10 Mai 2011
O jornal Folha de Dourados (6 a 12 de maio) em suas manchetes e textos mostram um pouco do que se passa nessa prospera cidade de quase 200 mil habitantes, no cone Sul do Mato Grosso do Sul. Comenta as agruras de membros de uma ilustre família política de ex-prefeito, ex-vereador e deputado estadual "A misteriosa prisão do Bin Laden douradense".
Na fazenda da família, que em parte fica dentro de uma terra indígena, cuja portaria declaratória foi assinada recentemente pelo Ministro da Justiça, o Grupo Especializado de Repressão ao Crime encontrou várias armas numa das fazendas. (pg 5) Destaca ainda o referido jornal a 47ª. Expoagro, no coração do agronegócio, onde os organizadores esperam movimentar 84 milhões. Uma das bandeiras nessas exposições é contestação dos processos de reconhecimento das terras indígenas. Conforme o presidente do Sindicato Rural de Dourados, "essa questão não vai acabar tão cedo, estamos atentos e mobilizados". Em outra página destaca que vereadores de Dourados foram cassados, na década de sessenta, por serem comunistas.
O artigo é de Egon Heck, coordenador do CIMI-MS.
Enquanto isso repercute na imprensa regional a situação de extrema violência na Terra Indígena Dourados, que é 800 vezes maior que a media nacional. Vários encontros tem sido promovidos pelo Ministério Público Federal, mas até o momento nenhuma ação efetiva foi tomada. Anastacio Peralta Kaiowá, da Comissão Nacional de Política Indigenista, afirma que a polícia não está presente nas áreas indígenas por que não existe uma efetiva política de segurança pública para os povos indígenas.
Primeira Vila Olimpica em Terra Indígena
Ao mesmo tempo o jornal estampa o convite para a inauguração da Vila Olímpica na Terra Indígena Dourados. Há quem afirme ser a única no gênero dentro de terra indígena, em todo o país. Logo na área que tem se notabilizado pelo altíssimo índice de violência, em decorrência, em grande parte pelo confinamento dos mais de 13 mil indígenas de três povos – Kaiowá, Guarani e Terena, vivendo em 3.500 hectares de terra.
A obra, que segundo o jornal, custou mais de um milhão e meio de reais, teve uma rápida cerimônia de inauguração, neste dia 9 de maio. Conforme alguns, trata-se de mais uma das várias inaugurações que a mesma obra já teve. Aliás, mais parecia um comício de não índios. Com a diferença de que quem serviu de saco de pancadas foi a Funai, que nas palavras iradas do governador André Puccineli "A Funai apenas quer ter a reserva de mercado dos indígenas. Ela não faz e nem deixa fazer. Que a Funai nacional tenha vergonha na cara e dê condições de trabalho, sem tutelar..."Em tom ufanista declarou que "não houve governo que mais fez do que do que o meu", e desfilou uma ladainha de números, destacando as 14.557 cestas básicas que distribui, aumentando de 22 para 26 quilos, das inúmeras casas, escolas construídas, patrulhas mecanizadas..." O governador terminou sua catilinária dizendo "Que deseja integrar os índios a partir do conceito de produção, para dar a eles a verdadeira independência".
No fundo do ginásio seu Getulio, importante liderança da aldeia Bororó demonstrou sua indignação com o evento "Nenhum Kaiowá foi convidado para estar lá na frente. Se aqui tivessem feito uma oga pysy – casa de reza, seria muito melhor...Kaiowá é mbaretê – forte, vamos continuar nossa luta com nossas Aty Guasu." E terminou com ironia "Se fosse falar de terra aqui seria perigoso cair no chão".
"A Vila Olímpica Indígena de Dourados poderá propiciar uma nova fase na vida da população indígena, oferecendo um espaço nobre para a prática de esporte e lazer, como alternativa à violência e criminalidade dentro da Reserva Indígena", afirma o deputado Rezende, um dos agenciadores da obra.
Formatura da 3ª. turma do Ará Verá sem Rolindo.
Na mesma Câmara dos vereadores, onde tantos escândalos foram revelados ultimamente, se realizou a formatura do Magistério Indígena Ará Vera. Porém foi sentido uma falta que representa a posição e compromisso com a vida e luta do povo Kaiowá Guarani. Rolindo Vera, sumido e possivelmente executado no inicio de novembro de 2009, quando estava com seu povo do Ypo’i na retomada de sua terra tradicional, se transformou, juntamente com Genivaldo, também assassinado nesta ocasião, em símbolo e paradigma dos professores Kaiowá Guarani. Nesta mesma casa, há duas semanas foi aprovado o projeto que institui a "Semana dos Povos Indígenas de Dourados", que, conforme seu propositor, o vereador Elias, será uma forma de garantir apoio e recursos do município para as atividades culturais e esportivas que as comunidades indígenas do município vierem a programar, juntamente com a prefeitura.
