23 Outubro 2017
Edgar Morin será nosso convidado na segunda edição das Journées de l'économie autrement que estão sendo organizadas em Dijon nos dias 24 e 25 de novembro pela revista Alternatives Économiques. O sociólogo, historiador e pensador da complexidade, 96 anos e que participou da Resistência Francesa ao nazismo, pede para resistir às forças destrutivas que ameaçam o nosso planeta, confiando nas forças positivas em gestação entre os portadores de iniciativas e de experiências locais.
A entrevista é de Catherine André, publicada por Alternatives Économiques, 20-10-2017. A tradução é de André Langer.
Qual é a sua visão diante dos múltiplos desafios ecológicos, sociais e econômicos que a humanidade enfrenta?
Estamos em um mundo extremamente inquietante, com muitos processos extremamente perigosos acontecendo. Esta é uma situação em que podemos nos perguntar quais são as razões para ter esperança. As minhas primeiras razões para ter esperança são as forças positivas que eu vejo atualmente: uma efervescência de iniciativas que se concentram no desenvolvimento dos seres humanos como indivíduos, e também dentro das comunidades, das famílias, das amizades, das redes, etc.
Estas iniciativas existem tanto no campo da agroecologia, nos eco-bairros, no setor da economia social e solidária, nas novas relações de solidariedade, bem como em todas as associações que compreenderam que um dos objetivos da vida é a "convivialidade". Essas micro-experiências locais são uma das maneiras de resistir às forças tecnoeconômicas da mundialização. Elas nos predispõem a ver mais longe.
Qual é a sua mensagem aos atores dessas iniciativas?
Que é realmente muito importante continuar a experimentar, desenvolver iniciativas criativas que trabalhem para uma existência mais solidária, para formas de economia social consagradas à solidariedade. Essas iniciativas dizem sim a uma outra visão de mundo. Não sei se as forças em que eu acredito – o amor, a comunhão, a fraternidade – podem prevalecer contra as forças da morte. Mas "resistir" torna-se, em todo caso, fundamental. Durante a resistência (ao nazismo), nós dissemos não a essa deriva da humanidade. Resistir hoje é dizer não a uma economia descontrolada, ao fechamento sobre si mesmo que conduz aos fanatismos. E isso é dizer sim à liberdade, à esperança e ao bem viver. Mesmo se, infelizmente, o conceito de bem viver tenha se deteriorado, no sentido de uma excessiva focalização no conforto material.
Claro, esse vasto movimento de forças positivas está disperso e as iniciativas nem sempre estão conectadas entre si. Tanto as administrações como os poderes públicos ignoram tudo isso ou são completamente indiferentes, porque vivem em outra lógica, uma lógica matemática, do cálculo, dos números. E eu diria que os sistemas educacionais moldam as mentes, mostrando a realidade de maneira compartimentada e separada, em vez de permitir sua compreensão e de tecer relações.
As relações mais importantes hoje são aquelas que unem os seres humanos na mesma comunidade de perigo que é o planeta. Todos nós enfrentamos, em todos os continentes, o perigo ecológico, a degradação da biosfera; nós temos uma economia não regulamentada que aumenta as desigualdades entre os pobres e os ricos. Nós temos situações em que, na angústia, as populações se fecham sobre sua identidade particular e, portanto, temem os estrangeiros, os migrantes, o outro, etc. Os medos mútuos e os fanatismos se desenvolvem, como você pode ver, em todos os lugares.
Portanto, nós nos encontramos em uma situação extremamente inquietante, e não é certo se as forças positivas de que falo irão triunfar. Eu sou um homem muito idoso, e eu vivi a minha adolescência entre os anos 1930 e 1940, aqueles do período anterior à guerra, uma época em que havia a crise do capitalismo, uma crise mundial terrível e em que havia a crise da democracia, porque ela mesma foi vítima de enormes escândalos e se encontrava em absoluta impotência. Assim, apresentavam-se como solução dois monstros, o fascismo e o nazismo, e o comunismo stalinista – com os processos de Moscou. E nessa situação, nós éramos alguns poucos para procurar a terceira via que evitaria a guerra. Mas, assim que a guerra estourou, tudo foi esmagado e nada poderia ser feito. Então, eu sei que temos esperanças, mas a esperança nunca é a certeza.
Qual é a sua profunda convicção para a sociedade que está chegando? Ela pode ser melhor?
Minha profunda convicção é que, se eu olho para o futuro – que é desconhecido, porque sempre acontece o inesperado –, as probabilidades estão na continuação de todas as degradações. Claro, dizem os otimistas: "haverá robôs que farão tudo, potencialmente as pessoas poderão viver muito mais", etc. Como isso será possível se a humanidade começa a se matar em uma nova guerra mundial, desta vez com novas possibilidades de extermínio que ainda não existiam na última? Alguns argumentam que uma pequena elite se salvará no Tibete ou na Austrália, mas haverá apenas alguns que poderão se beneficiar dessas possibilidades. Então, eu diria que o futuro é extremamente preocupante em sua probabilidade.
