18 Abril 2012
Acreditar é uma atitude absolutamente necessária para ter acesso ao amor, porque só o crer no outro pode instaurar a verdadeira comunicação, a comunhão, o amor recíproco.
A reflexão é do monge e teólogo italiano Enzo Bianchi, prior e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado na revista Jesus, de abril de 2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Devemos nos perguntar quanto a atual dificuldade de crer não depende de um clima de progressiva desconfiança dos outros, da situação social e econômica, do próprio futuro. Fé, de fato, é pôr a confiança, confiar, é uma atitude geral da pessoa: por isso, as dificuldades para crer se enraizam profundamente, nas próprias dificuldades da tarefa de viver. A fé, o acreditar é uma realidade antropológica fundamental, constitutiva da existência humana, assim como a razão e a linguagem: é um ato da liberdade do ser humano, tanto que podemos afirmar que não pode haver autêntica humanização sem fé.
Em outras palavras, não podemos ser homens e mulheres sem crer, porque crer é o modo de viver a relação com os outros. E não é possível nenhum caminho de humanização sem os outros, porque viver é sempre viver com e através do outro. Como seria possível viver sem confiar em alguém?
Diferentemente dos animais, nós saímos incompletos do útero materno e, para crescer como pessoas, para adquirir uma subjetividade, precisamos de alguém em que colocar a fé-confiança. De fato, desde a sua vida intrauterina, o nascituro põe a confiança na sua mãe, crê nela para ela quando ela, para ela, ainda não é nada mais do que uma matriz. Desde o seio de sua mãe, ele crê na vida da qual se sente vivendo, crê na mãe que o leva no útero, está como que habitado por uma promessa, a de poder ter acesso a uma vida em plenitude.
Tudo isso, certamente, não na ordem da inteligência – por mais que saibamos disso hoje –, mas na ordem do instinto e do desejo. É assim que a criança se abandona, confia na mãe e, uma vez saído do útero, ainda buscará essa referência, continuando a confiar na mãe. Desse modo, ele tomará consciência da sua condição humana, será ajudado a "vir ao mundo" precisamente pela confiança depositada em sua mãe.
Mesmo apenas essa experiência "fontal" nos revela que, na nossa história humana, não é possível crescer sem ter confiança em alguém, na mãe, sobretudo, e, depois, mais em geral, em ambos os pais.
Quando se fala de fé, é preciso, portanto, evitar pensar imediatamente no crer em verdade, em dogmas, mas compreender fé sobretudo como aquele ato que consiste em pôr o pé no lado seguro (cf. Sl 20, 8-9; 125, 1; Is 7, 9), em confiar como uma criança agarrada ao seio de sua mãe (cf. Is 66, 12-13), segura em seus braços (cf. Sl 131, 2). Crer, ter fé é uma operação humana. É, acima de tudo, "acreditar no amor" (cf. 1Jo 4, 16), isto é, tender àquela realização plena de si mesmo que é dado por uma vida em que se ama e se é amado: essa é a única promessa que está diante de todos os homens e mulheres enquanto tais.
Acreditar é uma atitude absolutamente necessária para ter acesso ao amor, porque só o crer no outro pode instaurar a verdadeira comunicação, a comunhão, o amor recíproco. Assim, voltando à imagem usada anteriormente, entendemos como é decisivo para a criança que cresce e se humaniza o fato de que alguém acredita nela e que ela pode colocar a fé em alguém. Se isso não acontecer, ela estará ameaçada até na operação de acreditar em si mesma.
A dinâmica do crer se expressa no ser humano através de caminhos em que se confiam uns nos outros, ativando a reciprocidade do crer. Mas nada é mais precário do que o ato de acreditar. E quando a fé, o crer se torna frágil, então a própria humanização está ameaçada. O crer no outro é uma operação da pessoa, mas também da coletividade, que deve ser capaz de acreditar, de ter confiança.
Quando os seres humanos acreditam nos outros, a sua ação assume as características da fraternidade, da corresponsabilidade, do amor, porque eles creem no amor. Uma história de amor entre um homem e uma mulher, por exemplo, só é possível quando um crê no outro. É significativo que, tempos atrás, em uma história de amor, nos sentíamos primeiro namorados, isto é, pessoas que dão e recebem fé [jogo de palavras com fidanzato, namorado em italiano, e fé]. Depois, a história de amor avançava com um anel, o anel da aliança, chamado, não por acaso, “fé”.
Da mesma forma, quando se acolhe um novo bebê que irá alimentar os pais com a sua presença e os ajudará a crer na vida e no futuro, faz-se uma operação de fé. Sem o nascimento de novos homens e mulheres que sucedem aqueles que os precedem, a humanidade iria rumo à sua ruína natural. Sim, sem essa fé humana, não há humanização.
Eis por que a psicanalista e filósofa Julia Kristeva pôde intitular um texto seu como "Esta incrível necessidade de crer". É na capacidade de crer que se joga o futuro da humanidade!
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O futuro da humanidade se joga na capacidade de crer. Artigo de Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU