28 Fevereiro 2017
Não se sabe ainda se essa nomeação significa que o atual governo pretende abdicar da sua responsabilidade constitucional de demarcar as Terras Indígenas. Caso essa possibilidade se confirme, representaria uma postura inédita de omissão da administração federal, sem precedente histórico e sujeita a contestação no STF, escreve Márcio Santilli, sócio fundador do ISA, em artigo publicado originalmente no blog Justificando da Carta Capital, 24-02-2017.
Eis o artigo.
O governo confirmou a nomeação do deputado federal Osmar Serraglio (PMDB-PR) para o Ministério da Justiça, em substituição a Alexandre Moraes, que teve aprovada pelo Senado sua indicação como novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). A indicação de Serraglio partiu de uma facção da bancada do PMDB na Câmara que estava insatisfeita com a extensão da sua inserção fisiológica no governo.
Com a recusa de Carlos Veloso, ex-ministro do STF, em substituir Moraes, Temer abdicou de uma opção técnica e ampliou ainda mais a presença de parlamentares no governo. Uma vez indicado, Serraglio repetiu o mantra: “A Lava-Jato é intocável”. Porém, enquanto deputado, defendeu a criminalização de juízes e promotores por abuso de autoridade e o fim do sigilo sobre o conteúdo das delações premiadas, o que poderia prejudicar o aprofundamento das investigações em curso. Serraglio também defendeu Eduardo Cunha e tentou articular manobras para evitar a cassação do ex-presidente da Câmara. "Eduardo Cunha exerceu um papel fundamental para aprovarmos o impeachment da presidente. Merece ser anistiado", disse o novo ministro da Justiça.
Graves também são suas posições e iniciativas contrárias aos direitos constitucionais de índios, quilombolas e outras minorias. Ele faz parte da tropa de choque da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a famigerada bancada ruralista. O grupo divulgou nas redes sociais seu apoio à indicação de Serraglio ao ministério.
As ligações do parlamentar com grandes empresas do setor agropecuário são notórias. Na campanha eleitoral de 2014, o parlamentar declarou ter arrecadado R$ 1,4 milhão. Deste total, mais de 30% vieram de empresas do setor, entre elas fabricantes de agrotóxicos. O frigorífico JBS doou R$ 200 mil ao deputado e a exportadora de açúcar e etanol Coopersucar, R$ 100 mil. Segundo o site “De Olho nos Ruralistas”, em 2014, o parlamentar declarou um patrimônio de R$ 5,4 milhões, enquanto que, em 1997, ele dizia ser detentor de R$ 704 mil.
O deputado elaborou parecer favorável à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que pretende transferir do Executivo para o Legislativo a atribuição de dar a última palavra sobre a demarcação das Terras Indígenas, além de afetar negativamente várias outras disposições constitucionais que garantem direitos aos índios. Se aprovado, o projeto vai paralisar definitivamente as demarcações. Ou seja, com a nomeação de Serraglio, a raposa tomará conta do galinheiro.
Não se sabe ainda se essa nomeação significa que o atual governo pretende abdicar da sua responsabilidade constitucional de demarcar as Terras Indígenas. Caso essa possibilidade se confirme, representaria uma postura inédita de omissão da administração federal, sem precedente histórico e sujeita a contestação no STF. Com isso, completa-se o loteamento das funções públicas mais relevantes para a política indigenista: a Fundação Nacional do Índio (Funai) foi entregue ao PSC, enquanto a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), com um orçamento de R$ 1,6 bilhão, também vai para o PMDB.
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Temer coloca deputado anti-indígena no Ministério da Justiça - Instituto Humanitas Unisinos - IHU