26 Abril 2022
Em relação ao versículo de Gênesis: "E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom", meu pai me disse que o ver de Deus não é o ver do homem. O homem vê apenas entre o piscar dos olhos. Ele vê o mundo em pedaços, em fragmentos. Mas o Senhor do universo vê o mundo inteiro. Esse mundo é bom. Será que algum dia seremos capazes de ver como Deus?
O comentário é do cardeal italiano Gianfranco Ravasi, prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por Il Sole 24 Ore, 24-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Sete vezes no relato da criação que ocupa a primeira página da Bíblia, ou seja, o cap. 1 do Gênesis, repete-se a fórmula: "E viu Deus que era bom". Na verdade, em hebraico, a palavra tôb indica tanto o "bom" quanto o "belo" e até o "útil". Ora, o conhecido escritor (e rabino) nova-iorquino Chaim Potok em seu romance Il dono di Asher Lev (1990) nos oferece uma sugestiva interpretação desse adjetivo. Estamos sempre insatisfeitos com a realidade porque a apreendemos em fragmentos, marcando-a quase com o piscar dos olhos que inclui imagens e fragmentos pretos em sucessão.
Ao contrário da visão divina que é zenital, global, unitária, nos agarramos às porções que são incompletas e às vezes até sem sentido ou desconcertantes. É um pouco como o que acontece se nos fixarmos nos ladrilhos de um mosaico, sem contemplar o conjunto: o que são aqueles pequenos quadrados de cor, com fragmentos de rostos ou de objetos? Para compreender o sentido, é necessário recompor o todo, como faz o olhar divino. Isso é o que Deus objeta a Jó, que se enredava em torno de seu problema particular, sem perceber que mesmo os menores seres e eventos têm um sentido e o indivíduo precisa de outro olhar externo e mais amplo para se compreender e se completar.
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#o mosaico. Artigo de Gianfranco Ravasi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU