03 Outubro 2019
O padre jesuíta James Martin se reuniu recentemente com duas autoridades da Congregação para a Educação Católica que publicaram um documento anti-LGBTQ no meio deste ano. Martin dividiu com eles três cartas de pessoas que escreveram sobre as suas experiências envolvendo o tema da transexualidade.
A reportagem é de Robert Shine, publicada por New Ways Ministry, 02-10-2019. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
No Facebook, o religioso postou sobre o seu encontro com o prefeito da Congregação, o Cardeal Giuseppe Versaldi, e o subsecretário Pe. Friedrich Bechina para discutir um documento por eles assinado, chamado “Homem e mulher os criou”, que trata da questão do gênero. Martin escreveu:
“No encontro, que durou aproximadamente 40 minutos, em voz alta li as cartas de uma irmã que ministra para transexuais, de uma família com filhos LGBTs e de um transexual. Com a permissão das duas autoridades, posso compartilhar que elas falaram sobre o contexto e a finalidade do documento publicado, que focava as escolas católicas. A Vossa Eminência expressou o seu pesar no caso de que alguém tenha pensado que a Congregação estivesse acusando as pessoas de estarem distorcidas ideologicamente; ambos desejam compartilhar o cuidado com as pessoas transexuais e querem continuar dialogando para refletir sobre experiências desta comunidade. Como falei, eles me permitiram dividir isto com vocês, mas o restante do encontro será mantido em privado. Fico feliz em trazer as vozes LGBTs a este caloroso encontro e muito grato pela abertura havida em dialogar”.
Ouvir as próprias pessoas transexuais, bem como os familiares e ministros, é um retorno importante a ser dado às autoridades da citada congregação. “Homem e mulher os criou” foi redondamente criticado por teólogos, canonistas, educadores e agentes pastorais, em parte por não incorporar as perspectivas das pessoas LGBTQs. Pouco depois da publicação do documento, o próprio Cardeal Versaldi reconheceu as falhas nesse sentido, dizendo que a congregação “poderia ter feito melhor” ao escutar diretamente as pessoas mais afetadas pelo documento.
Esta notícia do encontro do Pe. James Martin com as autoridades vaticanas para a área da educação vem na sequência da notícia de sua audiência privada com o Papa Francisco sobre o tema do trabalho pastoral LGBT divulgada segunda-feira desta semana. O padre jesuíta descreveu esta audiência como “quase um milagre para mim” e “um verdadeiro sinal para o seu acompanhamento e trabalho pastoral aos católicos e às pessoas LGBTs em nível mundial”. Ele assim escreveu:
“Francisco foi um ouvinte incrivelmente atencioso e, com base nas perguntas que fez, podemos dizer que ele se preocupa com estas pessoas. Para mim, foi uma conversa muito fácil, como aquela que temos com o nosso pastor favorito. Foi a primeira vez que tive uma conversa longa com um papa, e mesmo assim ele me deixou à vontade e eu me senti complementamente confortável. (...) Eu diria que o que mais me surpreendeu, hoje, foi que, antes de mim, houve uma audiência do papa com uma conferência episcopal inteira, e depois de mim haveria uma outra um dicastério. Então, dar a este tema 30 minutos de sua programação, no meio de um dia incrivelmente ocupado e pouco antes de um sínodo, é um sinal do seu compromisso com as pessoas LGBTs”.
De acordo com o sítio Religion News Service, esta audiência aconteceu a convite do Papa Francisco depois que os dois se conheceram brevemente em um encontro do Dicastério para a Comunicação. Esta audiência é, realmente, um sinal da preocupação do papa junto à comunidade LGBTQ e do seu apoio ao trabalho do Pe. James Martin. A revista America publicou, citando uma fonte vaticana, que Francisco leu o livro de Martin sobre a questão LGBT na Igreja, intitulado “Building a Bridge”, baseado em uma palestra que Martin deu após receber o Prêmio Bridge Building (“construindo pontes”) 2016, do New Ways Ministry.
A mesma publicação informou ainda que o Papa Francisco está ciente da pressão conservadora que o padre jesuíta tem recebido nos EUA, inclusive de alguns bispos. Na semana passada, o arcebispo da Filadélfia, Dom Charles Chaput atacou o ministério de Martin por suas supostas ambiguidades. Mesmo estando errada a análise que Chaput fez de praticamente todos os pontos considerados, os bispos Thomas Paprocki, da Diocese de Springfield, e Richard Stika, da Diocese de Knoxville, a endossaram. Ao se reunir com Martin, o Papa Francisco assinala que o seu companheiro jesuíta conta com o apoio papal na continuidade de seu trabalho. O também companheiro jesuíta, Pe. Thomas Reese, em texto publicado no Religion News Service, afirmou que os dois estão “apenas imitando a Jesus” ao ensinarem sobre a compaixão abundante de Deus.
Esta semana tem sido muito positiva para os padres que atuam no ministério LGBTQ. Além dos desdobramentos aqui assinalados, o Bondings 2.0 escreveu, no domingo, sobre um telefonema dado pelo Papa Francisco ao padre e teólogo gay James Alison, em que o pontífice restaurou o ministério ativo dele. Mas, embora a partilha das cartas feita por Martin e a restauração do ministério de Alison sejam corretivos úteis, elas devem ser somente um ponto de partida para que o Papa Francisco e as autoridades vaticanas ouçam diretamente os fiéis e incentivem publicamente os que trabalham no acompanhamento LGBTQ.
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Pe. James Martin compartilha cartas relacionadas a transexuais com autoridades vaticanas após publicação de documento anti-LGBTQ - Instituto Humanitas Unisinos - IHU