08 Novembro 2022
"Os jovens têm dificuldade para desejar e nós temos dificuldades para escutar, mas não devemos alimentar medos: o futuro é deles não apenas por razões biológicas e nós devemos tentar não impedir pelo menos o sucesso, a eu-daimonía, a felicidade de quem realiza o seu daimon", escreve Enzo Bianchi, monge italiano e fundador da Comunidade de Bose, em artigo publicado por La Repubblica, 07-11-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os jovens, a última geração que se debruça sobre a vida, ultimamente estão cada vez mais sob observação pela sociedade que tenta "compreendê-los", e já são agora até objeto de uma obsessiva pesquisa no âmbito da pastoral, porque são a parte que falta da Igreja, os ausentes por excelência dos atos de culto e ocasiões de reunião. Todos nós o sabemos: são uma geração de ruptura de memória porque não receberam aquela herança tão rica e acumulada dos pais que era habilitação para a confiança, exercício de esperança e experiência de vínculos e de comunhão.
Umberto Galimberti, que sabe dialogar com os jovens e o faz diariamente, denunciou o hóspede inquietante do niilismo que encontrou morada no coração dos jovens. Niilismo que aparece quando eles dizem sem nenhum pathos particular que não há propósito, não há resposta para o porquê eles deveriam estar no mundo de uma certa maneira.
Entre eles, porém, há aqueles que buscam, antes de tudo, o próprio caminho seguindo, mesmo sem saber, a advertência do Oráculo de Delfos: "Conhece-te a ti mesmo!", porque entendem que só quem se deixa inspirar por seu eu interior pode fazer de sua própria vida uma obra cheia de sentido. Mas continua sendo verdade que nesta situação em que falta a arte da escuta do próprio daimon, da própria voz interior, a maioria chega à identidade ilusória da autossuficiência, que deve recorrer à exibição e à publicidade. Infelizmente, as mídias sociais se tornam o instrumento que se presta a essa inclinação, mesmo que conservem valores positivos que as impedem de os demonizar. Por isso, mesmo o reunir-se dos jovens muitas vezes carece de conexão com a interioridade e mostra apenas indivíduos isolados.
Assim entendemos porque mesmo o protesto da juventude nos últimos anos tenha uma tendência “em soluços”, e não saiba gerar nenhum movimento, nenhum caminho participativo e comum.
Torna-se fácil para os jovens a fuga de si mesmos, como denuncia David Le Breton, e o aparecimento em muitos deles da síndrome da brancura (blancheur): uma fraqueza, uma palidez, um bloqueio de desejo. A vida não é mais um recipiente de experiências e possibilidades, mas é vivida com uma atitude de renúncia.
“Estamos fora de nossas cabeças, mas diferentes deles”, fala o verso manifesto da música Zitti e buoni dos Maneskin, verdadeiro grito da geração atual.
Eis porque o “blancheur” e a tibieza, que são dois entraves àquele desejo de energia capaz de dar forma ao mundo. Acima de tudo, a extinção do desejo que como um contágio se espalhou entre os jovens impede a ignição das paixões e gera incertezas que têm modalidades e frequências até aqui desconhecidas. Os jovens têm dificuldade para desejar e nós temos dificuldades para escutar, mas não devemos alimentar medos: o futuro é deles não apenas por razões biológicas e nós devemos tentar não impedir pelo menos o sucesso, a eu-daimonía, a felicidade de quem realiza o seu daimon.
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Por que ouvir os jovens - Instituto Humanitas Unisinos - IHU