Minha experiência do passado é que o improvável acontece. Eu sou um daqueles que viveram quando a Alemanha nazista dominava a Europa de uma maneira que parecia definitiva, Hitler tinha praticamente conquistado a Rússia e a Europa e simplesmente foi parado pelo inverno às portas de Moscou. Em alguns dias, eles conseguiram salvar Moscou e obter a primeira vitória soviética contra os alemães e, dois dias depois, houve o ataque a Pearl Harbor e os Estados Unidos entraram na guerra: portanto, o improvável tornou-se provável. Eu, pessoalmente, acredito nas possibilidades do improvável!
Chego agora à minha posição fundamental: não penso que possamos construir ou, em vez disso, desenvolver um futuro modelo de sociedade. Se houver uma sociedade futura melhor, ela se desenvolverá por processos positivos. Eu penso que podemos indicar quais são os processos positivos que vão ao encontro deste estado de coisas, mas não temos certeza de que se tornarão realidade.
Minha profunda convicção é que nos inscrevemos em uma história incrível que é a dessa humanidade, que começou antes mesmo de sermos homo sapiens, há milhões de anos. Nós estamos inscritos em uma história que viu sociedades primitivas, civilizações formidáveis, maravilhosas e horríveis, e... que estão todas mortas. Esta história que hoje continua através da globalização, através de sacrifícios, belezas, horrores etc., que por si só é uma continuação da história da vida e talvez do mundo.
Quando considero essa história de vida e de todo o universo, eu vejo aí o conflito permanente e inextinguível entre o que pode ser chamado de Eros e Tanatos, isto é, entre as forças do amor, que são as forças de ligação, de associações, de dependência, e as forças da morte, que são as forças de dispersão, de degradação e de destruição.
Você tem isso desde o início com o fato de que a matéria foi criada por associação nos átomos e ao destruir a anti-matéria. Desde o início, você tem ao mesmo tempo o que dizia Heráclito: a concórdia e a discórdia, e – aquilo que Freud retomou – eu diria a luta inextinguível entre Eros e Tanatos. Esta luta continua no gênero humano agora, e não sabemos qual é o futuro. Nós esperamos uma via nova. Eu até escrevi um livro chamado A Via para o futuro da humanidade [Bertrand Brasil, 2013]. Mas, mesmo se essa via não se realize, eu me inscrevo de qualquer maneira no lado de Eros nesta luta permanente contra Tanatos e isso deve dar energia e esperança!
O que você quer transmitir aos jovens?
Dizer-lhes que a maior lição da história é que não tiramos as consequências das lições da história. Minha mensagem é viver! Quando eu estava na resistência, era perigoso, era enfadonho, mas ao mesmo tempo senti que tinha escolhido viver em vez de sobreviver. Ou seja, o importante é: Vivam! Lutem! Amem! Juntem-se! Eduquem! Resistam às coisas mais terríveis! Mesmo nos tempos mais difíceis, vocês devem manter essa mensagem.
Eu sonho que as belezas da vida vão desabrochar o máximo possível e que os horrores da vida sejam inibidos tanto quanto possível. Esse é o meu desejo. Mas todos nós somos sonâmbulos, vivemos metade no sono e é também o que devemos compreender. Eu não falo mais de utopia, isto é, dizer que minha maneira de pensar não pode mais situar-se na alternativa entre o realismo e a utopia. Por quê? Porque eu acho que existem dois tipos de utopia: a utopia louca, aquela que pensa na harmonia total. Eu penso que isso é impossível porque a discórdia, Tanatos, está sempre presente. Podemos melhorar as coisas, mas não atingiremos a perfeição. Além disso, a perfeição não é possível no universo: se fosse perfeito, não existiria.
Por outro lado, há uma boa utopia: é a utopia que nos diz que certas coisas são bastante possíveis, mas que uma série de condições atuais as torna impossíveis. É possível alimentar adequadamente todas as pessoas do planeta. Temos os meios agrícolas, técnicos, etc., para isso; é possível fazer a paz mundial entre as nações. Temos todos os sistemas de comunicação para isso. Podemos ver muito bem quais são as condições psicológicas, sociológicas, econômicas, os limites, os erros, as loucuras que impedem tudo isso. Portanto, você tem a utopia boa e a má, como você tem um realismo bom e mau. O mau realismo é acreditar que estamos no imediato e que tudo permanecerá como no imediato.
O mau realismo ignora que há forças profundas e subterrâneas que trabalham nas sociedades, o que Hegel chamou de "a velha toupeira", que de repente as implode. Não devemos pensar que estamos em um mundo fixo: o mundo se transforma, quer gostemos ou não. E é necessário apostar nas forças de transformação; foi meu mestre, o filósofo Bernard Groethuysen, que disse: "Ser realista, que utopia!" Assim, as palavras utopia e realismo devem ser tomadas em um sentido complexo, isto é, duplo, ambíguo, tanto uma como a outra. Essa é a minha concepção.
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“A efervescência de iniciativas que apostam na 'convivialidade' é a razão para ter esperança”. Entrevista com Edgar Morin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU