10 Outubro 2019
Islandia, município peruano na fronteira com o Brasil e a Colômbia, é o exemplo perfeito do porquê o Papa Francisco deseja que missionários respeitem as culturas indígenas.
A reportagem é de Claire Lesegretain, publicada por La Croix International, 08-10-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Na região fronteiriça entre a Colômbia, o Peru e o Brasil, pequenas comunidades religiosas estão tentando ajudar indígenas e migrantes a superarem as várias formas de violência.
Em Islandia, casas e ruas já se preparam para o período de inundações anuais do rio Javari, afluente da Amazônia, entre os meses de dezembro e abril. Este pequeno município é conhecido, ironicamente, como a “Veneza peruana”.
Porque a região “sofre de muitos males” e é “uma das mais negligenciadas pela Igreja e pelo Estado peruano”, quatro congregações missionárias decidiram, há três anos, construir uma casa intercongregacional para garantir a católica presença no local.
Como na cidade de Guingois, a população está também “à deriva”, de acordo com a Irmã Yvonnes, uma das quatro freiras da comunidade – religiosas consagradas que lidam com vários tipos de situações, como o alcoolismo e a prostituição.
“E não tem delegacia de polícia para prestar uma queixa ou pedir proteção”, disse Yvonnes.
As religiosas colombianas e brasileiras passam, portanto, grande parte do tempo ouvindo e acompanhando as famílias indígenas, especialmente os jovens que elas ajudam a “continuarem fiéis à identidade e aos valores a fim de resistir aos atrativos, às tentações da cidade grande”, explica a Irmã Maria-Emilia.
As irmãs consagradas também criaram grupos de discussão para as mulheres vítimas de abuso dentro e fora da comunidade.
Alguns etnólogos explicam estes incidentes por meio das tradições de se sequestrar mulheres, algo que há tempo existe entre as tribos amazônicas – mulheres de fora jamais são aceitas por completo.
Mas, de acordo com a Irmã Fatima, “grande parte do sofrimento na Amazônia tem origem na brutalidade da colonização dos séculos XIX e XX”.
Sem mencionar os anos do conflito armado (1964-2016) entre as FARC, cartéis paramilitares e forças do governo, que resultou em um grande número de mortes e feridos na Amazônia colombiana.
A violência é mais frequente ainda em Islandia porque, nos últimos 30 anos, os indígenas andinos estão morando aqui: eles pertencem ao movimento religioso da Associação Evangélica de Missão Israelita do Novo Pacto Universal – AEMINPU.
Estes “israelitas’ – como são chamados – reivindicam o “direito da posse divina” na região amazônica que faz fronteira com o Peru, a Colômbia e o Brasil, em uma reinterpretação de judaísmo misturada com elementos culturais dos povos incas.
Enquanto os homens israelitas estabeleceram assentamentos agrários, desafiando as reservas indígenas, as suas esposas, reconhecíveis pelos longos véus escuros, aos poucos têm trazido de volta as lojas de Islandia.
“As relações entre os habitantes e os israelitas são muito tensas”, confirmam as quatro irmãs. Muitas vezes também eles entram em confronto com os migrantes, que chegam aqui, e nas aldeias da Amazônia, sem trabalho nem dinheiro.
Alguns são tirados de suas terras por garimpeiros ilegais, enquanto outros tentam a sorte nas empresas extrativistas, mas não conseguem suportar as terríveis condições de trabalho.
“A cidade é incapaz de suprir estas pessoas com os serviços essenciais que precisam”, lamentam as religiosas. “Na Amazônia, tudo fica longe, tudo é pobre”, diz Yvonnes.
Embora 20% dos habitantes se dizem católicos, e 80% se dizem israelitas ou evangélicos, pouquíssimos batismos e casamentos ocorrem na pequena igreja católica de Islandia.
Ciente de que esse é o tema central do sínodo deste ano, a Irmã Yvonnes insiste no papel da Igreja aqui:
“Devemos valorizar o que já existe, especialmente os festivais indígenas, que são uma forma de liturgia comunitária. Se não acompanhamos isso, não confiamos no Cristo que se encarna em todos os lugares do mundo”.
Islandia Peruana. (Reprodução: Google Maps)
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A vida é dura na ‘Veneza da Amazônia’ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU