08 Agosto 2023
Organização dedicada à advocacy em prol da infância vai encaminhar propostas debatidas neste sábado com participação da UNICEF, do Instituto Mapinguari e do Projeto Amar
A reportagem é da Assessoria de Comunicação do Grupo Alana, 07-08-2023.
A Amazônia tem a população mais jovem do país, com 9,1 milhões de crianças e adolescentes. E são elas as mais impactadas pelas crises socioambientais que atingem a maior floresta tropical do mundo. Da poluição do ar advinda das queimadas à contaminação das águas e alimentos por mercúrio, da falta de saneamento básico e educação à violência sexual no contexto do garimpo ilegal, as crianças são afetadas em muitas frentes.
Ciente da urgência de que crianças sejam consideradas com absoluta prioridade nas decisões relativas à proteção e ao desenvolvimento da região Amazônica, o Instituto Alana pôs o tema em pauta no painel “As múltiplas infâncias amazônicas e a prioridade absoluta” no “Diálogos Amazônicos”, parte da programação da “Cúpula da Amazônia” que reúne organizações da sociedade civil, academia, centros de pesquisa e agências governamentais. A ONG irá levar algumas questões debatidas neste encontro como propostas para o Acordo de Belém.
JP Amaral, gerente de Clima e Meio Ambiente do Instituto Alana, chamou a atenção sobre a urgência e o dever de colocar as infâncias no centro das discussões: “Na nossa Constituição, o artigo 227 fala que é dever da família, da sociedade e do Estado proteger e assegurar os direitos das crianças e adolescentes com prioridade absoluta. Não é só o Brasil que garante isso. As crianças também são colocadas como prioridade no artigo 58 da Constituição da Bolívia, artigo 44 da Colômbia, artigo 78 da Venezuela e artigo 44 da Constituição do Equador, todos países que participam da Cúpula da Amazônia. Por isso, é necessário que a gente traga as crianças e adolescentes explicitamente no Acordo de Belém, que será firmado aqui”, diz.
Para JP, existe uma crise que ainda é pouco falada: a total desconexão do ser humano com a natureza, o que é consequência de outras crises. “O Alana tem um programa, Criança e Natureza, para garantir e defender outro direito das crianças, o direito à natureza, previsto inclusive no artigo 225 da Constituição. Uma das medidas que temos feito são parques naturalizados, que são áreas naturais para o brincar nas cidades e também nas escolas, onde as crianças estão por mais tempo”, diz. “Tem creche que a criança entra 7h e sai às 16h. Fomentamos as escolas baseadas na natureza e podemos avançar muito nas políticas que temos no Brasil porque, infelizmente, só ⅓ das escolas públicas do país têm algum tipo de área externa, que são basicamente, pátios de concreto”.
Na opinião de Gustavo Anjos Noronha, de 18 anos, estudante de nível técnico em Computação Gráfica e voluntário do Projeto AMAR, em Manaus, Amazonas, “falar sobre infância na Amazônia é falar de como é tratada a criança socialmente no Brasil. A maioria dos pais não têm um diálogo com seus filhos e não incluem as crianças como seres em desenvolvimento e capazes de entender ideias complexas”. Ele conta sua experiência pessoal: “crescer na periferia de Manaus é um caos, ninguém está ali olhando por nós, é como se fossemos invisíveis. Você não existe para os adultos porque eles acham que você não tem idade suficiente para entender o que eles dizem. Você não existe para a escola, porque está ali apenas para aprender. Você não existe em locais como esse, de aprendizado e debate, porque acham que não somos maduros o suficiente. Então até ter uns 20, 25 anos, não somos vistos pela sociedade como alguém que vai gerar material cultural, social e intelectual. Você é só um pedaço de barro a ser moldado. Crescemos sem base, isolados, sem conexão com o resto do mundo, como internet, e sem saber o que fazer para o futuro”, explica.
Rayanne França, Oficial de Desenvolvimento e Participação de Adolescentes no Território Amazônico do Unicef Brasil, ressalta que é importante considerar a diversidade da Amazônia, que tem, no território, ribeirinhos, indígenas e quilombolas, por exemplo. Numa programação paralela, ela organizou encontros de adolescentes.
“Fizemos alguns debates e a metodologia utilizada foi diferente: eles foram os próprios palestrantes, compartilharam as experiências que estão vivenciando em seus territórios e nos seus coletivos. Eles têm muito para compartilhar”, diz.
