26 Junho 2011
Atiradores de pedras tomaram as ruas de Dakar, capital do Senegal, na última quinta-feira, para protestar contra o que eles viam como uma tentativa de tomada de poder de um dos baluartes democráticos de África, forçando o presidente a recuar.
A reportagem é de Adam Nossister, publicada no jornal The New York Times, 23-06-2011. A tradução é de Anne Ledur.
Bombas de gás lacrimogêneo disparadas pela polícia estalavam pelas ruas, uma massa de centenas de pessoas se concentrou em frente à Assembleia Nacional em um jogo de gato e rato com as forças de segurança, e as vias públicas foram obstruídas por pedaços de concreto. Mas, no final da tarde, com a notícia de que o presidente Abdoulaye Wade cancelara sua proposta de mudança constitucional – que muitos na multidão denunciavam como "monárquica" –, os manifestantes deixaram escapar uma enorme vibração.
A agitação na quinta-feira foi ainda mais surpreendente por ter acontecido em um país do oeste africano, onde o poder nunca foi tomado em um golpe, uma raridade na região. O Senegal, uma pequena nação costeira dependente da pesca, da agricultura e da ajuda externa, continua sendo um dos poucos países onde a presidência é controlada pacificamente com a oposição após eleições consideradas legítimas, e sua estabilidade incomum a tornou um ímã para agências internacionais e empresas na África Ocidental.
Mas os manifestantes – incluindo membros do partido de oposição e seus líderes, bem como jovens dos subúrbios pobres e pessoas de classe média furiosas com cortes de energia prolongada – disseram que o recorde de democracia do país é usado por Wade como forma de permanecer no poder. O presidente, de 85 anos de idade, quer tentar um terceiro mandato no próximo ano.
No final, a multidão se retirou rapidamente, outro sinal do incomum status do país perante os vizinhos, onde os líderes têm sido muito mais lentos para atender a voz dos protestos.
"Isso prova, mais uma vez, que a mobilização do povo é uma formidável fonte de democracia", disse um dos líderes do protesto, o ex-primeiro-ministro Moustapha Niasse, sentado com outros líderes no meio da densa multidão.
"A Primavera Africana começará aqui no Senegal", disse Ousmane Tanor Dieng, secretário-geral do Partido Socialista, de oposição.
A multidão gritava repetidamente: "Renuncie! Renuncie!"
Os manifestantes criticaram a proposta de Wade de diminuir o limiar de vitória para apenas 25% dos votos no primeiro turno. Eles argumentaram que a mudança seria praticamente garantir sua reeleição. Eles também se opuseram à proposta de eleger uma vice-presidência na mesma cédula. Líderes da oposição argumentaram que essa medida seria um subterfúgio para instalar na presidência o filho de Wade, Karim Wade, um ministro poderoso do governo, já que isso permitiria uma transferência de poder.
Enquanto membros do partido de Wade no Parlamento – ele detém maioria na Assembleia – debatiam o que fazer na quinta-feira à tarde, os manifestantes andavam por uma praça à beira-mar no centro da cidade, denunciando o que viam como uma ameaça.
"Nós estamos simplesmente tentando impedir o partido do poder de tomar a nossa Constituição como refém", disse Rashid Dieme, professor. "Ele está, obviamente, tentando limpar o caminho para sua reeleição."
O ministro-conselheiro de Wade, encarregado dos assuntos religiosos, Bamba Ndiaye, disse que o presidente, descartando o plano, escutou as ruas nessa quinta-feira.
"Ele respondeu às expectativas das pessoas", disse Ndiaye. "Reagindo a esse pedido do povo, o presidente da república decidiu sabiamente retirar a sua proposta".
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Após protestos, presidente do Senegal volta atrás quanto a mudanças em eleições - Instituto Humanitas Unisinos - IHU