11 Novembro 2011
Como vão ser as relações entre o Governo e a hierarquia católica depois da eleição da nova direção do episcopado encabeçada pelo arcebispo de Santa Fe José María Arancedo? Formalmente, não haverá mudanças: em ambos os lados se continuará falando de "normalidade", "institucionalidade", "cordialidade". A mesma coisa em relação aos temas que serão debatidos. É isso que indicam também as respostas da maioria dos consultados de um lado e de outro. Nas questões substanciais, nos acordos e nas diferenças de fundo, não se deve esperar maiores novidades.
A reportagem é de Washington Uranga e está publicada no jornal argentino Página/12, 10-11-2011. A tradução é do Cepat.
Os acordos? Autonomia entre Estado e Igreja, embora respeitando a tradição histórico-cultural-religiosa do país que impõe inclusive alguns marcos de referência. Começando pelo mandato constitucional que indica que o Estado argentino financia a religião católica. Mas também com um Estado que diariamente reconhece mais a pluralidade religiosa existente no cenário nacional.
Haverá coincidências para continuar colaborando em temas sociais. As substituições de Jorge Lozano por Jorge Casaretto na Pastoral Social e de Oscar Ojea por Fernando Bargalló na Cáritas Argentina garantem uma mesma linha de pensamento e ação. Colaboração entre o Governo e a Igreja em temas sociais é algo que se vem verificando desde o começo da gestão de Néstor Kirchner, fundamentalmente através do Ministério do Desenvolvimento Social, comandado por Alicia Kirchner, e do Ministério de Planejamento Federal, encabeçado por Julio de Vido, neste último caso mediante a participação da Cáritas na execução de planos de moradia. Este trabalho conjunto se manteve inclusive nos momentos em que Igreja e Governo apareceram mais distanciados publicamente.
Em geral se pode dizer que na frente social da Igreja ficou estabelecido claramente a marca de um estilo forjado ao longo de anos pelo bispo Jorge Casaretto. Faltando pouco para encaminhar seu pedido de renúncia por atingir os 75 anos, o bispo de San Isidro pode ver com satisfação que seus pares reafirmaram esse modo de ação pastoral escolhendo para os cargos chaves bispos que seguramente continuarão com a mesma linha de trabalho.
Os desacordos? Os já conhecidos temas sobre "a vida", de acordo com a linguagem eclesiástica. Oposição eclesiástica a qualquer legislação favorável ao aborto ou à eutanásia... E um que persiste como obstáculo permanente na relação, mas sobre o qual ambas as partes preferem no momento não fazer maior referência: a intenção do Governo de eliminar a diocese castrense e os capelães militares e a oposição do Vaticano de aceitar uma reforma nesse sentido. Os bispos não deixarão de insistir sobre a situação social e de demandar soluções para o tema da pobreza. Mas é certo que isto não tem nada a ver com esta administração em particular. Quase se pode dizer que é sua pregação permanente.
No alvo episcopal também está o que eles chamam de "institucionalidade democrática". Estarão muito atentos à evolução da situação política e ao funcionamento dos poderes do Estado. Bergoglio mexia constantemente este tema. Arancedo, que foi vice-presidente na gestão anterior, não ficará atrás.
O que mudará então? É provável que mude o estilo da relação, basicamente porque as personalidades de Arancedo e de Bergoglio são diferentes. O cardeal é um homem sumamente reservado, às vezes hermético. Isso não significa que não mantenha uma ativa vida de relações políticas e institucionais, mas sempre em ambientes reservados. Arancedo tem outra forma de comunicação e, pelo menos até o momento, uma grande disposição para o intercâmbio franco de ideias e opiniões. A isto se soma a presença do novo bispo de Neuquén, Virginio Bressanelli, como primeiro vice-presidente. O bispo recebeu muitos apoios (inclusive em um momento pôde disputar a presidência com Arancedo) e isso o potencia também no interior do corpo. Bressanelli tem uma trajetória pessoal que o caracteriza como uma pessoa de firmes convicções, de grande inteligência e capacidade, e também de perspectiva dialogal.
Qual será a influência de Bergoglio? Embora o cardeal insista em assinalar que deve "descansar" e que agora poderá fazer algumas coisas que vinha protelando, não há dúvida de que sua experiência e prestígio pessoal, o fato de que muitos dos que hoje são bispos tenham sido indicados por ele para essas responsabilidades e sua administração como arcebispo de Buenos Aires (que se estenderá ainda por alguns anos), convertem-no em um homem de referência permanente em todas as decisões que forem tomadas. Além disso, porque um de seus colaboradores diretos, o bispo Enrique Eguía, continuará na Secretaria Geral da CEA.
Também é certo que as eleições da Conferência Episcopal podem ser lidas como uma reafirmação da primazia dos setores moderados. Isso transparece das nomeações. Mas também o fato de que os mais conservadores não obtiveram a presidência de nenhuma comissão, salvo a ratificação em seu cargo como presidente da Educação Católica do arcebispo de La Plata, Héctor Aguer. Mario Cargnello, segundo vice-presidente, será o canal mais procurado pela ala conservadora para fazer chegar suas posturas e reivindicações à Comissão Executiva.
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Mudanças na direção do Episcopado argentino. O que muda e o que não? - Instituto Humanitas Unisinos - IHU