Paraguai. Balança o governo de Mario Abdo pelo escândalo do acordo secreto sobre energia com o Brasil

Mario Abdo Benítez e Jair Bolsonaro. Foto: elcohetealaluna.com

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31 Julho 2019

Antes de atingir seu primeiro ano na presidência, a gestão do governo torna-se difícil para Mario Abdo Benítez, devido à crise política decorrente do acordo bilateral secreto de energia elétrica com o Brasil, ao qual se soma uma crise interna existente do governante Partido Colorado.

Enquanto a economia desacelera, surgem sérios problemas ambientais que têm impacto até sobre os ganhos dos exportadores de soja, grãos e carne, e a crescente insatisfação dos cidadãos com a segurança interna e a falta de políticas relacionadas à educação, saúde e emprego.

O artigo é de Celso Guanipa Castro, jornalista e cientista político paraguaio, publicado por Centro Latinoamericano de Análisis Estratégico – CLAE, 29-07-2019. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

O chanceler paraguaio, Luis Castiglioni, renunciou nessa segunda-feira ao seu cargo em meio de um escândalo por um acordo secreto de contratação de energia com o Brasil que deixou contra as cordas o presidente Mario Abdo. Também demitiram o embaixador paraguaio no Brasil, Hugo Saguier, o flamante titular da estatal de eletricidade ANDE, Alcides Jiménez, e o direto paraguaio da Itaipu Binacional, José Alderete.


Protesto contra os acordos dos trabalhadores. Foto: Sindicato dos Trabalhadores da ANDE | Reprodução Twitter

O chanceler havia anunciado horas antes que o Paraguai pediria ao Brasil para suspender os efeitos do acordo, que estabelecia um cronograma para a compra de energia à hidrelétrica binacional de Itaipu, até 2022 e foi interpretado pela oposição como cessão de soberania.

A crise se desatou depois da renúncia na semana passada do então presidente da ANDE, Pedro Freira, um colaborador próximo do presidente que se negou a assinar o documento porque elevaria em mais de 200 milhões de dólares os custos da entidadee estatal, dinheiro que ainda não se sabe para quais cofres migraria.

Paraguai e Brasil são sócios de Itaipu, a maior central do mundo em geração de energia, e se preparam para negociar o futuro da entidade devido ao vencimento, em 2023, de um anexo chave de seu tratado fundacional.

A hidrelétrica de Itaipu é um tema sensível para o Paraguai, onde desde o governo de Fernando Lugo se foi maturando uma ideia de soberania energética, dado o histórico de roubo e despojo desde a construção da hidrelétrica na qual o Paraguai sempre “cedeu” às pressões brasileiras.

Desta vez, o Congresso convocou o Governo a apresentar toda a documentação relativa ao acordo nessa segunda-feira e convocou as autoridades para que deem explicações. Funcionários de ANDE se manifestaram frente à sede legislativa com cartéis que diziam: “não terão paz enquanto violem a constituição”.

O governo de Abdo, que mantém uma estreita relação com o mandatário do Brasil, Jair Bolsonaro, disse que a decisão foi tomada finalmente em instâncias diplomáticas depois do fracasso das negociações entre os técnicos das estatais de eletricidade.

Saguier Caballero foi quem assinou o polêmico acordo em 24 de maio com Pedro Miguel da Costa e Silva, encarregado de Negociações Bilaterais do Brasil, enquanto que Jiménez foi o assessor técnico da chancelaria. A bancada do Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) exigiu que o presidente Abdo Benítez destituísse os funcionários, caso contrário iniciariam o processo para um julgamento político.

No início o Governo defendeu sua postura assegurando que não havia em prejuízo para o país, mas tem teve que dar o braço a torcer. Abdo Benítez suspendeu uma viagem à Turquia devido à crise e também ordenou Castiglione que voltasse de sua viagem ao Líbano para se apresentar ao Parlamento.

Esses atos demonstram a política entreguista que o governo colorado de Mario Abdo Benítez tem regido desde assumir a presidência. O acordo foi firmado sob um forte hermetismo governamental, veio à luz por equívoco e problemas internos no governo, o que custou um forte questionamento por parte de atores políticos, organizações sociais e a cidadania em geral.

O alinhamento de Abdo com as políticas e estratégias do presidente estadunidense Donald Trump e, na região, com as do ultradireitista presidente brasileiro Jair Bolsonaro, o levaram a se somar ao Grupo de Lima (países empenhados na derrota do governo constitucional venezuelano) e a receber sucessivamente altos funcionários do Fundo Monetário Internacional – FMI e de Washington, entre eles, o chefe do Comando Sul e o secretário de estado Mike Pompeo.

Mario Abdo não esconde sua admiração por Bolsonaro e confessou que se emociona quando o presidente de Brasil o chama de “Marito”, diminutivo que utilizou para sua campanha eleitoral com o lema “Marito do Povo”. Ambos compartilharam alguns atos oficiais, onde Bolsonaro louvou a ditadura de Alfredo Stroessner, ídolo do mandatário paraguaio.

Juntamente com Bolsonaro e o presidente argentino Mauricio Macri, Abdo conseguiu desmantelar o Mercosul e, seguindo as diretrizes dos EUA, formou uma comissão “contra o terrorismo” na tríplice fronteira comum, uma área que Washington aspira a se apoderar, já que é onde está a barragem de Itaipu e o Aquífero Guarani, a maior despensa e reservatório de água do continente.

Antes de atingir seu primeiro ano na presidência, a gestão do governo torna-se difícil para Abdo, devido à crise política decorrente do acordo bilateral secreto de energia elétrica com o Brasil, ao qual se soma uma crise interna existente do governante Partido Colorado.

Enquanto a economia desacelera, surgem sérios problemas ambientais que têm impacto até sobre os ganhos dos exportadores de soja, grãos e carne, e a crescente insatisfação dos cidadãos com a segurança interna e a falta de políticas relacionadas à educação, saúde e emprego.

O setor de agronegócio e pecuária, por meio da Federação de Produção, Indústria e Comércio (Feprinco), pressionou Abdo Benítez para liberar 100 milhões de dólares para o refinanciamento do setor agrícola. Enquanto isso, não há propostas ou soluções para os sem-terra urbanos e rurais, que permanecem mobilizados e reprimidos, bem como para diferentes setores dos trabalhadores.

Esse "governo do povo", com suas políticas neoliberais, ranzinzas e corruptas, é deslegitimado, sem credibilidade e com poucas oportunidades de sucesso nas várias crises que enfrenta.

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