Assembléia da CNBB e os índios
Como vem acontecendo nas últimas décadas, a questão indígena foi colocada de forma contundente, em toda sua dureza e violência, pelo presidente do Cimi, Dorm Erwin Kräutler nesta 49ª Assembléia Geral da CNBB. Em seu pronunciamento, mais uma vez teve destaque a dramática situação dos Kaiowá Guarani: "De acordo com estes levantamentos, o Estado de Mato Grosso do Sul tem sido recordista em violências contra os povos indígenas. Ali as comunidades indígenas são obrigadas a viver em beira de estrada, são frequentemente expulsas de seus acampamentos, têm suas barracas e pertences queimados e seus líderes assassinados. Cerca de 50% dos assassinatos de indígenas ocorre naquele Estado. De acordo com recente informação do Ministério Público Federal, na terra indígena de Dourados, constituída de três mil e seiscentos hectares, nos quais vivem, em situação de confinamento, mais de 12 mil indígenas, o índice de homicídios é 800% maior que a média nacional. Esta prática de violência contra os povos indígenas no Mato Grosso do Sul, especialmente em relação ao povo Guarani Kaiowá, não deixa de ser um genocídio.
A omissão em relação ao intenso processo de violências enfrentadas pelos Guarani-Kaiowá é talvez o elemento mais significativo da falta de interesse do Governo Federal pelos povos indígenas. Os abusos contra este povo têm sido denunciados pelo Cimi e por outras organizações de defesa dos direitos humanos e indígenas no Brasil e em nível internacional. Entretanto, mesmo assinando um Termo de Ajustamento de Conduta, no qual a Funai se comprometeu, em 2008, em realizar os estudos de identificação e delimitação de terras de ocupação tradicional indígena naquele Estado, até o presente momento o órgão indigenista está omisso. A demarcação das terras poderia evitar a morte de centenas de pessoas do povo Guarani-Kaiowá".
D. Erwin em diversas ocasiões tem reafirmado que a situação dos Kaiowá Guarani é das mais graves que ele já viu em toda sua vida. Comovido por essa realidade e está cobrando providencias das autoridades responsáveis, em todos os lugares por onde está passando.
D. Dimas, novo arcebispo de Campo Grande
Os Guarani e seus aliados ficaram muito felizes com a nomeação do novo arcebispo de Campo Grande. Dom Dimas esteve em março de ano passado visitando vários acampamentos do povo Guarani no cone Sul do Mato Grosso do Sul. Naquela ocasião, juntamente com D. Erwin, presidente do Cimi, pode sentir um pouco da dor e injustiça de que são vítimas os mais de 40 mil indígenas deste povo. Nesta ocasião se comprometeu de levar essa realidade às esferas do governo (presidente da República, Ministro da Justiça...) e pedir providencias urgentes, especialmente com relação à demarcação das terras. Também se comprometeu a dar visibilidade a essa realidade, promovendo um debate a respeito nas emissoras católicas de TV.
D. Dimas voltou a Dourados, pouco tempo depois, para pregar um retiro para o clero local. Esse conhecimento da grave situação e dos conflitos existentes nessa região certamente serão parte de sua ação de pastor em Campo Grande e no regional Oeste 1 da CNBB. Isso ele manifestou em seus primeiros pronunciamentos e entrevistas à imprensa regional.
Volta do Acampamento Terra Livre
Em torno de 80 representantes do Mato Grosso do Sul participaram do Acampamento Terra Livre e do Encontro sobre as terras em conflito, em Brasília. Ao retornarem a suas aldeias, foram unânimes em destacar o importância dessa mobilização indígena nacional. Porém evidenciaram que lá foram para lutar pelos seus direitos, especialmente à terra. Isso deixaram bem claro nos documentos que levaram, tanto em nome da Aty Guasu, como das diversas comunidades em luta pela terra. Por essa razão expressaram seu descontentamento com aqueles que tentaram direcionar os debates apenas para a troca de presidente da Funai.
Voltaram animados por sentir que sua luta continua sendo uma luta assumido como prioridade pelo movimento indígena brasileiro. Porém esperam gestos concretos dessa solidariedade, assim como tem acontecido por vários anos com a Raposa Serra do Sol, em Roraima.
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