26 Janeiro 2021
“O desespero inconsciente é discutido profundamente por Kierkegaard em A doença para a morte (Em dinamarquês: Sygdommen til Døden), sob o pseudônimo Anti-Climacus. Neste livro, discutirá o desespero sob muitos aspectos, um deles é a consciência. Para Kierkegaard, o homem que ignora ter um eu tem por destino a espiritualidade, mas, mesmo carregando essa possibilidade, prefere as categorias do sensual. É como se ele possuísse uma mansão, mas preferisse viver no porão. E, segundo Anti-Climacus, ai do homem ainda que lhe propõe os outros andares. Afinal, para o esteta, todos são seus, mas apenas ao porão direciona seu amor, pois este erro em que mantém sua vida pode lhe proporcionar sua felicidade, não a verdadeira, mas, uma vez não a conhecendo e esta que possui lhe agradando, se agarra com todos os dedos, mostrando unhas e dentes àquele que lhe mostrar a sua contradição de viver nos mais baixos níveis de sua existência como se fosse obra de uma escolha”, escreve Paulo Abe para os Cadernos IHU Ideias número 312.
Contudo, prossegue Paulo, “por maior que seja o esforço em ignorar seu estado, o indivíduo ainda se encontra em desespero. E a ignorância só faz soar ao mesmo tempo o próprio erro. Num certo sentido, no desespero consciente de si, se está mais distante da salvação por este ser mais intenso. Um desespero que se ignora se passa despercebido. Deste modo, está longe de transformar-se em não-desespero, podendo ser este o maior de todos os riscos. Em outros termos, uma doença nunca diagnosticada nunca será remediada. De forma que o indivíduo ignorante de sua condição perpassa sua vida como um sonâmbulo”.
Ao abordar o caráter inconsciente do desespero, Paulo Abe recorre à categoria analítica “Ou-Ou (em dinamarquês: Enten-Eller), a fim de ter uma visão menos abstrata desse desespero, e mais ‘empírica’. Este estado de desespero tem mais força nas sensações que na intelectualidade. Quem aí perece está preso à sensualidade e tem uma alma inteiramente corporal, não vê que à luz da verdade é infeliz, acabando por viver na ilusão de uma felicidade; vive em erro. Mas, para ele, tanto melhor estar em erro, contanto que seja feliz a seu modo, que seus sentidos lhe agradem. Assim, ocupado desta maneira, não faz a menor ideia do que seja ser si-mesmo, pois não tem ousadia ou, ainda, paciência para tal. Para Kierkegaard, este é um modo de vida estético”.
“Esse ponto de vista é mostrado nas duas perspectivas em Ou-Ou, em que o esteta A e o ético Juiz William discorrem sobre o modo de vida estético. Na segunda parte, o Juiz aconselha o esteta A a escolher o desespero, pois assim ele escolherá a si mesmo, ainda que toda forma de visão de vida de um esteta seja precisamente o desespero – assim como o ético”, constata Paulo.
O artigo procura analisar os aspectos do desespero inconsciente na filosofia de Kierkegaard. Quatro focos temáticos são escolhidos para justificar por que, para o filósofo, esta forma de desespero é a mais comum e também a mais perigosa. Para tanto, Paulo discorre sobre o que Kierkegaard toma por desespero sob o viés do inconsciente e, então, os conceitos interconectados para a realização desta investigação:
1) melancolia, que é o humor do desespero;
2) preguiça, a falta de vontade que também mantém o indivíduo fora do caminho para si mesmo;
3) vertigem, a paralisia advinda do contato entre o exterior e o interior;
4) suicídio, a tendência autodestrutiva em todo ser humano que se intensifica a cada estágio da vida.
Imagem: Capa dos Cadernos IHU Ideias número 312, de Paulo Abe.
O artigo completo pode ser acessado aqui.
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O Desespero Inconsciente de Kierkegaard: melancolia, preguiça, vertigem e suicídio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU