14 Dezembro 2018
Os nossos textos repetem várias vezes que a verdade está do lado da alegria. Esta alegria que nos é anunciada é uma alegria 'apesar de tudo'; e, também, a partir de tudo, inclusive do que normalmente lhe seria contrário. A penúltima palavra pode ser de dor, mas a última é sempre de alegria. O Cristo vem habitar tudo o que a vida nos oferece e por que temos que passar. Deus não está implicado em nenhuma das causas dos nossos sofrimentos, mas vem assumir para si, conosco, tudo o que nos afeta.
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando as leituras do 3º Domingo de Advento - Ciclo C. A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara, e José J. Lara.
Eis o texto.
Referências bíblicas:
1ª leitura: Sf 3,14-18
2ª leitura: Fil 4,4-7
Evangelho: Lc 3,10-18
Os textos de hoje, mais ainda que no domingo passado, nos falam da alegria. Temos necessidade de ouvir isto, pois muita gente vê a fé cristã apenas como uma doutrina austera e cheia de obrigações, deveres e proibições. De fato, é muito frequente que as nossas pregações e explicações insistam, de modo unilateral, na moral e na "boa conduta". No entanto, para nós, a moral não vem em primeiro lugar: ela é, de qualquer forma, uma consequência perfeitamente natural da fé, quer dizer, da adesão amorosa a Deus por meio da pessoa do Cristo. Diante de meus olhos, o Cristo e não o que faço ou não faço. Paulo gasta um tempo enorme explicando que somos "salvos", não por nossa observância da lei, mas pela fé. Em outras palavras, é uma questão de relação.
A partir daí, "não vos inquieteis com coisa alguma" diz a segunda leitura. Por quê? A primeira leitura repete três vezes que o Senhor está no meio de nós, que Ele reside em nosso meio e que, em nós, Ele encontra a sua alegria. Precisamos, com certeza, de nos "renovar", este é o aspecto moral de nossa adesão; mas é o seu amor que nos renova e não os nossos esforços. Deixemo-nos invadir por Aquele que, sem cessar, vem bater à nossa porta.
Deixemos de nos concentrar no que está aí para ser vendido, abandonado, portanto, e compremos o campo onde o tesouro está enterrado: só o tesouro é que conta. Pensemos somente nele. Com ele, a vida vai recomeçar de um modo diferente. O mundo antigo desapareceu e está aí um mundo novo.
Já está claro que a alegria é filha da fé. Uma fé que não está fundada na visão, mas na palavra ouvida. Por isso, os nossos textos repetem várias vezes que a verdade está do lado da alegria. As Escrituras não insistiriam tanto nisto se fosse algo assim tão evidente. Esta alegria que nos é anunciada é uma alegria 'apesar de tudo'; e, também, a partir de tudo, inclusive do que normalmente lhe seria contrário. A penúltima palavra pode ser de dor, mas a última é sempre de alegria. O Cristo vem habitar tudo o que a vida nos oferece e por que temos que passar. Deus não está implicado em nenhuma das causas dos nossos sofrimentos, mas vem assumir para si, conosco, tudo o que nos afeta. Isto é o que significa a crucifixão e ela se abre para uma nova vida, a salvo do poder e da morte. Por isso nossa terceira leitura termina com as palavras "boa nova".
A alegria que ela busca não é forçosamente exuberante: tem algo a ver com a paz interior, para além de nossas perturbações superficiais. Jesus, após a sua última ceia, de acordo com o quarto Evangelho, repetiu isto para os seus discípulos, imediatamente antes de sua Paixão. Reconfirmemo-nos, diante dos eclipses de nossa fé e da alegria: até mesmo os discípulos, que ouviram Jesus diretamente, atravessaram o deserto da dúvida, o desaparecimento da fé, a perda da alegria. Não esperemos fazer melhor: quando isto nos acontecer, fiquemos à espera de outros amanhãs. "Virá Aquele que é mais forte do que eu", diz João Batista. Lembremo-nos: a vida está sempre à nossa frente.
As pessoas que vêm fazer-se batizar por João desejam uma nova vida, uma transformação de sua existência e acreditam que o profeta pode trazer-lhes isto: o evangelho diz que "o povo estava na expectativa". A ponto de se perguntarem se não era ele o Messias. Esta fé só pode ser vivida através de comportamentos novos. Como dissemos, a fé vem primeiro, mas gera uma "moral": por isso, estas pessoas perguntam a João o que devem fazer daí para frente. Surpresa! Nos conselhos que dá João não lhes diz uma palavra sequer sobre Deus nem sobre o Cristo. Nada de propriamente "religioso". Uma única prescrição positiva; a de compartilhar. Em seguida, contenta-se com aplicar o decálogo a situações particulares: a dos coletores de impostos, que tinham a tendência a aumentar as contribuições em seu próprio proveito, e a dos militares, que, com facilidade, acresciam a pilhagem ao seu soldo.
João, como vemos, permanece na lei da primeira Aliança que nele se recapitula e se condensa. Trata de limpar o terreno e de deixar o lugar preparado para "Aquele que vem". O Cristo batizará no fogo que não se apaga e irá queimar em nós tudo o que nos impede de sermos nós mesmos de verdade. João não cria vínculos com os que responderam à sua voz "que grita no deserto". Ele é lugar de passagem, é o caminho para o Outro. Mais além do Cristo, nada há por esperar, exceto o seu "retorno". Qualquer outra iniciativa de revelação não seria senão uma regressão, em detrimento de João Batista.
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