02 Mai 2011
"A Aty Guasu de Arroyo Korá, foi um momento intenso de debate, celebração, danças, rituais, festa, chicha, alegria. Mais de 400 participanates de 33 comunidades-aldeias e acampamentos Kaiowá Guarani do Mato Grosso do Sul. Conforme Antonio Brand, essa foi uma das Aty Guasu com mais "mbaraká" de que tem conhecimento nos últimos anos. Ou seja um grande número de lideres religiosos fazendo ecoar forte seus desejos e pedidos, especialmente de terra e paz. Ficou claro que a opção que lhes resta é lutar com todas as forças, unidos e com o apoio de sempre mais aliados.
No documento final fazem novamente o apelo às instâncias dos tres poderes para que garantam os seus direitos, para que possam enfrentar essa situação de extrema violência e mortes.
Houve uma intensa participação de todos, com articulações para as ações dos diversos acampamentos e movimentos de luta pelos seus direitos. O lançamento do video "A Sombra de um Delirio Verde", com a presença de um dos autores do documentário, Cristiano Navarro, foi um momento importante", escreve Egon Heck, coordenador do CIMI-MS ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
Eis o artigo.
Getulio, líder religioso, inicia o último dia da 2ª Aty Guasu de Arroyo Korá (27 a 30 de abril) com a narração de uma mensagem que Nhanderu (Grande Espírito) havia revelado naquela noite. "As estradas estavam fechadas. Ficara para traz um cavalo vermelho". A revelação trazia bastante preocupação. As estradas fechadas significavam grandes obstáculos para a vida dos Kaiowá Guarani. O cavalo vermelho, que ficara para traz significava perigos para as lideranças indígenas e para os seus aliados e apoiadores. Após falar dessa mensagem forte que havia recebido, disse "mas nós nhanderu-caciques, rezadores, vamos abrir os caminhos". Era a força Kaiowá Guarani, a partir de sua religiosidade, cultura e organização, que iriam enfrentar os inimigos e remover os obstáculos.
E a Grande Assembléia já era o início desse enfrentamento dos grandes inimigos e obstáculos: o poder econômico e político, que continuam negando aos Guarani Kaiowá o direito às suas terras, a repressão à volta a seus tekohá, os agrotóxicos envenenando a terra e as águas; a violência que vai invadindo as aldeias, especialmente com o alcoolismo e drogas, aumentando os conflitos internos, brigas e mortes; a fome e a dependência da cesta básica; o descaso com a saúde por parte da Funasa; a ineficácia da Funai na proteção e garantia dos seus direitos ; o retrocesso na maioria das escolas indígenas, com a substituição de professores indígenas por não indígenas. Esses foram alguns dos graves problemas elencados, e que exigem muita união, organização e determinação para enfrentar.
A denuncia dessa situação ficou bem expressa no documento da Assembléia "Nós Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul, queremos dizer mais uma vez que nosso direito às nossas terras continua desrespeitado, gerando uma situação de violência sobre e em nossas comunidades está levando a uma situação que nós entendemos como a declaração de morte de nosso povo. Isso é um crime contra a humanidade, é um genocídio. Por isso exigimos novamente providencias imediatas dos três poderes para cumprirem suas obrigações com relação às nossas terras. Não queremos continuar sendo objetos de migalhas, enquanto pessoas e grupos nacionais e internacionais, como a industria da soja e da cana, que continuam ocupando e se enricando em nossas terras".
Para reconquistar as terras sagradas das quais foram expulsos e nelas reconstruir e garantir o teko – modo de viver Guarani, necessitam de muita força, união e reza. E foi isso que aconteceu nesses quatro dias da Aty Guasu. Um momento alegre e forte, de grande participação e busca dos melhores caminhos para enfrentar tão grandes desafios.
Por isso durante toda a noite fizeram seus rituais e danças. E antes mesmo do dia amanhecer as rodas de chimarrão iam animando mais um tempo de debate, celebração, alegria e indignação. As Aty Guasu conseguem ser um espaço para tudo isso.
No final houve indicações e escolha por unanimidade dos seus representantes em espaços nacionais da luta indígena. Eliseu Lopes foi eleito como representante na Articulação dos Povos Indígenas no Brasil – APIB. Também foram eleitos os representanes no Conselho Nacional de Segurança Alimentar – CONSEA, Delosanto Martins e para a Carteira Indígena, José Barbosa
O grande destaque nessa Assembléia foi a participação e iniciativas das mulheres Kaiowá Guarani. Após se reunirem separadamente, exigiram um tempo em que elas coordenaram a Assembléia para explicitar suas decisões e propostas. E a palavra das Kuña-mulheres ecoou forte e enérgica. Solicitaram maior participação no Conselho da Aty Guasu e decidiram fazer uma Aty Guasu das Kuña.
Também foi debatido a grave situação dos jovens indígenas. Estes, apesar de serem um número não muito grande, também se reuniram e levaram suas preocupações e exigências às lideranças Kaiowá Guarani. Eles são as maiores vítimas desse processo extremo de opressão e violência. O indicador mais claro disso é o alto índice de suicídios, assassinatos e prisões dos jovens. A droga e o alcoolismo se disseminam rapidamente entre eles. Porém eles estão decididos a se organizar, enfrentar todos esses problemas e se envolver na luta pelos direitos de seu povo, especialmente a recuperação das terras. Por isso também querem participar do Conselho da Aty Guasu e realizarem um grande encontro de jovens Kaiowa Guarani.
No final do encontro foram escolhidos novos participantes do Conselho, que fora criado em Arroyo Korá, há dois anos.
Após a benção e batismo dos documentos-kuatiá e das crianças, o pedido de proteção para a volta às aldeias e a delegação que seguiu para o Acampamento Terra Livre em Brasilia.
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