19 Abril 2022
No dia em que a Igreja Católica relembra a paixão e a morte na cruz de Jesus, o Pontífice dirige-se a mais um apelo pelo fim da guerra na Ucrânia. E em entrevista à Rai Uno diz: "Vivemos em um esquema demoníaco, que afirma matar uns aos outros por desejo de poder". Uma ucraniana e uma russa foram chamadas para carregar a cruz da estação, na qual é lembrada a morte de Jesus, escolha que suscitou numerosas polêmicas.
A reportagem é de Francesco Antonio Grana, publicada por Il Fatto Quotidiano, 15-04-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
“Senhor, converte nossos corações rebeldes ao teu coração, para que aprendamos a seguir projetos de paz; leva os adversários a apertar as mãos, para que possam desfrutar do perdão mútuo; desarme a mão levantada do irmão contra o irmão, para que onde houver ódio floresça a harmonia. Providencie para que não nos comportemos como inimigos da cruz de Cristo, para participar da glória de sua ressurreição”. É a oração que o Papa Francisco dirigiu na Sexta-feira Santa, dia em que a Igreja Católica recorda a paixão e morte na cruz de Jesus. Um apelo pelo fim da guerra na Ucrânia que segue os numerosos apelos que Bergoglio lançou nas últimas semanas. Justamente no início da Semana Santa, o Papa pediu em vão uma trégua pascal. “Coloquemo-nos diante do Crucifixo, fonte de nossa paz, e peçamos a ele a paz do coração e a paz no mundo”, pediu novamente Bergoglio aos fiéis.
Após dois anos de ausência devido às limitações impostas pela pandemia, o Papa voltou a presidir a Via Sacra no Coliseu. Para carregar a cruz da décima terceira estação, aquela em que se recorda a morte de Jesus, foram chamadas uma mulher ucraniana com uma russa, escolha que suscitou numerosas polêmicas tanto no mundo político como no eclesial. Precisamente por esta razão, meios de comunicação católicos online como Ugcc Live Tv, a revista católica Credo, Radio Maria e EWTN Ucrânia, bem como as televisões nacionais ucranianas decidiram não transmitir a Via Sacra este ano. O texto da meditação da décima terceira estação, aquele escrito pelas duas mulheres ucraniana e russa, pronunciado durante a transmissão ao vivo foi diferente daquele publicado anteriormente: “Diante da morte, o silêncio é mais eloquente que as palavras. Detenhamo-nos, portanto, em silêncio orante e cada um no coração reze pela paz no mundo”. "Trata-se - especificou a Sala de Imprensa da Santa Sé - de uma mudança prevista, que limita o texto ao mínimo se entregar ao silêncio e à oração".
A preocupação de Francisco com a dramática situação na Ucrânia é constante. "Esta tarde - disse afirmou diretor da Sala de Imprensa, Matteo Bruni -, voltando de Borodyanka, ao norte de Kiev, onde parou para rezar em frente às valas e aos corpos encontrados, como em uma via sacra, o cardeal esmoleiro Konrad Krajewski confiou sua dor a esta mensagem: "Aqui, com o núncio, estamos agora voltando para Kiev, desses lugares difíceis para cada pessoa do mundo, onde encontramos ainda muitos mortos e um túmulo de pelo menos 80 pessoas, enterradas sem nome e sem sobrenome. E faltam as lágrimas, faltam as palavras. Felizmente há a fé, e que estamos na Semana Santa, Sexta-feira Santa, quando podemos nos unir com a pessoa de Jesus e subir na cruz com Ele, porque depois da Sexta-feira Santa eu sei, eu sei: haverá o Domingo da Ressurreição. E talvez ele nos explique tudo com seu amor e mude tudo também dentro de nós, essa amargura e esse sofrimento que carregamos há dias, mas particularmente do dia de hoje".
Em entrevista ao programa da Conferência Episcopal Italiana transmitido na Rai Uno, A sua immagine, realizado por ocasião da Sexta-feira Santa, Francisco voltou ao tema da guerra. “Eu entendo – afirmou o Papa – os governantes que compram armas, eu os entendo. Não os justifico, mas os entendo. Porque temos que nos defender, porque é o esquema da guerra de Caim. Se fosse um esquema de paz, isso não seria necessário. Mas vivemos com esse esquema demoníaco, que afirma matar uns aos outros por desejo de poder, por desejo de segurança, por desejo de tantas coisas.
Mas penso nas guerras escondidas, que ninguém vê, que estão longe de nós. Muitas. Por quê? Para explorar? Esquecemos a linguagem da paz: a esquecemos. Falamos de paz. As Nações Unidas fizeram tudo, mas não foram bem sucedidas. Retorno ao Calvário. Ali Jesus fez de tudo. Ele tentou com piedade, com benevolência, convencer os poderosos, mas não: guerra, guerra, guerra contra ele! À mansidão, eles opõem a guerra por segurança. "É melhor que um homem morra pelo povo", diz o sumo sacerdote, porque senão os romanos virão. E a guerra".
Francisco também lembrou que “os refugiados são divididos. Primeira classe, segunda classe, cor da pele, se vem de um país desenvolvido ou não desenvolvido. Somos racistas, somos racistas. E isso é ruim. O problema dos refugiados é um problema que também Jesus sofreu, porque foi migrante e refugiado no Egito quando criança, para escapar da morte. Quantos desses sofrem para escapar da morte! Há uma imagem da fuga para o Egito que um pintor piemontês fez. Ele me mandou e eu fiz folhetos da imagem: ali está José com a criança fugindo. Mas não é São José de barba, não. É um sírio, de hoje, com uma criança, que está fugindo da guerra de hoje. O rosto de angústia que essas pessoas têm, como Jesus obrigados a fugir. E Jesus passou por tudo isso, mas está ali. Na cruz estão as pessoas dos países da África em guerra, do Oriente Médio em guerra, da América Latina em guerra, da Ásia em guerra”.
“Há alguns anos - continuou o Papa - eu disse que estávamos vivendo a terceira guerra mundial em pedaços. Mas não aprendemos. Sou um ministro do Senhor e um pecador, escolhido pelo Senhor mas, pecador assim, quando fui a Redipuglia em 2014, para a comemoração do centenário, vi e chorei. Só consegui chorar. Todos jovens, todos garotos. Depois um dia fui ao cemitério de Anzio e vi esses jovens que desembarcaram em Anzio. Todos jovens! E eu chorei ali, mais uma vez. Eu choro diante disso. Há dois anos, creio, quando houve a comemoração do desembarque na Normandia, vi os chefes de governo, houve uma reunião e eles comemoraram isso. Mas por que não comemoramos todos os 30.000 soldados que caíram na praia da Normandia? A guerra cresce com a vida dos nossos filhos, dos nossos jovens. É por isso que digo que a guerra é uma monstruosidade! Vamos nesses cemitérios que são justamente a vida dessa memória. Pensemos naquela cena que está escrita: barcos que chegaram à Normandia, abriam, os garotos pulavam carregando armas e os alemães: 30 mil, na praia”.
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Ucrânia, o Papa na Via Sacra: “Senhor, desarme a mão do irmão contra o irmão”. Uma mulher ucraniana e uma russa carregam a cruz - Instituto Humanitas Unisinos - IHU