20 Agosto 2022
“Como líderes católicos, devemos falar cada vez mais alto sobre nossos próprios princípios fundamentais – dignidade humana fundamental e preocupação com os pobres e vulneráveis. Devemos reagir com força contra aqueles que definem o estranho como uma ameaça”, escreve Tania Tetlow, reitora da Fordham University, em artigo publicado por America, 18-08-2022. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.
Tania Christina Tetlow tomou posse como reitora da jesuíta Fordham University em Nova York, no último mês de julho. Desde 2018 até este ano, ela foi reitora da Loyola University de Nova Orleans. Ela é a primeira mulher e leiga a ocupar essas posições em universidades católicas. Ela é advogada, trabalhou como assistente da Procuradoria Geral dos EUA e foi professora de Direito em diversas universidades.
Eu tomei um caminho incomum para servir como líder católica leiga, um caminho que talvez tenha me ajudado a entender a importância da liderança católica nesse momento difícil da nossa história. Como um ato de rebelião juvenil, eu não fui a uma universidade católica. Afinal, eu já havia recebido uma educação jesuíta desde o berço. Minha mãe é uma teóloga de formação jesuíta e meu pai foi padre jesuíta por 17 anos antes de deixar o ministério para ter uma família. Talvez eu precisasse ver o mundo de forma diferente.
Eu fui a uma universidade secular próxima a minha casa, em seguida para a Escola de Direito de Harvard (ou, como minha mentora, a deputada Lindy Boggs, a chamava, ‘aquela Escola Protestante Yankee’). Lá eu me encontrava ligeiramente envergonhada de usar um crucifixo, mas ainda o usava. Eu estava preocupada que a religião fosse vista como ignorância, mas para mim, religião era intelectual. As paredes da minha casa eram cobertas por filas de livros acadêmicos de teologia, e quando meus pais não queriam que as crianças escutassem suas conversas, conversavam em grego antigo. A ideia de ser considerada como parte de um grupo religioso que rejeita a razão parecia injusto para mim.
Também descobri o estereótipo de que as pessoas religiosas são politicamente conservadoras, algo que me fez aprofundar as maneiras como nossa Igreja realmente atravessa a divisão política estadunidense. Dos ensinamentos da Igreja sobre o aborto à pena de morte, preocupação com os pobres e cuidado com a Terra – nada disso corresponde perfeitamente aos nossos atuais abismos políticos. Não apenas isso, mas as próprias raízes de nossos ensinamentos começaram a parecer contraculturais. Como católicos, acreditamos em fazer sacrifícios pelo bem comum. Acreditamos em cuidar de nossos vizinhos como irmãos e irmãs e em acolher o estranho. Pode parecer que o libertarianismo começou a triunfar, mas os ensinamentos da Igreja se opõem firmemente a ele.
Sempre houve dois instintos concorrentes nos valores políticos estadunidenses. O individualismo impulsiona a busca por oportunidades e liberdade humana. Com a mesma força, o comunitarismo define um bem comum e nos ensina a virtude cívica. Um equilíbrio saudável entre os dois nos serviu bem. No momento, no entanto, o individualismo desenfreado está derrotando nossas normas comunitárias, envenenando nosso discurso político com um egoísmo desenfreado. Mesmo em meio a uma pandemia, quando nossa respiração pode infectar outras pessoas, lutamos para reconhecer que nossas liberdades quase sempre afetam os outros. Mais e mais de nós se recusam a ver nossos vizinhos como uma família humana, merecedora de respeito e dignidade. Estamos perdendo os valores comuns que precisamos para combater os crescentes movimentos de ódio e violência política.
Então, o que significa ser um líder leigo católico neste momento apocalíptico de nossa história, quando tudo parece estar desmoronando? Acredito que seja uma grande oportunidade. Se pudermos chamar os católicos de volta aos ensinamentos da Igreja, se pudermos falar uma linguagem de valores comuns que lembre todos os estadunidenses de nossos princípios fundadores, poderemos fornecer uma centelha de esperança.
A linguagem da fé é uma ferramenta poderosa, muitas vezes abusada. Mas pode servir como o único farol capaz de brilhar através da névoa da racionalização e do interesse próprio. Os líderes do movimento pelos direitos civis nas décadas de 1950 e 1960, por exemplo, não citaram apenas valores ou objetivos políticos; eles convocaram uma nação à sua consciência, lembrando-nos do poder do amor de Deus sobre o ódio. Como líderes católicos, devemos falar cada vez mais alto sobre nossos próprios princípios fundamentais – dignidade humana fundamental e preocupação com os pobres e vulneráveis. Devemos reagir com força contra aqueles que definem o estranho como uma ameaça.
Como líder de uma universidade católica, tento (reconhecidamente, às vezes com apreensão) fazer de nossa instituição um centro de discussão matizada de questões críticas. Na tradição intelectual católica, espero que nossas instituições demonstrem o poder da curiosidade intelectual e da humildade. Acredito que podemos construir pontes sobre as crescentes divisões.
Nada disso será fácil. As forças que separam nosso país também dividem os católicos. Em uma época de absolutos, a linguagem de nuances e humildade cai por terra. Mas, como o Dr. Martin Luther King Jr. nos lembrou, o progresso não é inevitável. Temos que lutar por isso, todos os dias.
Falamos na linguagem da esperança porque devemos. Seguimos as lições dos Evangelhos porque cremos. E oramos muito para que possamos fazer a diferença.
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Em um tempo apocalíptico de polarização, líderes católicos não devem esconder a linguagem curadora da fé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU