Por: Jonas | 25 Mai 2012
Na segunda-feira (21/05), na Assembleia Nacional Francesa, ao lado de Jean-Luc Mélenchon e ontem (22/05), em Berlim, com os líderes do Die Linke. O líder da esquerda grega, Alexis Tsipras, apresenta a sua ideia de “refundar a Europa”. Quem tem sido rotineiramente rotulado como perigoso radical, e populista pela imprensa alemã, compareceu sem os chifres e o rabo, habitualmente colocados pela grande imprensa, com uma mensagem de tranquilidade ao povo alemão: “passem as férias na Grécia”.
A reportagem é de Rafael Poch, publicada no sítio La Vanguardia, 23-05-2012. A tradução é do Cepat.
Até agora, neste ano, o número das reservas turísticas de alemães, na Grécia, caiu 25% ou 30%. Desde as eleições, do dia 6 de maio, segundo fontes do setor mencionadas pela Der Spiegel, esse número caiu 50%. No ano passado, dois milhões e meio de alemães visitaram a Grécia, local onde o turismo representa mais de 15% do PIB e emprega, direta ou indiretamente, mais de 750.000 gregos.
“Somos como uma grande família e estaremos encantados em receber nosso irmão maior”, disse Tsipras, um líder esperto e carismático. Sua turnê pela Europa faz parte de sua campanha eleitoral, para as eleições do dia 17 de junho. Tsipras aproveita-se do efeito Hollande, monta sobre o desgaste político de Merkel, sobre as sérias incertezas da Espanha e da Itália e até sobre o espírito da última cúpula de Camp David. Seu partido, Syriza, na última pesquisa alcançou 28% dos votos.
A Grécia é um labirinto sem saída, dizia um jornalista heleno. O Syriza oferece uma saída. Sem dúvida, complicada, mas uma saída, uma esperança: a refundação da Europa. Por isso é que muita gente, que não é de esquerda, agora pode votar em Tsipras, cujo partido já venceu, no dia 6 de maio, nas três principais cidades gregas: Atenas, Pireu e Tessalônica, locais em que as pessoas estão mais informadas e sofrem mais a crise do que em relação ao campo.
“Se ganhar as eleições, deverá sair do euro”, disseram-lhe alguns jornalistas, muito diferentes daqueles de segunda-feira, em Paris. Porém, Tsipras, e quase 80% dos gregos que votaram pelas opções europeístas, não querem deixar o euro, mas mudar os termos da questão.
“O resgate da Grécia é um resgate de bancos”
“A austeridade não é o pilar da Europa, o pilar é a democracia e o direito do povo decidir”, ele disse. Os planos de resgate “não são para a Grécia, mas para os bancos”. E os números apoiam essa afirmação: 93 bilhões para remover os credores privados, 35 bilhões em garantias de bônus, depositados no BCE, 23 bilhões para a recapitalização dos bancos gregos, 30 bilhões em incentivos para a troca de bônus velhos por bons... O que isso tem haver com os gregos? Por que os alemães devem jogar seu dinheiro num poço sem fundo de salvação dos bancos? Necessitamos de uma solução comum, para um problema comum, o racha não é entre nações, mas entre cidadãos e setor financeiro”, disse o político grego.
O discurso de Tsipras foi tranquilo, nada estridente. A Grécia espera fraternalmente, e com os braços abertos, o turismo alemão, porém, “não somos inquilinos da zona do euro, somos membros dela e ninguém deve atuar como seu proprietário”, disse. “A rejeição à catastrófica receita de austeridade (cinco anos de recessão, uma queda da renda média em 25% e um acréscimo da dívida, apesar dos rigorosos sacrifícios, de 120% do PIB, em 2010, até os atuais 170%) não é a condição de pertencimento a Europa”. É uma “condição para nossa recuperação, para que possamos pagar as dívidas”, disse.
Em relação às reformas necessárias na Grécia, “primeiramente, é que não podem ser aplicadas se não cessar a queda livre de nossa economia”. O rigorismo mais impede do que favorece as reformas. O segundo requisito é destronar a classe política que, durante décadas, administrou de forma tão desastrosa e corrupta as contas do país, ou seja, o Pasok e a Nova Democracia, aliados de Merkel e da Comissão Europeia. “Diferente do que se diz, nosso setor público não é muito grande, mas tem sido mal administrado”, opina Tsipras. Uma mensagem de renovação, regeneração e de mudança.
