco longo) oferecer uma definição exaustiva do clérigo e indicar as suas competências, grau por grau; enquanto o leigo deve ser definido como aquele que não é clérigo, e portanto não pode fazer certas coisas que um clérigo, ao contrário, pode fazer.
Que eclesial e teologicamente esse fato indiscutível representa uma grave fraqueza da fraqueza da categoria "leigo", não há quem não veja. (Um princípio fundamental da filosofia da linguagem diz que, quando uma palavra deve ser definida por meio da negação de outra palavra, isto é, do seu oposto, isso significa que das duas palavras ela é a mais frágil, a menos significativa).
Originalmente, como se sabe, o adjetivo grego laikós (de laos = povo) tem o sentido de "profano" e remete ao regime pagão do sagrado, que Jesus superou e deslegitimou.
No âmbito da linguagem, nada acontece por acaso, tem sempre razões históricas e psicológico-culturais exploráveis. Uma evolução-involução de significado semelhante a essa, ou ao menos paralela, se verificar pelo adjetivo "clerical". Originalmente, ao menos até o século XVIII (Revolução Francesa) e na primeira metade do século XIX, ele significa simplesmente "pertencente ao clero": ou seja, não tem nenhum porte de valor, não expressa nem subentende um julgamento.
Ao invés, a partir da segunda metade do século XIX, ao menos fora da linguagem eclesiástica (que, sobretudo nos textos em latim, conserva o sentido original até os tempos do Vaticano II), "clerical" adquire um porte negativo e significa, segundo os casos, prisioneiro de uma visão da própria vida do clero mais retrógrado, incapaz de se abrir ao mundo, ou – referido a pessoas que não pertencem ao clero – uma visão carola e tradicionalista do mundo e da Igreja, moldada segundo categorias impostas pelo clero e interiorizadas de maneira servil, acrítica.
Isso também exigiria uma reflexão suplementar. No Código de Direito Canônico de 1917 – aquele que influenciou a história e a formação eclesial de todos nós – falava-se dos leigos dentro do Livro II (De Personis: parágrafo III De laicis), e só dois cânones se referiam aos leigos como tais: o cânone 682 proibia-lhes de vestir o hábito eclesiástico (habitum clericalem), e o cânone 683 afirmava que os leigos têm o direito de receber do clero os bens espirituais, não mais bem especificados, "e sobretudo as ajudas necessárias para a salvação", que supomos que sejam os sacramentos.
Tudo, como se vê, muito vago. Ao contrário, depois, o Código se delongava bastante minuciosamente sobre as associações de leigos, "pias uniões", confraternidades e assim por diante, como realidades que, pela sua natureza, requerem uma regulamentação jurídica também.
Seria uma tarefa árdua rastrear o Código de 1917 uma visão teológica do laicato. Começa-se realmente a falar a respeito somente nos anos 1950 (é de 1953 o livro de Yves Congar, Jalons pour une théologie du laïcat, cujas ideias de fundo serão depois amplamente postas em discussão pelo autor em uma obra escrita vários anos mais tarde, depois da conclusão da experiência conciliar, em que afirmava claramente que o binômio significativo não era clérigos-leigos, mas sim comunidade-ministérios), de maneira ainda isolada e pioneira, dentro dos círculos especializados que não refletiam a orientação de todo o povo cristão, nem do magistério, mas que mesmo assim preparavam o terreno para uma evolução.
Nesse âmbito também a verdadeira reviravolta foi marcada pelo Concílio Vaticano II.
A reviravolta do Vaticano II
Que o Concílio marca o início de uma importante mudança é evidente e conhecido de todos: a tal ponto que muitas vezes precisamente a promoção eclesial dos leigos foi assumida como critério de significado e sucesso do Concílio como um todo. Falamos de "início" de uma mudança: as várias questões não estão nem resolvidas nem completas, muito menos nesta nossa época em que as tendências regressivas são tão fortes e tão "encorajadas".
Uma nova consideração dos leigos cristãos se revela tanto na constituição Lumen gentium sobre a Igreja, em que é retomada a ideia bíblica de "povo de Deus" e é proclamada a dignidade sacerdotal, profética e real de todos os fiéis; na constituição Gaudium et Spes sobre a Igreja no mundo contemporâneo, porque sublinha de modo inédito a solidariedade da Igreja com a história humana e com o mundo; a constituição Sacrosanctum Concilium sobre a liturgia, que valoriza também em sentido teológico-espiritual a participação dos fiéis na ação litúrgica e salienta que a celebração é ação de toda a Igreja, e não só do clero. Dever-se-ia ainda recordar o decreto sobre o apostolado dos leigos, Apostolicam actuositatem, mas que parece um documento bastante modesto.
Embora não possamos lembrar aqui e agora todas as passagens relevantes sobre o tema dos leigos, pode-se afirmar que a novidade conciliar contrapõe à clássica eclesiologia tridentina, fundamentada na dicotomia clérigos-leigos, uma nova visão da Igreja fundamentada na ideia de povo de Deus e na ministerialidade.
Mas há também uma mudança mais difusa e fundamental, que talvez tornará impossível zerar a novidade do Concílio, mesmo àqueles que agora se esforçam para esse fim. A novidade reside, a montante das afirmações e/ou reformas individuais, justamente no fato de ter instaurado dentro da Igreja uma prática de livre debate sobre as questões emergentes.
Até então, debater os problemas da Igreja em público e nos meios de comunicação era bastante insólito, reservado a casos excepcionais. Com o Concílio, instaura-se um estilo de assembleia, não só na aula conciliar, mas também do lado de fora, cuja importância histórica nunca será suficientemente sublinhada.
