30 Abril 2011
Em quais elementos devemos nos deter para uma análise abrangente do pontificado de João Paulo II? Os documentos? As mensagens veiculadas pelas inúmeras viagens? A tipologia da multidão de santos e beatos canonizados? O episcopado ou ao cardinalato? A gestão das relações internas à Cúria ou com os chefes de Estado?
O monge e teólogo italiano Enzo Bianchi reflete sobre essas questões em artigo publicado no jornal La Stampa, 30-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Em vista da beatificação de João Paulo II, uma operação nada simples recebeu um novo impulso, inaugurada já imediatamente após a sua morte: a de fazer um balanço histórico e espiritual de um pontificado que não só durou mais de 25 anos, mas que atravessou um período histórico extremamente complexo e perturbador – basta pensar nos dois colapsos epocais: o Muro de Berlim e as Torres Gêmeas, ou, ainda antes, o atentado sofrido pelo Papa – e cujo protagonista tinha vivido, por sua vez, em primeira pessoa, o drama da Segunda Guerra Mundial e do Holocausto, o cativeiro comunista e o evento de graça do Vaticano II.
Em quais elementos devemos nos deter para uma análise abrangente? Os documentos de porte do Magistério, como as encíclicas? As mensagens veiculadas pelas inúmeras viagens? A tipologia da multidão de santos e beatos canonizados? As características e as orientações teológicas dos eclesiásticos nomeados para o episcopado ou ao cardinalato? A gestão das relações internas à Cúria ou das relações com os chefes de Estado?
Uma opção arriscada mas ao mesmo tempo frutífera foi a escolhida por Alberto Melloni – professor de história do cristianismo da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas de Bolonha – que identificou as Le cinque perle di Giovanni Paolo II [As cinco pérolas de João Paulo II] (Ed. Mondadori, 154 páginas), isto é, "os gestos de Wojtyla que mudaram a história", como diz subtítulo.
Escolha nada fácil, que o autor motiva eficazmente nas primeiras páginas do livro, e que o leva a isolar pedras preciosas para poder inseri-las no conjunto do pontificado wojtyliano de modo a permitir uma leitura luminosa, mas ao mesmo tempo destinada a durar muito além da atenção momentânea da mídia ligada à beatificação.
Nessas "pérolas", o fato de ter celebrado o Concílio como "a grande graça do século XX", a visita à sinagoga de Roma e o primeiro encontro das religiões em Assis pertencem ao biênio 1985-1986; o pedido de perdão pelos pecados cometidas pelos filhos da Igreja ao longo da história está no coração do Jubileu do ano 2000; enquanto a estrênua oposição à guerra se coloca já no período do progressivo declínio físico do Papa.
São cinco eventos que contêm, sim, uma forte cargo inovadora com relação ao passado, mas que, paradoxalmente, também revelam uma profunda continuidade com a grande tradição da Igreja e a sua capacidade de anunciar o Evangelho em um mundo em mudança.
Não por acaso, parece-me que a "pérola" chave que tem em si a capacidade de suscitar as outras é justamente a primeira: a valorização do Vaticano II mediante um "sínodo extraordinário" dos bispos, que reafirma a sua qualidade da mais alta expressão do magistério pontifício e, portanto, de critério à luz do qual é possível discernir para avaliar toda escolha subsequente, e não vice-versa. Não surpreende, então, que, nos outros gestos, reconstruídos e evidenciados por Melloni com sagacidade e copiosa documentação, a inspiração profundamente conciliar surja com particular evidência e seja explicitamente invocada pelo próprio Papa.
Verdadeiramente, são pérolas que "precisam ser narradas para serem compreendidas" e que mesmo aqueles que, como a nossa geração, tiveram o privilégio de vê-las resplandecer sob seus olhos, devem reler e reelaborar para saborear todo o seu porte evangélico, de modo a transmiti-las como tesouro precioso às gerações vindouras.
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As cinco pérolas de Wojtyla - Instituto Humanitas Unisinos - IHU