O teólogo católico Mancuso: “A Igreja deveria abraçar os homossexuais, em vez de castrá-los na sexualidade. Francisco? Parece um pouco Pio IX”

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24 Junho 2021

 

Para a Itália deve ser um novo começo, não um retorno às condições pré-pandêmicas.

"A Igreja deve compreender as pessoas homossexuais sem nostalgia das fogueiras do passado. E ao invés quer pessoas que se castrem substancialmente em sua sexualidade”. Está convencido disso Vito Mancuso, teólogo e filósofo apreciado em todo o mundo, que em ilfattoquotidiano.it comenta sobre a intervenção do Vaticano contra o projeto de lei Zan, mesmo esclarecendo que não leu o projeto de lei contra a homotransfobia.

 

A entrevista é de Francesco Antonio Grana, publicada por Il Fatto Quotidiano, 23-06-2021. A tradução é de Luisa Rabolini.

 

Eis a entrevista. 

 

Professor, o que pensa do protesto da Secretaria de Estado que acusa a Itália de violar o acordo de revisão da Concordata e atentar contra a liberdade de pensamento dos católicos?

Eu me pergunto qual é motivo pelo qual a Santa Sé trouxe à baila a Concordata. Fico assombrado com uma Igreja que parece agir de maneira contraditória. E sobretudo vejo um papado que comparo a Pio IX porque me lembro, na época em que frequentava a escola, que este Pontífice se tornara em muitos aspectos a bandeira dos patriotas, que o elogiavam nos muros pelas suas aberturas em favor da Unificação da Itália. Mas que acabou por ser o mais fechado dos conservadores com o Sílabo e muito mais.

 

Você está preocupado com o que está acontecendo?

Estou preocupado com esse tipo de involução. Também no que se refere à última reforma do Código de Direito Canônico. Pode-se perfeitamente ser contra a ordenação de mulheres e tudo bem, mas colocar essa questão ao lado dos crimes de pedofilia, na minha opinião, deixa muitas pessoas perplexas. Bem como o posicionamento, que considero exatamente uma ingerência: aquele segundo a qual o líder de uma associação de fiéis ao fim de dez anos é obrigado a se demitir, retirando assim a liberdade dessa realidade. Isso me parece um dirigismo, um desejo de dobrar as coisas, de controle, dificilmente conciliável com aquele senso de abertura, liberdade, participação e renovação com que havia se aberto a temporada da Igreja do Papa Francisco. Mesmo agora vendo esta intervenção no projeto de lei Zan.

 

Quem é o responsável por tudo isso?

Li nas redes sociais que o meu amigo Alberto Maggi (outro importante teólogo "progressista", frade da Ordem dos Servos de Maria, ndr) dizia que esta (intervenção do Vaticano no projeto de lei Zan) é uma desfeita da Cúria contra o Papa Francisco. Mas, em suma, é uma ou outra. Ou é uma desfeita e neste momento, passados oito anos, nos encontramos com um Pontífice que não tem condições de governar e, portanto, estamos de volta ao começo. Exatamente naquele ponto em que Ratzinger tinha se demitido por não conseguia governar e os corvos se manifestavam, sumiam e reapareciam papéis, enfim, conhecemos bem o clima de oito anos atrás. Portanto, ou há incapacidade de governar ou não há incapacidade de governar e é precisamente Francisco que quer algo desse tipo. Mas, francamente, do ponto de vista - vamos chamá-lo - fisiológico, essa contínua distinção entre a Cúria má e o Papa bom não faz sentido depois de oito anos de papado. Pode ter sentido nos primeiros seis meses, no primeiro ano, porque é preciso colocar ordem em uma Cúria que ele não quis, mas neste momento Francisco é totalmente responsável pela Cúria que tem após oito anos de governo.

 

Por que a Igreja continua erigindo muros contra os homossexuais?

Parece-me absolutamente inexplicável, à luz das premissas com que começou o pontificado, esta série de sinais de que este último também é manifestação. Se há um assunto sobre o qual, a meu ver, é necessária uma solidariedade particular, uma capacidade particular de compreensão, que a Igreja exprimisse a nível legislativo o que a colunata de Bernini na Praça São Pedro expressa em nível arquitetônico, ou seja, a vontade de abraçar as pessoas, cada pessoa. Em outras épocas os sujeitos eram outros, eram as operárias, as mulheres. Agora é certamente o grupo homossexual, as pessoas homossexuais. Deste ponto de vista a Igreja mostra-se incapaz de aceitar um dado concreto, isto é, que hoje as pessoas homossexuais se qualificam como gay, ou seja, como pessoas felizes, como expressa o termo inglês, e orgulhosas de ser o que são, ou seja, gays, ou seja, felizes. Alguém pode até pensar nisso com nostalgia, mas imagino que ninguém pense em aprisionamento, ou até em fogueiras, como já aconteceu em alguns casos no passado contra as pessoas homossexuais. Mas certamente todos desejariam a natureza angelical ou uma natureza arrependida. Pessoas que se castram substancialmente em sua sexualidade, ou gostariam de pecadores públicos que continuamente repetem "mea culpa, mea culpa". Mas uma pessoa que é feliz por ser como a natureza - e para quem crê em Deus - a criou, que acolhe a mão de Deus de forma serena e alegre, tudo isso cria para a Igreja Católica atual, inclusive aquela do Papa Francisco, tamanha urticária intelectual que produz esses rodopios, na minha opinião, inexplicáveis.

 

Nota do Instituto Humanitas Unisinos – IHU

 

No dia 21 de julho de 2021, às 10h, o Instituto Humanitas Unisinos – IHU realiza a conferência A Inclusão eclesial de casais do mesmo sexo. Reflexões em diálogo com experiências contemporâneas, a ser ministrada pelo MS Francis DeBernardo, da New Ways Ministry – EUA. A atividade integra o evento A Igreja e a união de pessoas do mesmo sexo. O Responsum em debate.

 

A Inclusão eclesial de casais do mesmo sexo. Reflexões em diálogo com experiências contemporâneas

 

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