07 Março 2023
"Assim, o site katholisch.de, da Conferência Episcopal Alemã, reescreve a figura de um de seus ex-presidentes: 'em nome da verdade não pode mais haver monumentos intocáveis para as vítimas' – comentou o sucessor de Lehmann em Mainz, dom Peter Kohlgraf. E assim, impiedosamente, caiu mais um dos grandes monumentos da Igreja Católica. Como deveria ser. Na gestão dos abusos sexuais contra menores, na falta de capacidade empática para estabelecer relações com as vítimas, no favorecimento do estado clerical sobre o crime cometido, num sentido doentio do dever de proteção da instituição eclesial e da sua imagem, sempre parece mais que nenhum de uma certa geração de bispos será salvo", escreve Marcelo Neri, teólogo e padre italiano, professor da Universidade de Flensburg, na Alemanha, em artigo publicado por Settimana News, 05-03-2023.
O relatório do escritório de advocacia de Regensburg sobre casos de abuso na Diocese de Mainz “mostra em detalhes como card. Lehmann minimizou publicamente seu conhecimento das coisas, sua responsabilidade e a da Igreja de proteger a imagem da instituição (…). O relatório traça a pior imagem de Lehmann que é possível pensar. O bispo, outrora visto como a figura resplandecente dos progressistas, assente em sólidos princípios, e um dos principais teólogos do seu tempo, revela-se um insensível mentiroso que tudo faz para proteger a instituição até o fim – apesar de conhecer muito bem os fatos relativos à sua diocese” (Felix Neumann).
Assim, o site katholisch.de, da Conferência Episcopal Alemã, reescreve a figura de um de seus ex-presidentes: 'em nome da verdade não pode mais haver monumentos intocáveis para as vítimas' – comentou o sucessor de Lehmann em Mainz, dom Peter Kohlgraf. E assim, impiedosamente, caiu mais um dos grandes monumentos da Igreja Católica. Como deveria ser. Na gestão dos abusos sexuais contra menores, na falta de capacidade empática para estabelecer relações com as vítimas, no favorecimento do estado clerical sobre o crime cometido, num sentido doentio do dever de proteção da instituição eclesial e da sua imagem, sempre parece mais que nenhum de uma certa geração de bispos será salvo.
Pouco importa o seu alinhamento eclesial, encontramo-los por todos os lados: progressistas e conservadores, esquerda e direita, não menos do que no centro, capazes de tecer um diálogo com a modernidade ou profundamente convictos de que ela representa o princípio de uma decadência da civilização ocidental.
Todos eles se encontram lentamente unidos no naufrágio da violência oculta, senão deliberadamente protegida, de vidas e corpos dilacerados pela Igreja que não encontraram nem ouvido nem reconhecimento por parte desta geração de bispos.
Todos juntos, dramaticamente, pela primeira vez – a distância ideológica que os separava no pensar o catolicismo moderno corresponde a uma proximidade chocante no modo de pensar, agir e compreender o papel do ministério episcopal na Igreja Católica.
Não podemos mais continuar dizendo que, mesmo no que diz respeito aos bispos, são casos individuais, traços de personalidade individuais. Lehmann é o caso contundente da falha do papel episcopal diante dos abusos perpetrados na Igreja Católica. É uma questão do corpo, não dos membros.
E como tal deve ser enfrentado, não segurando-o firmemente nas mãos dos pares, mas entregando-o a outros: pedindo ajuda a quem tem capacidade para repensar a imagem e o exercício do ministério episcopal na Igreja e para a comunidade dos crentes.
Há uma força perversa de corporativismo clerical que impede o ministério ordenado, de qualquer ordem e grau, de sair do baixio em que encalhou um barco no qual não estão só eles. Há mãos disponíveis para empurrá-lo para o mar aberto – pela primeira vez, vamos confiar neles e em sua fé. Mas confiemo-nos também a mãos incrédulas que entendem que o desmoronamento da Igreja Católica em nosso momento histórico deixaria a humanidade e a sociedade contemporânea perigosamente desamparadas.
Também esta é uma prática de verdade que devemos às vítimas, ao silêncio a que as obrigamos, à solidão em que as deixamos.
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A culpa de Lehmann, bispo e teólogo alemão - Instituto Humanitas Unisinos - IHU