Sobre espaços de escuta específicos para crianças, ela desabafa: “Tudo aquilo que a sociedade diz que é difícil, eu penso que é má vontade. Nada é difícil. Precisamos colocar as crianças na centralidade da discussão. Precisamos movimentar esforços, equipe, pensar metodologia se a gente quer trazer eles para o centro do debate, porque eles têm muito a contribuir. Precisamos ter parceiros que possam pensar conosco nessas ações e ter investimento para olhar para essas crianças e adolescentes e juventudes, porque assim teremos papel transformador de fato”. E finaliza: “Davi Kopenawa traz pra gente que os povos indígenas são os povos que seguram o céu e eu ouso dizer que as crianças, adolescentes, a juventude, são quem sustentam a terra, são eles que estão fazendo o agora. Temos que acreditar e potencializar esses atores e criar espaços de participação plena e efetiva para todos eles.”
A amapaense Hannah Balieiro, diretora executiva do Instituto Mapinguari, defende que estejam contemplados os modos de vida diferentes. “Temos que repensar o formato de educação dentro das diversas Amazônias que a gente tem. O Acordo de Belém tem que falar de outros formatos que contemplem essas diversas amazônias e que a gente não precise reproduzir um modelo que é de fora. A gente sempre fala de colonialismo, reproduz tanta coisa que vem de fora e dito que é melhor, mas a gente sempre vai ser melhor porque temos um ecossistema muito específico e formas muito específicas de se viver”. E conta sobre negociações e expectativas de criação de um conselho da juventude para compor o Conselho interestadual da Amazônia Legal, liderado pelo governador do Pará, Helder Barbalho. “Em uma movimentação de organizações da sociedade civil locais, amazônidas, conseguimos que o governador recebesse uma carta para que pudéssemos montar um conselho de juventude. Ele ainda não foi criado efetivamente, precisamos entender a estrutura e se ele será um conselho a partir do OTCA”.
Vale lembrar que diversas organizações da sociedade civil entregaram, no último dia 21, uma carta aos oito países que estarão presentes na ‘Cúpula’ (Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela), solicitando que crianças e adolescentes sejam consideradas nas decisões relativas à proteção e ao desenvolvimento da região Amazônica. O documento busca sensibilizar os governos sobre a necessidade da proteção das infâncias, parcela da população frequentemente esquecida em grandes encontros, acordos e decisões internacionais, mediante a crise climática e ambiental.
JP Amaral resumiu, em sua fala no encontro, alguns pontos da carta:
1. Assumir o compromisso de, explicitamente, mencionar crianças e adolescentes e seus direitos específicos, assim como considerar o seu melhor interesse, em todas as estratégias, planos, documentos e comunicações relevantes da OTCA, como a política pública comum que será promovida conforme previsto na Declaração de Belém do Pará e Leticia;
2. Assumir o compromisso de articular políticas especialmente voltadas à promoção dos direitos de crianças e suas famílias no território Pan-Amazônico;
3. Assumir expressamente o compromisso com os direitos das presentes e futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado;
4. Assumir o compromisso de garantir e promover a cooperação técnico-econômica para o desenvolvimento e adoção de tecnologias para produção e unificação de dados e informações sobre o mapeamento e conservação da diversidade biológica amazônica, reconhecendo os conhecimentos tradicionais, inovações e tecnologias dos povos indígenas a partir do seu consentimento livre, prévio e informado.
A conversa teve mediação da jornalista Regiane Oliveira, coordenadora de comunicação do Alana.
O Alana é um grupo de impacto socioambiental que promove e inspira um mundo melhor para as crianças. Um mundo sustentável, justo, inclusivo, igualitário e plural. Um mundo que celebra e protege a democracia, a justiça social, os direitos humanos e das crianças com prioridade absoluta. Um mundo que cuida dos seus povos, de suas florestas, dos seus mares, do seu ar. O Alana é um sistema de três esferas interligadas, interdependentes, de atuação convergente, orientadas pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU. O encontro de um Instituto, uma Fundação e um Núcleo de Negócios de Entretenimento de Impacto. Um combinado único de educação, ciência, entretenimento e advocacy que mistura sonho e realidade, pesquisa e cultura pop, justiça e desenvolvimento, articulação e diálogo, incidência política e histórias bem contadas.
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Alana defende que prioridade absoluta das crianças seja tratada de forma explícita no Acordo de Belém - Instituto Humanitas Unisinos - IHU