O Concílio, no entanto, permaneceu em grande parte um "sonho de Igreja", muito imperfeitamente conhecido e parcialmente recebido pelo povo cristão e pelos próprios pastores; ainda mais hoje – quando afirmações individuais e procedimentos conciliares individuais podem parecer datadas e próximas de muitos que, mesmo assim, reconhecem o seu grandíssimo valor histórico e teológico –, a vivência da Igreja parece retroceder de modo preocupante com relação às próprias aquisições conciliares.
Além disso, é bem conhecido a qualquer pessoa seriamente ocupada que, no Vaticano II, são reconhecíveis ao menos duas almas (a curial-conservadora e a progressista) e, consequentemente, duas linguagens, desde o início ou, melhor, desde a fase preparatória. As duas linguagens e as duas almas das quais elas brotam passam reconhecidamente nos documentos conciliares, às vezes limitando a sua força renovadora.
Assim, o Concílio, segundo uma tendência infelizmente muito enraizada nos homens da Igreja também no magistério, parece sinceramente aberto a "inovar", mas não disposto a renunciar a nada. Quer-se introduzir um novo modo de ser Igreja, uma nova práxis, uma nova ministerialidade, um novo sentido do mistério de salvação, sem renunciar ao que obstrui o terreno e impede a reconstrução, sem nunca dizer explicitamente que certas coisas eram inoportunas, ou equivocadas, ou culpadas.
Mesmo para subir simplesmente uma breve escada, em um certo ponto, depois de ter apoiado um pé no degrau que está acima, não se pode deixar de tirar o outro pé que está embaixo. O risco é de permanecer sempre oscilantes entre o de cima e o de baixo, imóveis ou quase.
Assim, pode acontecer que se reencontrem contradições significativas entre um documento e outro: no que se refere à configuração eclesial dos leigos, uma grande distância parece separar as aberturas bíblico-teológicas de certas páginas das grandes constituições conciliares, com a ideia do sacerdócio universal dos fiéis e da dignidade sacerdotal-profética-real do povo de Deus (embora redimensionada por outras páginas de tom mais cauteloso e tradicional) do decreto Apostolicam actuositatem, que devia traduzir em formas eclesialmente visíveis e em indicações concretas as grandes intuições da ala progressista do Concílio e, ao contrário, parece amortecer e mortificar um pouco a novidade teológica.
A ideia de fundo é que o espaço próprio dos leigos é a santificação ou animação cristã das realidades terrenas, dos ambientes de vida e de trabalho; evidentemente contraposto à tarefa de evangelizar e ao munus sanctificandi sentido como próprio pela hierarquia da Igreja. Hoje, felizmente, parece que essa ideia é cada vez mais posta em discussão; mas, de tempos em tempos, ela reaflora, principalmente em textos e discursos de caráter pastoral.
Cristãos de segunda categoria
A santificação das realidades terrenas, embora a expressão possa soar gratificante ao ouvido, é ideia ambígua e perigosa, porque tende a reiterar (ainda mais com um estilo menos duro e desagradável do que o tradicional, que, por isso, torna a insídia menos perceptível) a dicotomia medieval: "duo sunt genera christianorum", isto é, os clérigos destinados à transcendência, profissionais do sagrado; os leigos, adeptos às realidades terrenas, portanto, massa indiferenciada e profana.
O Código de Direito Canônico de 1983, que substitui o de 1917 e deveria ter recebido a novidade do Concílio também nas normas que regulam a vivência eclesial, os cânones referentes aos leigos se encontram no livro II (De populo Dei), parágrafo I (De christifidelibus), em particular, cânones 224 e seguintes.
Entre os mais interessantes, o cânone 225, que lembra que os leigos, sozinhos e associados, têm o dever de levar ao mundo o anúncio da salvação (§ 1) e o dever de animar em sentido cristão, sobretudo através do testemunho, as realidades temporais (§ 2); o cânone 226 lembra que os leigos cooperam com a edificação do Reino através do matrimônio e da família (§ 1) e a educação cristã dos filhos (§ 2). No cânone 228, diz-se que os leigos idôneos podem assumir encargos eclesiásticos (§ 1) e também atuar como peritos e conselheiros, se possuírem os requisitos devidos (§ 2).
Tudo isso também pode parecer rico e satisfatório, se comparado com o que havia antes. Não é certo, porém, que responda plenamente às exigências e à consciência eclesial de um crente adulto. No entanto, a maior parte dos leigos ignora esses aspectos, que, exaltantes ou não, fundamentam o seu ser na Igreja. Além disso, a maior parte dos leigos que frequentam a Igreja e as igrejas, no sentido de lugares de culto, ao longo dos séculos, interiorizaram um modo clerical de perceberem a si mesmos. Exceto aqueles que tiveram a oportunidade de fazer um caminho pessoal de crescimento na fé, de aprofundamento, de experiência comunitária; mas certamente não são uma maioria significativa, estatisticamente falando.
Os outros, habituados através dos séculos, habituados sem refletir a respeito, sem sofrer por causa disso – ou, ao menos, sem terem consciência do seu sofrimento –, a serem implicitamente considerados e definidos como cristãos de segunda categoria, cristãos de meio turno, de vida "imperfeita mas autorizada", de pertencimento limitado, de nível inferior, de nenhuma efetiva autoridade... persuadiram-se pacificamente de que são tais coisas; acima de tudo, interiorizaram a ideia de que as coisas da Igreja não dizem respeito a eles.
(Continua...)
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Falando como leiga. Artigo de Lilia Sebastiani - 1ª parte - Instituto Humanitas Unisinos - IHU