04 Outubro 2024
A reportagem é de Hernán Reyes Alcaide, publicada por Religión Digital, 03-10-2024.
O padre jesuíta Antonio Spadaro, testemunha privilegiada dos encontros do Papa com os membros da Companhia de Jesus em todo o mundo, liderou hoje em Roma a apresentação de "Seja terno com coragem", o volume que reúne os diálogos em mais de uma dezena de países entre Bergoglio e sua ordem religiosa.
"Esta apresentação tem como pano de fundo uma tragédia, a do Oriente Médio, e uma esperança, a do Sínodo, que busca uma harmonia", enquadrou o escritor, jornalista e analista no lançamento do livro durante o evento realizado nesta quinta-feira na Cúria Geral da Companhia de Jesus, em Roma.
"Como esses diálogos nasceram? Por acaso. Eu estava terminando a transmissão ao vivo na viagem à Coreia, quando Alberto Gasbarri veio e me disse: 'quando você terminar, venha comigo de helicóptero. O Papa vai encontrar os jesuítas e quer que você vá'. Cheguei e o Papa começou a falar com os jesuítas. Com um gesto espontâneo, liguei o gravador, sem pedir permissão. Naquela mesma noite, comecei a postar no Twitter", lembrou Spadaro sobre o início de um dos momentos mais aguardados de cada viagem papal, muitas vezes conhecidos semanas depois do retorno a Roma.
"Na viagem seguinte, pedi permissão, gravei e pedi autorização para publicar. Ele me disse: 'deixe-me ver o que eu disse'. Tudo o que é publicado foi visto por ele antes. Assim começamos essa aventura das conversas com os jesuítas", explicou. Os diálogos, de fato, são revisados pelo Papa antes de serem publicados, embora Spadaro afirme que "quase tudo" o que é dito acaba vindo a público.
Para o também subsecretário de Cultura do Dicastério de Cultura e Evangelização, "ser testemunha dessas conversas significa também encontrar uma chave de leitura. Uma delas é que ler este livro é dar uma volta ao mundo, já que os diálogos ocorrem em países e culturas completamente diferentes".
"Outra é que, no fundo, o Papa criou uma espécie de novo gênero literário. Não é a primeira vez que ele faz isso, pois o outro são as homilias de Santa Marta, que por si só são privadas e depois sintetizadas, não transcritas, porque ele não queria publicá-las na íntegra. Neste caso, pode-se dizer, citando um famoso escritor, que são palavras públicas ditas em privado, diante de irmãos com quem compartilha uma espiritualidade profunda", acrescentou Spadaro.
"Uma terceira imagem é que essas conversas são como o bastidor do pontificado, onde estão os ecos de cada viagem. Geralmente ocorrem no meio das viagens, então é a primeira oportunidade que ele tem de expressar como está vivendo cada viagem", continuou.
A jornalista Monica Maggioni, responsável pela RAI, televisão italiana, quando começaram as viagens do Papa, afirmou que os diálogos do livro são "palavras que nasceram com um desejo de serem contadas de uma maneira diferente".
"A ideia das viagens de Spadaro como enviado da RAI nasceu como uma ideia de ler ao vivo com uma linguagem que nos surpreendia. Eu percebia o privilégio de poder ouvir o Papa falando uma linguagem sua, ainda mais do que os discursos a que estamos acostumados. Percebe-se pela escolha das palavras que o Papa usa, sempre buscando contato e compartilhamento. Enquanto lia, eu via que enquanto ele ia como Papa a um lugar, encontrava sua comunidade, onde tudo começou", desenvolveu.
Para Maggioni, o Papa "vai a esses lugares do mundo, mas também vai buscar suas raízes de leitura do mundo, de ser uma comunidade parte da Igreja. É um encontro no qual ele se sente próximo, e fala com total liberdade, dizendo coisas que vão à essência das questões. Sente-se esse forte elemento de liberdade ao falar".
"Ele questiona uma série de lugares comuns nesses diálogos, como sua relação com os jesuítas. Há uma dimensão muito íntima das pessoas, mas também do mundo. Por exemplo, quando na viagem a Mianmar e Bangladesh ele fala sobre o tema do fundamentalismo. Sempre que alguém levanta um problema de antagonismo ou de dialética negativa, ele continua repetindo: é preciso ir ao encontro do adversário, colocar-se diante do outro. E essa é uma grande receita", acrescentou Maggioni.
Por sua vez, o cardeal Jean Claude Hollerich destacou que, no livro, "Spadaro nos convida a viajar com o Papa. E podemos acompanhá-los".
"Francisco sempre encontra os jesuítas, que fazem perguntas pessoais. Pessoal, para um jesuíta, significa como realizar a missão de cada um. Há dificuldades internas e externas para a missão. E nesses diálogos ele nunca dá uma resposta universalista, sempre diz 'veja por si mesmo, é preciso discernir'", acrescentou.
Para Hollerich, "há outra atitude, que está no título: o Papa quando diz 'coragem', diz 'siga em frente, não pare, não tenha medo'. O Papa, nos diálogos, "dá respostas concretas, não abstratas".
Assim, para o purpurado, "em tudo o que o Papa diz aparecem os grandes temas de seu pontificado: misericórdia, centralidade dos pobres, discernimento. Até mesmo os grandes temas do Sínodo estão presentes, posso dizer isso como relator do Sínodo".
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Apresentado o livro dos diálogos do Papa com os jesuítas, "um novo gênero literário" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU