09 Janeiro 2025
Ele passou o Natal com seus irmãos, irmãs e alguns hóspedes, cozinhando para todos as especialidades piemontesas como o bunet, um bolo feito com ovos, açúcar, leite, cacau, biscoitos amaretti e licor. Ele se dedicou à reflexão, ao pensamento, ao estudo, em sua cela na nova fraternidade da Casa della Madia, em Albiano d'Ivrea, a poucos quilômetros da comunidade de Bose que ele fundou em dezembro de 1965, e que depois foi forçado a abandonar em 2020 por causa de um decreto papal nunca totalmente compreendido por muitos.
Quando Enzo Bianchi fala - apesar dos 82 anos que completará em 3 de março - tem o olhar de uma criança e flexiona os verbos no futuro como se tivesse uma vida inteira pela frente. Sua atenção é constante pela atualidade, política, crises internacionais e guerras. Com a chegada do novo ano, ilfattoquotidiano.it se encontrou com ele para fazer um balanço da situação político-social e falar sobre o Ano Santo, ao qual dedicou seu último trabalho editorial: Lessico del Giubileo (Léxico do Jubileu, em tradução livre, edições Edb).
A entrevista é de Alex Corlazzoli, publicada por il Fatto Quotidiano, 04-01-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Padre Bianchi, o Jubileu que começou nestes dias com a abertura da Porta Santa não corre o risco de aparecer hoje como um evento anacrônico, fora de sintonia com os tempos para aqueles que estão longe da Igreja, ou mesmo uma manifestação puramente centrada em Roma?
Sem dúvida, o Jubileu apresenta problemas. O maior deles é aquele ecumênico, porque, sendo o ano em que comemoramos o Concílio de Niceia, portanto uma profissão de fé de toda a Igreja, o Jubileu mais uma vez nos divide com os cristãos da reforma, porque mais uma vez se fala de indulgências, uma questão sobre a qual parecia haver um acordo entre Igreja e reformados.
Não vamos falar sobre os ortodoxos que se sentem estranhos ao ano jubilar, não participam. O jubileu exclusivamente católico nasceu em 1300, após a separação entre o Oriente e o Ocidente, porque o rosto de Deus era aquele de um juiz severo, enquanto as pessoas invocavam um Deus misericordioso.
Foi São Francisco o primeiro, com o perdão, a estabelecer algo desse tipo.
Mais tarde, o Papa Celestino V voltou a proclamar um ano de perdão para todos com o Perdão de Áquila. Quando percebeu que o Jubileu tinha um grande sucesso entre as pessoas, o Papa Bonifácio VIII o organizou porque trazia dinheiro para Roma, certamente não para uma renovação da Igreja. E tem sido assim desde então.
E hoje que valor tem ou pode ter o Ano Santo?
O Jubileu que estamos vivendo não parece ter nenhuma conexão com o Jubileu bíblico proclamado pelos judeus: as dívidas não são perdoadas, não há compartilhamento de bens, a liberdade não é concedida aos prisioneiros. Que tipo de Jubileu é? Apenas espiritual? De tanta espiritualidade, anulamos o Evangelho. Acho que será uma grande caravana de peregrinações a Roma, mas nada será resolvido.
Há alguns dias, por ocasião do 88º aniversário do Papa Francisco, o senhor escreveu no “X”: “Ele é mais um venerando que um idoso que cuida da Igreja, conduzindo um rebanho que tem dificuldade em segui-lo. Mas ele não o abandona e continua como profeta a caminhar à frente, procurando as ovelhas que, fora do rebanho, correm o risco de se perder”. Quem não está seguindo esse pontífice?
A maioria não o segue. Alguns não estão satisfeitos com o que ele vê como o caminho da Igreja, especialmente quando fala dos pobres, dos descartados, dos pecadores: os homens religiosos não o entendem. Nem aqueles que o imitam o entendem, tantos padres de rua se tornaram estrelas.
O ano de 2025 começará com a posse do presidente eleito Donald Trump na Casa Branca. O senhor está preocupado?
Não, estou convencido de que o presidente dos Estados Unidos não tem nenhuma subjetividade de poder. Ele decide sob o comando dos grandes poderes dos EUA: os fabricantes de armas, os líderes do setor de energia. Independentemente de Biden ou Trump, ainda serão os outros que decidirão se terminar uma guerra, se “transportar” a democracia, como muitas vezes proclamaram, na realidade ocupando zonas do mundo. Estou preocupado com a situação internacional, com esse confronto que parece a Terceira Guerra Mundial: o planeta está pegando fogo.
Além disso, há o Oriente Médio: a situação em Gaza, na Síria, no Líbano, no Egito, no Irã, onde sequestraram a jornalista Cecilia Sala.
Os Estados Unidos, com a ânsia de fincar pé naquela terra, causam tudo isso por meio de Israel. A guerra que está sendo travada é feita em nome dos Estados Unidos, que querem ter um pé nessa zona onde há muito petróleo.
Vamos passar para a Itália. Nestes dias, foi aprovada a manobra orçamentária. Trata-se de um governo que se esquece dos mais pobres ou que de fato atende às necessidades da população?
A realidade é uma política que deve agradar absolutamente a Igreja com seus pedidos a favor da natalidade e da família, mas que carece de um olhar para a justiça e a igualdade.
Além de ser um monge, o senhor é um “homem de palco”, capaz de falar para centenas de pessoas. Fala-se com frequência sobre a capacidade da primeira-ministra Giorgia Meloni de falar com os italianos. O que pensa disso?
É verdade, ela se comunica bem com o italiano médio e pouco culto que precisa de algo gritado e forte, que não precisa ser pensado. Desde que não se pense, os slogans e as declarações pomposas são marcantes.
Se eu falar o nome de Roberto Vannacci, isso o deixa irritado, indignado ou sorridente? Sinto pena dele. Parece-me que ele é um daqueles remanescentes que infelizmente existem em toda parte de uma vulgaridade fascista que se arrasta também entre a gente. O mesmo vale para Matteo Salvini?
Não, ele é alguém que realmente não tem as conotações de cultura que um ministro deste país deveria ter.
Mas não há nada na esquerda ou o senhor vê algo que possa dar esperança?
Há pouca coisa. Continuam se digladiando uns contra os outros sem nunca ter uma visão que não seja demasiado personalista e subjetiva. A esquerda padece de um protagonismo narcisista...
E se Enzo Bianchi tivesse que votar amanhã, então o que faria?
Eu não iria votar.
Três sugestões para aqueles que lerão esta entrevista: uma viagem para fazer no ano novo; um livro para ler, um filme imperdível em 2025.
Desejo que a maioria possa visitar Istambul, pois entenderia muitas coisas sobre o Oriente Médio e o que está sendo fabricado nesse império otomano que quer se erguer como uma estrela. O livro que recomendo é Il discepolo che Gesù amava, de Giulio Busi. Por fim, gostaria que as pessoas assistissem, se ainda não o fizeram, Deus precisa de homens, dirigido por Jean Delannoy, baseado no romance de Henri Queffélec.
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O mundo está em chamas. Entrevista com Enzo Bianchi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU