27 Fevereiro 2020
"Resistir à tentação do pânico, responder à ameaça com um senso de responsabilidade, não apenas considerando o horizonte da própria vida individual, mas percebendo que se participa conscientemente de uma ação civil coletiva que investe a vida inteira da nossa comunidade", escreve Massimo Recalcati, psicanalista italiano e professor das universidades de Pavia e de Verona, em artigo publicado por La Repubblica, 23-02-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.
O pânico como reação coletiva surge por infecção psíquica e não viral. As tropas saem em debandada quando seu líder é abatido; a massa reunida em uma praça se desfaz de repente quando a presença de um perigo iminente é anunciada. O corpo coletivo tomado pelo pânico se desmembra; a massa em pânico é uma massa despedaçada, fragmentada e desorientada. Perdeu a unidade ilusória que existe quando nos sentimos unidos e identificados pela mesma insígnia. O pânico corrói a solidez eufórica da massa, levando-nos de volta à nossa individualidade indefesa.
Isso acontece, como está acontecendo nestes últimos dias com a disseminação em nossas cidades do coronavírus, quando o sinal do perigo fica vermelho, ou seja, indica uma presença extremamente próxima da ameaça. Pois bem, diante dessa proximidade, uma possível reação é a da irracionalidade do pânico.
A outra face é do negacionismo, ou seja, a recusa obstinada de tomar nota da presença da natureza objetiva do perigo. Se negar a presença da ameaça reflete um comportamento de fuga e de evitação da ansiedade, a reação de pânico acaba ampliando de forma desmedida o próprio perigo.
Uma multidão em pânico tentando fugir da fonte da ameaça - por exemplo, do incêndio que repentinamente se deflagra em um teatro - multiplica em sua própria fuga desordenada o poder malévolo do perigo do qual gostaria de escapar. Em outras palavras: o pânico sempre alimenta desmedidamente o pânico. É o que está acontecendo com a epidemia de coronavírus. Destaca a outra face da massa. Enquanto estar juntos, unidos pela mesma paixão ou pelo mesmo ideal, infunde uma sensação de identidade e segurança, no momento do amplo risco de contágio, todo nosso semelhante se colore como um potencial "transmissor", fonte de doença e morte. Se, como Freud ensinou, a euforia da massa comporta o anulamento do pensamento crítico, favorecendo a regressão a uma condição ilusória de onipotência, o pânico coletivo é gerado pelo esfacelamento da massa, por sua súbita pulverização, não pela onipotência, mas pela impotência.
A euforia provocada por sentir-se parte de um corpo único é transformada traumaticamente em seu oposto: cada indivíduo tenta se salvar vivendo seu semelhante já não mais como prolongamento da própria identidade, como acontece na massa compacta, mas como uma ameaça mortal. O pânico nos deixa cegos: a massa que se desfaz fugindo o mais longe possível da fonte da ameaça sempre tende a alimentar o caos e a destruição. Problema que, no caso de qualquer vírus, é complicado pelo fato de a fonte da ameaça nunca pode ser localizada, mas se espalha entre nós de maneira imprevisível.
O que nos espera é então um grande teste da civilidade: conter as reações irracionais de pânico não significa negar a gravidade da situação, mas tentar transformar a massa agitada e perdida do pânico em um conjunto coletivo civil, capaz de reação racional à ameaça incumbente. Seguir as regras básicas de saúde indicadas pela ciência sem cair na fuga irracional do pânico e sem invocar as medidas políticas mais catastróficas da epidemia, comporta a difícil transformação da massa emocional e irracional em um coletivo civil. É um grande teste que já deveria empenhar desde hoje cada um de nós: resistir à tentação do pânico, responder à ameaça com um senso de responsabilidade, não apenas considerando o horizonte da própria vida individual, mas percebendo que se participa conscientemente de uma ação civil coletiva que investe a vida inteira da nossa comunidade.
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Resistir ao pânico - Instituto Humanitas Unisinos - IHU