A necessidade está tornando os gregos audazes. A necessidade e também a miséria manifestamente sem saída, destes últimos anos. Com apenas mais um país e meio, nesta situação, a refundação do continente deixaria de ser utopia. Bastaria que Espanha e Portugal, ou Itália, se somassem, num discurso parecido, para que o medonho pacto fiscal de Merkel – por que um limite de déficit estrutural de 0,5% e não de 1,5%, por que sansões a quem ultrapassa 3% e não 4% ou 5%? Por que os ajustes em um ou dois anos e não em quatro ou cinco? – fosse para os ares.
Alemanha manca e lenta
Hoje (23/05), acontece em Bruxelas a primeira cúpula de chefes de governo, desde a vitória de François Hollande na França. Será uma reunião informal, um primeiro encontro do qual não se esperam resultados. Qual é a expectativa?
“Acredito que as pessoas são capazes de reconhecer erros e de mudar”, disse Tsipras. “Depois da derrota de Sarkozy, na Europa se pode falar de eurobônus, de créditos para projetos, de tudo o que já se tem falado em Camp David”, disse.
Em Bruxelas, “todos os temas estarão sobre a mesa, inclusive aqueles sobre os quais não se pode alcançar um acordo em médio prazo”, disse na segunda-feira, em Berlim, o novo ministro de finanças de Hollande, Pierre Moscovici. Ele se referia aos eurobônus e ao “sancta sanctorum”: a reforma do BCE, uma instituição a serviço do banco privado e do rigorismo alemão, que caminha para o afundamento do euro. Que o único membro espanhol do conselho dessa instituição torta e desestabilizadora, José Luís González Páramo, sonha como próximo governador do Banco da Espanha, o que diz tudo.
O governo alemão está nervoso porque sente que o terreno cada vez mais movediço. Merkel voltou mancando, ontem (22/05), dos Estados Unidos. Com a queda do governo holandês e a ascensão do Socialistische Partij (SP), prenunciado pelas pesquisas, perde o principal aliado de seu rigorismo, na Europa, mas a mudança de atitude alemã é muito lenta. Muito mais lenta do que o turbilhão, econômico e político, que rodeia o euro e o pacto fiscal.
Se a eleitoreira atitude de Merkel com o primeiro resgate aos bancos devido à dívida grega, em março de 2010, custou muito caro, agora essa lentidão parece suicídio, para as eleições alemãs de 2013. O tédio alemão e o coquetel das pesquisas sobre o desapego dos alemães em relação à moeda única é uma comédia ruim: sem o euro, a exportação alemã perderia um pilar estratégico fundamental.
A Alemanha quer tirar a Grécia da zona do euro? Faz tempo que o ministro Schäuble disse que “estamos melhor preparados para esse cenário do que antes”. Ele tem razão, a diferença, em relação há dois anos, é que a Alemanha transferiu para o BCE uma boa parte de seu risco com a dívida grega. Porém, assim mesmo, não está nada claro que tal saída não acometa males maiores para o euro, em seu conjunto, e para a própria Alemanha em particular. Politicamente seria um desastre e um agravamento.
Porém, a relação franco-alemã já é outra e as coisas mudaram. “Sem uma forte relação e confiança entre França e Alemanha nada é possível”, disse Moscovici em Berlim, “mas, inclusive, o acordo entre França e Alemanha não significa que os outros também concordem: é necessário prestar atenção nos demais, na Comissão Europeia”, acrescentou.
Seu colega alemão, Wolfgang Schäuble, apenas começa a falar dos “desequilíbrios internos na zona do euro” acentuados pelo êxito da estratégia nacional-exportadora alemã, nos últimos quinze anos. O exitoso superávit da Alemanha foi o déficit para os demais. A Alemanha se esqueceu de que faz parte de um conjunto interligado. Agora, com anos de atraso e com a água chegando ao pescoço, se começa a falar disso. A Alemanha segue devagar e a crise do euro rápida.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“Passem suas férias na Grécia”, diz Alexis Tsipras, em Berlim - Instituto Humanitas Unisinos - IHU